16 de julho de 2019

TUDO EU?

- Seja a mudança que você quer ver no mundo. - Mahatma Gandhi

- Age como se a máxima de tua ação devesse tornar-se, através da tua vontade, uma lei universal. – Kant

- Antes de tentar mudar o mundo, arrume o seu próprio quarto. - William H. McRaven


As frases acima, que têm muito em comum, fazem sucesso em postagens do Facebook, em textos de autoajuda e em palestras motivacionais. Dificilmente se vê alguém discordar de alguma delas, pelo contrário, o que mais se encontra por aí são louvores e paráfrases delas com a ênfase do “Faça isso!”, “Você pode!”, “Você consegue!”, “Vai dar certo!”. E euzinha, que sempre fui rebelde, questionadora e com mania de ser “do contra”, fico aqui pensando com meus botões: Mas que merda é essa? Por que cargas d’água querem jogar tanta culpa e tanta responsabilidade em cima de uma incompetente e incapaz feito eu?

Nunca tive cargo de liderança; nove em cada dez votos que dei foram para candidatos que perderam a eleição; praticamente todas as vezes que tentei dizer como determinada coisa deveria ser feita o grupo, sempre pequeno e com pouco poder, ao qual eu disse isso decidiu fazer outra coisa. Como é que minhas atitudes vão mudar o mundo? Por que EU tenho que me portar e me sentir como se fosse capaz disso só porque respeito as pessoas e separo meu lixo? Colocar toda essa responsabilidade nas minhas costas é peso demais!

Não me entenda mal, não sou contra respeitar o outro, separar o lixo, arrumar o quarto ou qualquer outra atitude, postura ou atividade que seja benéfica para mim sem prejudicar o outro ou, melhor ainda, que seja benéfica para o outro. Pelo contrário, sou MUITO a favor disso! Mas não venham, peço encarecidamente, não venham me dizer que essa minha postura vai mudar o mundo. Não vai!

Se querem usar frases feitas, eu aconselharia outra: “Uma andorinha só não faz verão”, e mais, eu a sobrecarregaria: “Um milhão de andorinhas não fazem verão”, pelo menos não se forem andorinhas incapazes e impotentes feito eu!

O fato é que para tornar esse mundo melhor, uma euzinha não tem força suficiente e é injusto ficar sendo cobrado dela, ficar sendo dito a ela que isso é possível quando não é.

Fico me perguntando (eu me pergunto muitas coisas) se a grande quantidade de pessoas que sofrem de depressão não adquirem essa doença porque o peso da responsabilidade de mudar o mundo foi demais para elas. Às vezes eu me sinto dobrar!

Parem de cobrar dos impotentes! Parem de cobrar de si mesmes! Você não pode e não é culpa sua, não é responsabilidade sua. Você é a ponta mais fraca da corda e mesmo que seja um fio de uma corda mais grossa, essa corda não será grossa e forte o bastante. Não exija o impossível, não pense que o mundo vai melhorar porque você levou seu óleo queimado para a reciclagem, se fizer isso vai se decepcionar e essa decepção dói muito.

Não desista de cuidar de si mesme, da sua vida, das pessoas que você ama, de ajudar quando e como puder ajudar, pense que uma única pessoa ou ser vivo que ficar melhor, ou que não ficar pior, por uma atitude sua já é uma vitória enorme e, muitas vezes, muitos dias, é tudo o que você pode fazer e está bem. Você não criou o mundo por isso não é responsável por ele, você não criou a doença por isso não é obrigade a curá-la. Faça-o se puder. Mas só se puder.

Então vamos concordar que as três frases lá em cimas são ótimas, são lindas, mas são muitíssimo limitadas. Eu posso e quero e tento sempre praticá-las, mas sei que ao fazer isso não estou mudando o mundo. Não me cobre isso! Tire esse peso de cima de mim.

Claro que às vezes alguns de nós conseguem coisas que pensamos que seria impossível e que esses exemplos podem nos ajudar a lutar com mais energia pelo que queremos. Não há nada de errado nisso, mas, como em tudo o mais, temos que tomar MUITO cuidado com o exagero. O que estou dizendo é que acreditar nas conversas comuns nas frases de autoajuda que querem nos fazer parecer superpoderoses aos nossos próprios olhos pode ser frustrante a nos fazer muito mal. Temos que ser conscientes de que podemos e devemos fazer sempre nosso melhor e lutar por nós mesmos e pelos outros, mas que devemos e precisamos saber que somos limitados, que nem sempre conseguiremos e que, quando não conseguirmos, não é culpa nossa.

Essa coisa de autoajuda, essas frases bonitinhas que dizem servir para "levantar nossa moral", ou nosso amor próprio, são terrivelmente danosas. Elas convencem as pessoas de que podem até o impossível, e no final, quando não conseguem, elas se sentem frustradas e culpadas. Elas, para elas mesmas, tornam-se culpadas por tudo, até mesmo pelo fato de que o mundo e a vida não são obrigatoriamente maravilhosos como querem nos convencer de que são, ou serão "se fizermos a nossa parte". Daí a depressão, a frustração, o sentimento de inutilidade, a vontade de se matar.


Um comentário:

Pedro Mundim disse...

Divina, eu compartilho de características com você:

"Nunca tive cargo de liderança; nove em cada dez votos que dei foram para candidatos que perderam a eleição; praticamente todas as vezes que tentei dizer como determinada coisa deveria ser feita o grupo, sempre pequeno e com pouco poder, ao qual eu disse isso decidiu fazer outra coisa"