29 de abril de 2022

VANTAGEM DE SER ATEIA



Agora há pouco fui tirar o lixo orgânico da cozinha.
Depois de embrulhar tudo e deixar perto da porta pra levar quando terminasse o trabalho, fui limpar a lixeira e, em uma dobra da tampa tinha dois ovinhos de drosófilas, de um deles chegou a sair uma minúscula lagartinha quando comecei a passar sabão pela lixeira.
Limpei tudo e os ovinhos, juntamente com a lagartinha, foram-se; mortos em meio a sabão e desinfetante pelo ralo do tanque.
Com a lixeira limpa e novo saco de lixo no lugar certo, enquanto lavava as mãos, pensei:
Para a natureza, para o deus de Spinoza, para a Evolução darwiniana, aquelas drosófilas abortadas, as centenas de tartarugas que são devoradas pelas aves marinhas antes de chegar ao mar; os ursinhos atacados, estraçalhados e devorados ao sair da caverna com sua mãe magra, fraca e faminta que deu àqueles filhotes todas as reservas de energia que tinha; o filho morto no parto por imperícia médica, infecção hospitalar, complicações incontornáveis; todos os filhotes e todos os filhos mortos prematuramente têm absolutamente o mesmo valor e a mesma importância:
Nenhuma.
Sempre vejo alguém perguntar qual a vantagem de ser ateia.
Posso citar várias, mas...
Por mais terrível que pareça e por mais sofrimento que cause, para mim, a maior delas é essa:
É muito bom não ter que aceitar ou criar desculpas e justificativas para me obrigar a adorar, respeitar ou amar um ser consciente que seja responsável por isso!

25 de abril de 2022

TOLERÂNCIA



Sei que para muitas pessoas
Boas, éticas e decentes
Deus é uma questão de fé
Eu não entendo essa tal fé
Capaz de "passar por cima"
De todas as evidências
Mas aceito
E respeito
As pessoas que conseguem fazer isso
Sem impor sua fé a ninguém
E respeitando as diferenças
Tenho o privilégio
De ser amiga
De várias pessoas assim
E filha de uma delas
Me sinto grata
A cada uma dessas pessoas
Pela amizade
Pelo amor e pelo carinho
Que delas recebo
Mas as religiões
Como instituição
Essas em sua maioria
São muito criticáveis
E os líderes religiosos
Que usam essa fé
Para explorar as pessoas
Para incutir o ódio
E o preconceito
Nas mentes mais sugestionáveis
Merecem todo meu repúdio
Quando falo do meu ateísmo
Minha intenção primeira
É combater a crença cega
E manipulável
Que as religiões
E esses líderes
Propagam
E minha outra intenção
Que vem “de mãos dadas
Com a primeira
É mostrar a quem crê em deus
Que sou uma pessoa comum
Que não acreditar em seu deus
Não me torna um ser maligno
Que ateísmo não é sinônimo
De satanismo
Principalmente porque
Pessoas ateias
Não creem em Satã
Demônios
Capeta
E outros deuses do mal

22 de abril de 2022

EXPLICAÇÃO



De certa forma, quando falo do meu ateísmo, estou fazendo o mesmo que faz uma pessoa que se empenha em “pregar a palavra”.
Mas não estou imbuída das mesmas razões e não tenho fé no meu ateísmo porque ateísmo não é crença.
A diferença que percebo é que a pregação é uma ação e os meus argumentos ateístas são uma REação.
Eu jamais teria me sentido confortável para falar como falo se não tivesse passado boa parte da minha vida ouvindo tantas pessoas “pregando a palavra”; tantas pessoas me dizendo as mesmas coisas que praticamente toda pessoa religiosa diz.
Coisas que, em muitos casos, as religiões usam para justificar todo tipo de absurdo.
Como preconceito, misoginia, intolerância, megalomania, ganância, desprezo pelas pessoas que pensam ou são diferentes. E até mesmo crimes.
Não estou falando que todas as pessoas teístas fazem isso!
Estou dizendo que o número delas é grande o suficiente para interferir na vida de pessoas como eu, que não creem; de pessoas que creem em deuses diferentes, ou que creem no mesmo deus de forma diferente.
Então, não falo do meu ateísmo para convencer as pessoas de que deus não existe.
Falo para convencer as pessoas de que deus não existe PARA MIM e para muitas outras pessoas.
Falo principalmente para que parem de tentar enfiar o deus delas na vida de todo mundo e nas leis do meu país. Porque isso afeta a mim e a todo mundo que vive aqui.
Por último - mas bem menos importante -, falo porque sou tagarela, porque gosto de escrever, de expor meus pensamentos e opiniões.
E aqui, na internet, é o único lugar onde me dou o direito de fazer isso com mais liberdade.
Ao contrário de muitas pessoas religiosas, eu não saio por aí "pregando a palavra de Darwin".

Dizem que não é deus quem comete injustiças!
Claro que não! Deus não existe e quem não existe não “comete” nada.
Mas SERIA deus sim! SE o deus de que me falam existisse.
De todo mal que a gente aponta, pessoas religiosas dão um jeito de dizer que “são as pessoas”.
Eu pergunto sem ser original: E quem essas mesmas pessoas dizem que criou essa raça humana que cometem as injustiças, os males, os crimes?
Seu deus não é onipotente?
Não podia ter criado diferente; ou simplesmente não ter criado esse animal tão terrível que é o ser humano?
Que raio de onipotência é essa que não pode criar apenas seres que não sentem prazer em matar, subjugar e destruir?
Além disso, como podem colocar todo sofrimento na conta do ser humano se o ser humano não criou nada?
Criamos os vírus que matam crianças?
Criamos as catástrofes naturais que matam crianças e animais inocentes desde muito antes de os animais humanos terem poder de influenciar e destruir a natureza?
Criamos as deformações com que muitas crianças e animais nascem desde muito antes de os seres humanos terem a ciência e a medicina?
Essas pessoas falam dos muitos males criados e mantidos por seres humanos e esquecem dos males que atingem os seres humanos desde sempre e que não só não criamos como - até hoje! - ainda não temos conhecimento nem capacidade de evitar ou amenizar.
Menos ainda as crianças, que são vítimas desses males e não têm poder nenhum.
Se o seu deus existisse e tivesse criado tudo a partir do nada, a culpa desses males não seria dele e apenas dele?

Já me disseram que sou muito “nervosinha”, que sou tão passional quanto uma teísta.
Eu admito essa falha, mas me defendo:
Não tem como não ser passional quando falo do sofrimento que vejo e da indiferença com que, embotadas pela religião, as pessoas olham para esse sofrimento.
Eu vejo pessoas que louvam o deus que teria “dado tudo” a elas e negado o básico a tanta gente. Essas pessoas usam a fé egoísta para desdenhar o sofrimento de crianças!
E vejo que muitas vezes - talvez na maioria das vezes - tais pessoas nem se dão conta disso, tão cegas se tornaram pela crença nesse deus improvável.

Sempre que uma coisa boa que me acontece, não consigo deixar de pensar em quantas coisas ruins estão acontecendo com pessoas que merecem mais coisas boas do que eu.
Não consigo deixar de pensar em como seria injusto um deus que tivesse me dado essa coisa boa e negado o básico - até a mais fundamental necessidade - a tantas crianças inocentes.
Se eu acreditasse que o bem que tenho é presente de deus, eu teria que acreditar que o vírus ou o câncer que matam uma criança depois de muito sofrimento também são “presentes” de deus.
E eu odiaria esse deus!

Isso tudo é impossível de pensar, sentir e falar sem ser de forma passional.
Como não ser passional se estou falando de amor?
Eu sou o que sinto quando escrevo, e estou escrevendo sobre amor.
Sobre o amor que sinto pelas pessoas boas que sofrem, pelos animais inocentes que sofrem, pelas crianças que sofrem.

Não consigo ser tão egoísta a ponto de adorar um deus, atribuindo a ele o bem que tenho, enquanto me forço a esquecer todo sofrimento que vejo diante de mim, e que seria culpa desse mesmo deus.
Não tenho capacidade nem amor próprio suficiente para isso.

Foi essa visão, foi esse pensamento, foi essa constatação que me tornou a ateia que sou.
Não tive uma decepção, um grande sofrimento ou uma “graça” que pedi e não aconteceu.
Apenas tirei os olhos do meu próprio umbigo e olhei à minha volta.
Olhei DE VERDADE à minha volta.
Foi isso que me deu a certeza de que esse deus de quem tanto me falam não tem como existir.

Por tudo que sou e por tudo que sinto, minha certeza de que deus não existe e de que eu teria que ser muito egoísta para ter fé se tornou parte de mim.
Sou ateia de uma forma que não tem volta.
Porque não existe o verbo nem o ato de “desver”.

17 de abril de 2022

INSPIRAÇÃO



A bíblia é "inspirada" por Deus
A Ilíada é "inspirada" por Zeus
O Veda é "inspirado" por Shiva
E por aí vai...
Prefiro mil vezes A Origem das Espécies
Uma obra inspirada por anos de estudos
Cuidadosos e fundamentados
Feitos por Charles Darwin
Prefiro outras centenas de livros
De filosofia, arte e ciência
Sempre inspirados em estudos criteriosos e aplicados
De pessoas preocupadas em encontrar respostas
(ou mais perguntas)
Que qualquer outra pessoa possa encontrar
Pelos mesmos processos
Pessoas que não precisam de fantasias de poder
Como chapéus esquisitos e vestidos cerimoniais
Pessoas que não se dizem nem se sentem
"iluminadas" ou "escolhidas"
Por nenhum tipo de ente sobrenatural

5 de abril de 2022

EU NÃO PREFIRO NINGUÉM!



Se eu gostasse de algum político da chamada "terceira via", ainda assim não votaria nele no primeiro turno. Votaria em qualquer um que tivesse mais chance de ir para o segundo turno contra a bozobostice e esqueceria gosto pessoal.
Se eu fosse alguém que odeia todos e se arrepia diante da ideia de escolher alguém que despreza, ainda assim eu engoliria a raiva como um remédio amargo e votaria em qualquer um que tivesse mais chance de ir para o segundo turno contra a bozobostice.
Nunca gostei da ideia de "escolher o menos pior", foi por isso parei de votar em 2003 e só voltei a votar em 2018.
Acontece que agora não é só uma questão de "votar em um para tirar outro" nem hora de "não voto em ninguém porque nenhum presta".
Agora é questão de fazer alguma coisa para que as pessoas continuem tendo o direito de escolher entre votar ou não votar, de falar, de se expressar, de criticar, de cobrar, de processar...
É questão de votar para tentar impedir que o terror tome o poder, mesmo sem garantia de conseguir.
Quem sabe pelo menos um pouco sobre ditadura deveria, a meu ver, fazer o que eu disse acima. É o que farei.
Para mim, a pessoa que opta por se omitir ou vota em uma "terceira via" porque prefere esse ou essa e se nega a votar em quem tiver mais chance de chegar ao segundo turno está usando a democracia para livremente correr o risco de perdê-la.
O mesmo que muita gente fez em 2018... infelizmente.
Mas é só minha opinião.

4 de abril de 2022

VITÓRIA DO DIA



Aqui em casa somos só eu e meu Neguinho tesudo que amo mais do que quase tudo que amo na vida (só meu filho compete), e olha que eu amo muitas coisas e muita gente!
Comprei uma bandejinha bem pequena de bacalhau dessalgado em pedaços (quase desfiados) em um mercado aqui perto de casa e levei pra casa. Peguei porque não achei muito caro, já que era tão pouco.
Hoje resolvi fazer o tal bacalhau. Eu tinha uma batata meio grande mas não enorme, meia cebola, um tomate, um saco plástico cheio de pimentões vermelhos e verdes picados que sempre guardo no congelador, um saco plástico com alho descascado que também sempre tenho guardado no congelador.
Em uma vasilha de plástico grande fui colocando:
Um bom punhado dos pimentões congelados, alguns dentes de alho inteiros congelados, a meia cebola picada, três quartos do tomate picado (guardei um quarto para o caso de o marido precisar para um lanche noturno) e a batata picada em cubinhos (a casca eu fritei e dei de presente para o maridão tomar uma cerveja).
Coloquei o bacalhau, salpiquei Fondor (um tempero que sempre tenho em casa) e uma micropitada de pimenta do reino branco (para fazer diferença sem que eu perceba o gosto porque odeio pimenta).
Misturei tudo o melhor possível, coloquei em uma forma do tipo refratário, despejei uma quantidade bem generosa de azeite, tampei a forma (essa tinha tampa) e levei ao forno.
Enquanto assava (depois de um bom tempo na verdade porque tentei organizar os tempos de cozimento e "assação") botei no fogo um arroz branco sem segredos e botei pra cozinhar os únicos dois ovos que tinha na geladeira.
Uma hora depois de colocar o refratário no forno eu estava descascando os ovos cozidos, esperando o arroz ficar pronto (fazer o barulhinho de estalo) e pronta para ver como estava o bacalhau.
Quando o arroz ficou pronto e os dois ovos estavam cozidos (acho que tinha dado mais ou menos uma hora e dez ou quinze de forno) tirei o bacalhau e o maridão já quis fazer o prato porque estava perfeito, fatiei os ovos cozidos e arrumei sobre a forma para decorar.
Abri uma garrafa de vinho e nós dois concordamos que se a gente fosse a um restaurante que servisse uma refeição com esse sabor e esse "balance" a gente certamente voltaria mais vezes.
A garrafa de vinho foi-se e eu estou agora, meio bêbada e muito feliz, porque sou uma cozinheira bem medíocre que acerta algumas vezes, essa foi uma delas.
... Se a gente consegue "esquecer" as m* do mundo por um tempo e consegue acertar um prato para o almoço, a gente repõe as energias para voltar aos noticiários e sofrer mais um pouco sem desmontar completamente...