31 de maio de 2020

SOBRE O BRINDE COM COPO DE LEITE OU QUALQUER OUTRO ABSURDO DESSE GOVERNO QUE VOCÊ PODE LEMBRAR SEM MUITO ESFORÇO

Independente do significado e do resultado
Que o uso desse símbolo possa ter
O fato é que esse é apenas mais um
Dos absurdos dessa absurdidade
Em que estamos inseridos
E nisso tudo
O real e que afeta a vida da gente
Tem sido apenas e unicamente
O de que ninguém está fazendo nada!
Ninguém que tem poder para agir está fazendo nada!
E quem não tem poder nenhum
Feito eu
Só consegue sentir raiva e impotência
A certeza da impotência é terrível
A gente vê um mundo que já não era bom
Desmoronando
Um mundo muitíssimo pior sendo construído
E se vê totalmente impotente
Para fazer qualquer coisa
Estou lendo Os Testamentos
O segundo livro da distopia
Criada por Margaret Atwood
Em O conto da Aia
Tem tanta semelhança na angústia que o texto passa!
Principalmente quando penso
No que teria levado ao nascimento
E manutenção
Da República de Gileade
E comparo a angústia de algumas das personagens
À angústia que essa situação absurda
Que estamos vivendo
Causa a mim
Não estou falando da série
Porque não vi nada da série
Mas li O Conto da Aia
Antes desse segundo livro que estou lendo agora
Sei que muita gente
Pode não perceber tanta semelhança assim
Mas acho que as semelhanças mais sutis
Entre literatura e realidade
São as mais significativas
E são seguramente
As que mais me afetam.

29 de maio de 2020

CANSA CONVERSAR COM BOZOMINION PORQUE...


Um bozominion nunca vai aceitar que um presidente que diz "E daí?" diante da notícia de que milhares de pessoas estão morrendo por dia é um assassino.

Um bozominion nunca vai aceitar que um presidente que quer "socar" nas pessoas um remédio que tem efeitos colaterais gravíssimos contrariando todos os especialistas de saúde como se ele tivesse conhecimento para isso é um assassino.

Um bozominion nunca vai aceitar que um presidente que quer armar a população enquanto acaba de desmontar a educação pública já tão fragilizada é um assassino.

Um bozominion nunca vai aceitar que um presidente que dá dinheiro para banqueiros e tira direitos de trabalhadores em meio a uma crise financeira é um assassino.

Um bozominion nunca vai aceitar que um presidente cujo governo tem um programa de incentivo ao agronegócio que mata pessoas em nome de latifúndios e grilagem é um assassino.

Um bozominion nunca vai aceitar que um presidente que cria crises políticas e desmantela seu ministério da saúde enquanto pessoas morrem por uma doença para a qual não existe vacina é um assassino.

Não, um bozominion não vai entender que um presidente que pratica, incentiva e facilita esse tipo de atitudes é um assassino.

Por isso que nazistas certamente argumentaram (e ainda argumentam) que Hitler nunca matou ninguém.

Quando uma pessoa tem essa capacidade absurda de aceitar a barbárie como projeto de governo, não há argumento que mude isso.

Esse tipo de fanático nunca aprende.

18 de maio de 2020

MITOCÔNDRIA


Quando era criança e, na escola, aprendi sobre as células e suas organelas, me apaixonei pela mitocôndria! Uma vez fui à casa de uma pessoa com um grupo de amigos e, assim que entrei na sala, com a discrição escandalosa que foi minha marca naqueles tempos e acho que é ainda hoje, gritei: “Uma mitocôndria!” olhando para um quadro que havia na parede. O dono da casa disse que aquele quadro estava lá há muito tempo e aquela era a primeira vez que ele recebia alguém que sabia o que era aquela figura. Mas não fiquei apenas orgulhosa do meu “feito”, também fiquei fascinada pelo quadro, desejei ter um como aquele em minha casa e pensei nisso muitas vezes no futuro.

Eu achava a mitocôndria a mais interessante e bonita das organelas e, ao mesmo tempo, gostava de pensar no quão pequenas todas elas são e de tentar imaginar o quanto elas eram grandes comparadas com o tamanho dos átomos. Como um átomo “veria” uma organela? Também pensava muito sobre os átomos tão diferentes formando substâncias completamente diferentes que, por sua vez, formam as organelas, as células, o nosso corpo.

Nessa época pensei que deus poderia ser um corpo e nós poderíamos ser seres mais do que minúsculos habitando um dos elétrons de um dos átomos de uma das organelas de uma das células de seu corpo. Vendo as imagens representativas do sistema solar, eu tinha tido quase que uma epifania pensando na semelhança entre aquele modelo e o modelo que representava os átomos. Então imaginei que deus poderia sequer ser assim “um deus”, poderia ser um ser vivo com inteligência como uma pessoa ou com instintos como um animal vivendo em um grupo ou família como vivemos na terra. Tais seres não seriam exatamente iguais a nós porque o núcleo de seus átomos teria que ser um tanto incandescente para que um deles pudesse ser batizado por nós de sol, e eu não tinha visto nenhum livro ou professor dizer que o núcleo dos átomos brilha. Mas seriam seres vivos vivendo vidas como as nossas em algum lugar de alguma forma semelhante ao nosso universo só que extremamente maior. E nós habitaríamos um elétron do corpo de um desses seres, o ser que chamamos de “deus”. Para mim, isso explicaria o fato de não termos nenhuma evidência de fato da existência de deus. Afinal, o que saberia de mim uma criatura que habitasse um elétron de um átomo do meu corpo? Isso poderia, talvez, explicar também a "impressão" da “presença” de deus que algumas pessoas, incluindo minha mãe, diziam sentir; explicaria até mesmo o fato de ele aparentemente ignorar nossa existência. O que saberia eu sobre a existência de seres minúsculos que vivessem em um dos elétrons de um átomo do meu corpo? Será que, se tais seres existissem, nos momentos em que eu sentisse algo mais forte, como raiva quando meu pai me batia ou felicidade quando ganhava um presente ou tirava uma boa nota, alguns desses seres que fossem mais sensíveis não poderiam “sentir” algo e, por não saberem o que estava acontecendo, atribuir isso a uma interferência minha em suas vidas que eu na verdade ignoro totalmente?

Até hoje acho essa ideia interessante embora não possa dizer que acredito nela. Mas se fosse habitar um elétron de uma organela de uma célula de um corpo como o meu, eu escolheria habitar uma mitocôndria!

5 de maio de 2020

COMO SERÁ QUE SE VIVE?

Quando tinha 18 ou 19 anos e era uma moleca bem "Porra louca", tive uma amiga que se chamava Preta. Ela não era preta, então não sei o porquê do apelido, ou se era mesmo apelido. 
A preta era uma lésbica do tipo que dá "na vista" por não ser muito feminina e era uma poeta e uma pessoa muito agradável e divertida. 
Nossa amizade fez meus pais se perguntarem se eu era lésbica e discutirem se me aceitariam ou não. Minha mãe só meu contou isso anos depois e achei muito engraçado!
Um dia resolvemos escrever a quatro mãos. Uma começava e a outra acrescentava algo. A gente ficava um tempo trocando a folha de papel de mãos uma ou duas vezes por semana até que alguém desistia de continuar. Um dia perdemos contato e eu nunca mais soube nada a respeito dela. 
Fizemos dois textos assim e quando os leio não consigo lembrar quais trechos são meus e quais são dela. Um deles foi esse: 


Será viver caminhar passos incertos
E sofrer em cada esquina
Em cada canto
Em cada sonho?

Será então sorrir aos quatro cantos
Ser a personificação da felicidade
E do bem-estar?

Será viver amar ao próximo
E por ele dar a vida se preciso for
Mas nunca precisar?

Será então não amar ninguém
E viver de deu em deu
Rolando pela estrada
Como pedra lascada?

Como será que se vive?
Como será que se aprende?
Como?
Como será?

Será viver um misto de sentimentos
Diversos e espalhados
Sem certeza de seu próprio mundo?

Será explodir o coração
Num momento de paz
Ou será a procura
Dessa mesma abstração
Numa constante?

Como será viver?
Será unir as mãos
Em infinitos pedidos de perdão
Ao astro maior denominado Deus?

Será que viver é apontar
A arma da desigualdade
Ao infeliz fracassado
E assim se considerar herói
Dessa guerra existencial?


2 de maio de 2020

VIDA CADELA


Viver é um pé no saco. E olha que eu nem tenho saco... Não tenho mais saco pra brincar de dizer que a vida é legal, não acredito mais nessa mentira há tempos, a vida é um porre, é ruim, é inútil, é desagradável. Viver não tem nenhuma razão, nenhum sentido, nenhuma graça.

Jovem gosta da vida porque só vive, não pensa na vida. Mas a gente vai vivendo e começa a pensar. Por que será que é tão importante para a raça humana ficar se dizendo o tempo todo que a vida é legal? Se fosse mesmo seria preciso ficar dizendo tanto?

Por que a maioria das religiões condena o suicídio? Não seria para que não haja suicídios em massa? Por que a gente tem tanto medo da morte se a vida é muito mais apavorante? Deve ser porque sem esse medo atávico a gente se recusaria a viver. Quem iria querer ficar nesse mundo tão ruim se não estivesse preso por um instinto que nada tem de racional?

Na vida tem prazer? Tá bom; tem prazer sim! Mas quais são eles?

Sexo? Para a maioria de nós é pecado, é tabu, é nojento, é comércio, é forçado de uma forma ou de outra. Ou é forçado porque a mulher transa só com o marido para ser honesta, ou é forçado porque o marido transa só com a mulher para ser responsável, ou é forçado porque a amante transa o homem casado por dinheiro, ou porque a menina ou o menino transam porque seus hormônios não são domináveis, ou é forçado porque já que todo mundo transa... Ou é forçado mesmo.

Estupro legalizado ou não.

Sexo sem nenhum tipo de amarra praticamente não existe; ou realmente não existe, exceto, talvez, entre os animais; mas a maioria deles tem a restrição do cio; se a fêmea não estiver no cio não tem diversão. E tem os que precisam morrer para transar, como o louva-a-deus e os zangões.

E sexo, se não tiver amarras tem consequências; é a gravidez indesejada, a traição ou o medo dela, a doença venérea mais ou menos grave, a acusação de pecadora, galinha, puta, vagabunda, “viado”, “sapatão”... Ou a cobrança que obriga a mentir. O garanhão que brocha, o sátiro que gostaria de encontrar sua alma gêmea, o cara que tem o pinto pequeno e é obrigado a tentar acreditar que tamanho não é importante sem acreditar de verdade, ou aquele que, coitado, nem sabe se tem pau pequeno ou não.

Sexo, para a imensa maioria, acaba sendo na verdade algo ruim que se finge que é bom, algo bom que deixa culpa e sofrimento, algo morno de que não se fala nada ou se fala mentiras.

E a vergonha do corpo? Quantos gordos e gordas? Quantos velhos e velhas? Quantos feios e feias? Quanta gente tão longe da perfeição!

Que outro prazer tem? Comer. Mas comida nem todo mundo tem, e quem tem nem sempre tem o suficiente para o prazer. E quem tem para o prazer não pode porque engorda e gordura é feio. Tudo bem; é doença também, mas quem liga? O ruim mesmo é que ser gordo é feio. A mídia mandou e a gente acredita.

Comer por prazer dá vergonha, quase tanto quanto o sexo; dá culpa quase tanto quanto o sexo. Comer por prazer também é pecado, como o sexo.

Comer é tão ruim quanto fazer sexo.

Beber? Mas beber vicia, dá ressaca, vira do avesso, destrói lares, mata de cirrose. Beber é pecado, é vício; em muitas culturas é proibido.

Criar filhos? Criar filhos não é prazer, é obrigação do instinto!

É o instinto irracional da entrega, de cuidar e amar aquele que se não fosse o instinto que impede até pensar nisso seria a pessoa que primeiro desejaríamos matar. Sim, é cuidar de quem ficará no seu lugar quando você morrer, e por instinto você não quer morrer, mas prepara seu substituto como boi baixando a cabeça para o abate.

Amar uma pessoa é um prazer? Talvez por um tempo, mas logo acaba. A pessoa não quer mais, você não quer mais, a pessoa morre, você morre, a pessoa te trai, você trai, a pessoa adoece, fica inútil e você tem que cuidar, você adoece, fica inútil e a pessoa tem que cuidar. Amar dói.

Ter amigos é um lado bom da vida? Sim, com certeza! Para aqueles que conseguem tê-los, existem tantas pessoas sozinhas, sem amigos e sem habilidade para fazê-los. Amigos são um bem para os que não são traídos por eles, para os que não os usam e não são usados por eles. Não é à toa que há um consenso entre nós: o de que as amizades verdadeiras são raras.

Sim! A amizade é linda. Mas amigos morrem, amigos sofrem, desaparecem, adoecem e morrem quando só nossa impotência pode estar presente, e às vezes nem isso.

Sem contar que amigos não são outra coisa além de distrações que nosso instinto nos coloca para que aceitemos a vida sem rebeldia e sem suicídio. São nossos aliados na aceitação do inevitável.

Viver é esperar a grande desgraça. E não se pode nem pensar em escapar. Ela virá. Ela virá! Com toda certeza, virá. Você só não sabe quando. Será a morte, uma doença, a velhice sem esperança, um acidente que te mutila. Às vezes mais de uma dessas coisas, juntas. Vem uma desgraça, duas ou várias, mas vem, sem dúvida nenhuma vem. É só uma questão de tempo.

As pessoas são boas? Mentira, somos todos terrivelmente ruins, não mato porque sou covarde, você não mata porque tem medo da lei, ou porque está alienado pela religião e, nesse momento, ela diz para não matar.

Mas houve tempo em que a religião mandou matar e talvez volte a fazê-lo, então você também vai matar, torturar, roubar, humilhar, caluniar, e dizer que é a vontade de Deus. A religião leva a isso, é só uma questão de tempo. Tempo no passado ou tempo no futuro, talvez os dois.

Tem Deus para te consolar? Só se você fechar bem seus olhos, seus ouvidos e sua mente. Só se você não pensar nem por um momento na dor que te cerca, que está sempre e a todo momento em você ou a seu redor.

Deus como consolo? De que maneira se a religião afirma que Ele mandou você não pensar? De que maneira se a religião quer que você veja como pecado tudo aquilo que é contrário àquelas leis que, em algum momento, um homem cheio de fanatismo, paranoia e esquizofrenia, às vezes junto com outro sádico, humilhado e cheio de ódio doentio, escreveu e disse que foi o próprio Deus que o fez?

E você acredita porque esse bando de loucos escreveu também que se você não acreditar será porque tem uma aliança ou está sob a possessão do diabo – essa entidade que parece inspirada nas paranoias desses profetas lunáticos.

Se duvidar deles você será um descrente, um herege, um ímpio, um pagão, um qualquer-coisa que merece em tempos de paz o asco, o medo, a repulsa, o isolamento e até uma piedade rancorosa, e em tempos de guerra a tortura ou a morte. Se você pensar será o isolado porque tudo que você pensar merecerá um “vade retro” e você corre o risco de se tornar o próprio diabo sem nem sequer acreditar nele.

Ah, tem o conhecimento! O saber é um prazer. Mas como se quanto mais sabemos mais sabemos o quanto somos ignorantes? E se sabemos, mais ainda, que nem sequer temos condições de avaliar a extensão da nossa ignorância? Somos amebas olhando para o sol, que pode entender de sol uma ameba? Que podemos entender de alguma coisa nós, pobres macacos pelados?

A natureza é linda! Tem no mundo paisagens de tirar o fôlego do ser humano mais insensível; são recantos verdes, são ilhas em meio a mares azuis, são flores, perfumadas ou não, são animais cuja aparência ou habilidade nos deslumbra, são filhotes cuja beleza e fragilidade cheias de cores e brilhos nos comovem. Tanta beleza quase que faz com que acreditemos no bem.

Mas onde não vemos está o lindo inseto lançando veneno para capturar outro inseto não tão lindo assim, está o belo pássaro cantor se esbaldando de assassinar insetos, está o réptil capturando os filhotes mal saídos dos ovos de pássaros coloridos, está um peixe abrindo a boca e engolindo vários outros menores, às vezes da própria espécie, está um homem preparando uma armadilha para capturar um roedor a fim de vender sua pele, estão todos os seres vivos em uma guerra infinita de assassinatos em massa a que os biólogos chamam Cadeia Alimentar.

Um Deus tem que ter requintes de sadismo para criar tal natureza, e nós temos que ser muito burros para ver beleza nisso. E somos.

E alguém vai querer me convencer de que a vida é bonita?

Atreva-se!

1 de maio de 2020

TODO PRECONCEITO É UMA ACUSAÇÃO

Preconceito significa imputar ao outro
A culpa pela nossa incompreensão
A pessoa preconceituosa
Vê no outro um criminoso
Condena-o
Sem dar a ele o direito de defesa
E frequentemente
Não tem sequer a dignidade
De acusá-lo diretamente
Condenamos o outro
Por ter nascido diferente
Da muito pequena gama de variedade
Que nossa mente limitada
É capaz de aceitar
Acusamos o outro
De ter nascido
Em lugar diferente
De ter sido educado
De forma diferente
De não ter tido
Quem o educasse
Acusamos o outro
De falar outra língua
De ter estado doente
De sofrer um acidente
Acusamos o outro
De pertencer a outra cultura
De chamar de pátria
Outro pedaço de chão
Acusamos o outro
De ter nascido em outra data
De levantar os olhos
Para outro deus
De preferir outra cor
Outro sabor
Outro conceito
Outro som
Outro tipo de amor
Acusamos
Condenamos
Punimos o outro
Por não nos conhecer
Quando nos recusamos a conhecê-lo
Acusamos o outro
Pelos defeitos que manifestamos
Com mais vigor
Acusamos
Condenamos
Executamos o outro
Com mais veemência
Com mais furor
Quando
No espelho da verdade
Recusamos enxergar
Nossa própria essência.