27 de setembro de 2024

O HEROICO NO SER HUMANO É NÃO PERTENCER A UM REBANHO

O que significa “pertencer a um rebanho”? No contexto da frase, parece significar algo como: “Fazer parte de um grupo a que sigo cega e voluntariamente sem questionar o caminho, o destino, a liderança”. Partindo dessa definição, vou tentar me definir a partir algumas características que assumi e aceitei como minhas para ver se tenho algum grau do heroísmo de que fala Saramago. 1 – Sou uma mulher cis porque nunca questionei minha feminilidade. Desde sempre me aceitei, me comportei e me reconheci como mulher; com (quase) tudo o que biológica e socialmente é reconhecido como “mulher”. Usei e gostei de usar cabelos compridos, saias, vestidos, sandálias, o nome feminino que me foi dado, etc. Mas sempre teve coisas típicas do “universo feminino” que me foi apresentado que eu nunca aceitei como válidas para mim: Como, por exemplo, qualquer conversa que envolvesse a palavra “virgindade” como regra ou elogio; a “obrigação” de ter o casamento como objetivo de vida; a submissão ao macho da espécie; o “medo” de ter amizade com pessoas não cis para “não ser confundida com elas”. A juventude dos anos 70 era muito preconceituosa! 2 – Sou feminista assumidíssima! Algumas pessoas, principalmente antifeministas, podem argumentar que feminismo é um rebanho, mas eu discordo porque sei que existe mais de um grupo que se define como feminista e que não teria minha adesão porque nem tudo que alguém diz ser “coisa de feminista” serve para mim. Por exemplo: Feminismo que exclui pessoas trans não só não tem minha adesão como tem todo meu repúdio porque eu tenho essa mania de achar que as pessoas têm o direito de existir e de ser respeitadas e defendidas contra o machismo estrutural e, principalmente, contra o machismo escroto e assassino, independentemente de ter útero e vagina ou não! E feminismo que coloca todo e qualquer homem como inimigo também não tem minha adesão porque sempre gostei muito de homens, para sexo e para amizade. Como digo sempre: Adoro homens, só não gosto de macho escroto! E não aceito ver homens como inimigos porque, além de conhecer muitos homens maravilhosos, as duas pessoas que mais amo no mundo são homens: Meu filho e meu marido. 3 – Sou brasileira e paulista porque nasci no Estado de São Paulo que, coincidentemente, fica no Brasil. E eu gosto do Brasil, tem lugares lindos e pessoas maravilhosas aqui! Além disso, adoro as criações de muitas pessoas que, no Brasil, produziram arte e literatura usando as tintas, as cores, a inspiração e as línguas brasileiras. Acontece que concordo demais com quem disse que todo patriotismo é um preconceito; que não gosto nem um pouco da ideia de “Nasci aqui e daqui não saio” e que gosto menos ainda da ideia de que uma pessoa é menos do que outra por causa do lugar em que vive ou onde nasceu. Eu saí do país umas poucas vezes e, outras poucas vezes, saí do Estado em que nasci. Nessas saídas, curtas ou não tanto, aconteceu com frequência de eu pensar e dizer a quem estivesse comigo e a mim mesma: “Eu mudaria para cá, passaria o resto da minha vida aqui e não sentiria nenhuma saudade...” Completando com São Paulo ou Brasil, dependendo de onde eu estava. 4 – Sou de esquerda e anticapitalista porque defendo os direitos humanos, a laicidade e a não exploração das pessoas, dos animais e da natureza para benefício e riqueza de algumas pessoas em detrimento da maioria. Sou de esquerda e anticapitalista porque a existência e a ostentação de pessoas muito ricas me causam aversão e desconforto; não só não gosto que pessoas assim existam como não tenho NENHUMA vontade de ser uma delas. Além disso, admiro e apoio iniciativas e projetos de muitas organizações humanitárias, com ou sem viés político partidário, como o MST, a Cruz Vermelha, os sindicatos, o socialismo, o Green Peace, o MSF, etc. Mas não sou adepta de nenhum partido político, não sou apoiadora irrestrita de nenhuma liderança política e não sou militante de nenhum grupo que tenha como objetivo tomar o poder ou moldar o mundo às suas lutas. Nunca “vesti a camisa” de ninguém simplesmente porque não acredito que a realização desses sonhos seja possível. Eu sou humana, mas, como espécie, não tenho nenhuma fé no ser humano. 5 – Sou ateia. Sou MUITO ateia porque, até prova em contrário, que eu não acho possível que venha a ser descoberta ou encontrada, não há nenhuma chance de existir qualquer tipo de ser transcendente e consciente que possa ser chamado de “deusa” ou de “deus”. Alias, não acredito em absolutamente NADA que seja transcendente e que possa ter QUALQUER interferência na vida, no corpo ou na consciência humana. Mas! Sinto uma certa pena e, às vezes, até vergonha, quando vejo pessoas ateias defendendo a ideia de que todas as pessoas que acreditam em deus ou que são adeptas a uma religião são burras. Eu vejo TANTA burrice nessa afirmação! - Posso pensar mais características... mas até aqui parece que não sou parte de rebanho nenhum... o problema é que não vejo nada de heroico nisso. É só eu sendo o que sou.

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