19 de agosto de 2024

DESIGNER INTELIGENTE

 


O texto foi provocado pela imagem acima seguido da pergunta sobre o que você pensaria se entrasse em uma caverna onde ninguém esteve há séculos e encontrasse imagens como essa. 
O objetivo, claro, era a defesa do argumento RELIGIOSO que se quer científico chamado designer inteligente. Minha resposta gerou uma longa conversa. Publico aqui, em essência, as minhas falas:
Obviamente eu (e qualquer pessoa) concluiria que foram seres humanos que fizeram aqueles desenhos. Isso absolutamente não prova que tais seres humanos foram criados propositalmente por um ser consciente. Concluir isso seria extrapolar MUITO a primeira conclusão. Essa é uma versão do argumento do relojoeiro de Paley, um argumento bem velho, manjado e já refutado de várias maneiras por várias pessoas.
Meu ateísmo não é puramente emocional, tanto assim que não digo que é possível provar a inexistência de deus de forma genérica e independente da definição dada a essa palavra. O fato de ter colocado o argumento do relojoeiro de Paley no seu post me diz que provavelmente você vai seguir o padrão de usar argumentos filosóficos já refutados por pessoas conhecidas, como Feuerbach, Hume, Voltaire, Ingersoll e até mesmo Kant. Li sobre esses argumentos, embora não seja filósofa ou especialista, e as refutações são mais convincentes, ou no mínimo tão válidas quanto os argumentos teístas. Daí que, se especificar de qual deus estou falando e levantar as características desse deus, posso provar que ele não existe mostrando contradições. Da mesma forma que a descrição do triângulo pode provar que não existe triângulo de quatro lados, a descrição de um ser paradoxal pode provar que esse ser não existe. Claro que dentro das limitações que nós, animais humanos, temos. Afinal, provar mesmo, não podemos provar sequer nossa própria existência.
Claro que a o desenho na caverna poderia ser aleatório, as probabilidades matemáticas comprovam isso. Porém, tal possibilidade é muito pequena. E eu reconheço como trabalho humano porque já vi trabalhos humanos desse tipo diversas vezes. Mas quem viu universos criados propositalmente por seres superpoderosos para poder comparar e concluir que esse em que estamos é um deles?
Li versões do argumento da “criação perfeita” várias vezes, e já li vários textos muito bem embasados que o refutam de forma bastante sensata e lógica. O argumento vem cheio de "furos" e falhas, estudando um pouco de biologia já dá para perceber que essa "máquina perfeita" nem é tão perfeita assim. E esse é só um ponto do argumento do relojoeiro. Uma piada muito boa sobre ele é dizer que o tal "arquiteto" é tão bom que já projetou nossas orelhas uma de cada lado porque sabia que a gente ia precisar de óculos.
Acho estranho que os defensores do designer inteligente louvam a "perfeição" que provaria uma criação consciente de um ser poderoso e extremamente sábio e, quando as falhas óbvias são apontadas, falam dos engenheiros que constroem carros e prédios que têm problemas de projeto. Se seu designer inteligente é comparável a um ser humano comum e falho, que raio de perfeição você está reivindicando para dizer que ele existe? Seres humanos são imperfeitos, animais são imperfeitos, o universo é imperfeito. E vocês insistem em falar de perfeição só porque nós, os animais imperfeitos, gostamos de como somos, o que nem sequer é verdade porque não vale para todas as pessoas. Não faz o menor sentido!
E se você quiser associar esse tal "designer inteligente" ao deus "de bondade" do cristianismo, a coisa toda fica ainda pior. Os sofrimentos que as falhas de projeto causam nos seres são imensos, o que não combinaria em nada com um ser que reivindica para si o onipoder, a onisciência e a bondade. Basta pensar nos defeitos de formação e, para ficar no comum, a existência de uma membrana chamada clitóris. Quantas mulheres chegaram a ser assassinadas por causa dessa membraninha? Que raio de "designer inteligente" cheio de bondade criaria algo tão terrível?
Orgulho mesmo, a meu ver, é o animal humano se achar tão especial a ponto de ser criação perfeita de um ser perfeito hiperpoderoso que o elegeu como ápice de toda a sua criação. Como digo sempre: "Deus é onipotente, o animal humano é oniprepotente".
Não concordo com seus argumentos de jeito nenhum! Você enche seu texto de "indica", "parece" e outras palavras que não fazem mais do que demonstrar sua fé e sua insistência em ignorar séculos de estudos, explicações e comprovações muito melhores do que as do tipo "parece ser", que na verdade não "parece" tanto assim.
A comparação que você faz desse "criador" com um pai amoroso é um dos argumentos mais absurdos que já vi (e vi muitas vezes!) partir de pessoas que desprezam a lógica e se agarram às crenças sem evidência. Não é necessário estudar muito de ciência, até um conhecimento básico e nada especializado feito o meu consegue fazer com que uma pessoa disposta a pensar sem viés de confirmação e teimoso apego à fé sem base na realidade entenda que muitas das "perguntas inteligentes" a que vinha se agarrando já foram respondidas há muito tempo, e muito melhor do que sua crença diz responder.
Não, eu não estou "chateada" com o sofrimento humano! Estou ciente do fato de que o sofrimento existe (não apenas o humano) e que essa existência é um argumento lógico para refutar a tese de um criador bonzinho. Como digo sempre, não foi mágoa, raiva ou qualquer sentimento pessoal e egoísta que me tornou ateia, eu me tornei ateia justamente quando tirei os olhos do meu próprio umbigo. Eu me tornei ateia quando olhei para o todo e não apenas para mim mesma ou para a raça a que pertenço. Daí que pensar que meu ateísmo é emocional, por mais que seja um direito seu, é um grande engano.
Vamos supor por um momento que haja realmente um criador (indiferente, hipócrita, não muito inteligente e mau). Nesse caso, não fica bem mais fácil explicar porque ele projetou o corpo humano e a natureza cheios de defeitos e falhas de modo a você ter a capacidade de sofrer milhares de malefícios, dores e senso de frustração e insatisfação? Sentindo desespero na companhia desagradável de inimigos e familiares tóxicos, na incapacidade de ter senso de humor e dar boas risadas quando tudo fica tenebroso com catástrofes pessoais e coletivas, de não conseguir se comunicar com palavras e voz por doenças ou abusos sofridos, de ser ouvido e ouvir belas músicas por ser impedido por alguém que te subjugou, de ter o orgasmo porque perdeu a potência e a libido diante de traumas, doenças ou rejeições, a insatisfação de não poder realizar seus sonhos e desenvolver seu potencial, de não poder saborear centenas de alimentos de que gosta e as milhares de paisagens incríveis que não pode visitar? Eu poderia fazer aqui uma lista infinita de coisas horríveis que seu corpo (o corpo humano) mal projetado pode não te dar condições de realizar.
Supondo agora que NÃO existe um ser inteligente como nós responsável por essas criações, não ficaria mais fácil perceber que as coisas boas existem porque se não fosse assim a vida simplesmente não existiria? Que não é necessário que haja nenhum sentimento ou motivação (para o bem ou para o mal) por trás disso? Que o fato de a vida existir da forma como é comprova apenas que claramente é necessário que seja assim para que a vida exista e que, nesse aspecto, a evolução, explica MUITO melhor do que qualquer argumento que se limite a fazer uma lista contendo apenas as "coisas boas" como se isso fosse suficiente para provar o que é apenas fé?
Eu não me nego a admitir que tem coisas que eu gosto na vida. Se não tivesse, tanto eu como todos os animais do planeta, simplesmente desistiríamos de viver e a vida acabaria. Esse é o ponto! E não! Não é verdade que as coisas boas "foram obviamente elaboradas para o usufruto do ser humano", dizer isso é expressar uma fé que, como toda fé, não está embasada em evidências confiáveis e, menos ainda, inquestionáveis. Para "colocar o criador em um tribunal", é preciso primeiro provar que esse criador existe, e não há argumento de designer inteligente que dê conta disso, porque os argumentos dessa vertente do criacionismo são baseados na fé, embora procurem usar a ciência para sustentá-los, em alguns casos com muito sucesso, principalmente quando quem o faz é um cientista falando com leigos.
Vi um vídeo em que um defensor do designer inteligente que é químico, usa a química para "provar" a complexidade irredutível, um dos pilares da "teoria". Eu, por não ser química, sou totalmente incapaz de refutar os argumentos dele; por isso, fui procurar algum texto que tivesse refutação de quem entende mais do que eu. E encontrei!
Porque li o livro O relojoeiro cego, do biólogo Richard Dawkins e ele explica bastante coisas sobre a evolução, sei que, mesmo para pessoas leigas como eu, ler cientistas sérios deixa bastante claro que quem diz frases batidas como: "A evolução não explica nada", tem grandes chances de estar mentindo, ou exagerando muito.
Sua chance de me convencer da existência de um designer inteligente é zero. Do ponto em que estou, não há nenhuma possibilidade de retorno, exceto uma prova empírica que seja óbvia e inquestionável não apenas para mim como também para todas as pessoas. Ou seja, eu só deixo de ser ateia quando e se acontecer alguma coisa que faça com que o ateísmo deixe de existir porque ninguém poderá mais duvidar da existência do "criador" e ninguém poderá mais negar que ele é um deus. Antes disso (não por teimosia mas porque sem provas não tem como eu acreditar em ninguém), não há nenhuma chance.
Quanto à sua pergunta: Os órgãos genitais existem (e têm muitas falhas) para que os animais sexuados se reproduzam. É apenas uma das formas de reprodução do mundo animal, e a cópula dá prazer porque sem esse adicional os animais não desprenderiam energia para fazer sexo em lugar de procurar alimento ou abrigo. A evolução explica bem isso.
Além do instinto reprodutivo de que todos os seres vivos são dotados (que eu saiba), o prazer no sexo, seguramente não foi "criado" por um designer inteligente apenas para a felicidade do animal humano. Chimpanzés e outros primatas adoram fazer sexo. Muitos animais, quase certamente, sentem tanto prazer que arriscam, e até perdem, a vida para procriar. Essa parece ser uma das características evolutivas da vida e da diversidade que a evolução proporcionou.
Pode não ser evolução e sim criação? Pode sim, como eu disse antes, certeza total e completa não podemos ter nem mesmo da nossa própria existência, mas pode ser outras coisas também, como a criação acidental de um ET evoluído que já morreu há milênios, ou uma "semente" com defeito que "pulou" de um outro universo para esse no multiverso infinito e não criado do qual não temos nenhum conhecimento. Dá pra pensar tantas coisas que não podemos provar, mas que são tão válidas como possibilidade quanto o seu "designer inteligente" ou o deus bíblico!
Ah, sim. Reforçando, o livro do Dawkins de que estou falando não é sobre ateísmo, tá? É sobre biologia e ele é um biólogo, portanto, sabe do que está falando.
Não é verdade que é "sem dúvida" um projeto de engenharia incrível! Tanto não é que eu duvido e muitas pessoas, incluindo cientistas, têm dúvidas bastante bem embasadas. Como eu já disse, o corpo humano está cheio de "falhas de projeto" tão sérias que causam mortes. A gravidez tem vários exemplos delas.
Eu não disse que o corpo humano "apareceu do nada", disse que a evolução explica, e muito bem. Se você não aceita a explicação por causa da sua fé, eu posso aceitar porque não tenho nenhuma fé impedindo meu raciocínio.
Eu não disse que o desenho na caverna "só pode ter sido feito por uma pessoa inteligente", eu disse que pensaria que as chances são muito grandes porque já vi desenhos assim antes e eles eram feitos por pessoas, não é a mesma coisa. Eu não disse que o corpo humano "não precisou de ninguém para construir", eu disse que existem outras possibilidades de explicação, além da própria evolução, que é a mais válida e mais corroborada, que valem tanto quanto a sua explicação baseada na fé.
Eu credito na existência de várias coisas e pessoas sem nunca ter visto, não é possível viver sem acreditar em coisas que a gente não viu, por exemplo: eu acredito que tive uma bisavó que veio de Portugal mas nunca a vi, acredito porque minha mãe me contou e eu não tenho nenhuma razão para duvidar. Mas "acreditar" é diferente de ter fé, e eu não tenho fé. Só acredito porque e quando evidências me foram apresentadas de maneira confiável, e deixo de acreditar assim que alguma evidência em contrário apareça.
Não sei se não tem absolutamente nenhum modo de provar a existência do designer inteligente, sei que até agora não vi nenhum que fosse mais convincente do que a evolução; ou do que a semente vinda de outro universo de que falei acima, e essa última é BEM menos convincente do que a evolução porque eu inventei e, por isso, ao contrário da evolução, não tem nenhuma evidência científica que corrobore qualquer parte dela.
Se você demonstrasse um litro de água se transformar em sangue, não importa quando, na frente de um grupo de pesquisa sério em teste controlado, eu certamente consideraria isso um milagre, mas se fizer isso só para mim, eu acharia que é um truque de mágica muito bem feito. Você já leu sobre o James Randi? Ele ofereceu um milhão de dólares para quem fizesse alguma mágica desse tipo, em teste controlado acompanhado por especialistas, a oferta esteve válida durante anos, e o Randi morreu sem ter que pagar o prêmio.
O problema do seu argumento não é defender a possibilidade de existência de algum tipo de criador da vida, o problema é você usar expressões "sem dúvida" ou "com certeza". Como eu disse, não há como negar totalmente essa possibilidade uma vez que não sabemos exatamente como aconteceu, mas essa hipótese está longe de ser a única, ou mesmo a melhor das possibilidades. Repetindo, existem outras possibilidades com tantas evidências e tantos pontos obscuros quanto a do designer inteligente que você está tentando apresentar como única explicação. A gente facilmente pode pensar em uma, ou até mais de uma, como já demonstrei inventando a "semente" vinda de outro universo.
Sei que existem muitas pessoas não religiosas que afirmam que o corpo humano é uma bela obra de engenharia, eu afirmaria isso se estivesse falando com uma pessoa que não usasse o argumento de que "Só pode ser a criação proposital e intencional de um ser inteligente e superior". Pensada como resultado da evolução, sim, a vida (e não apenas o corpo humano) é um evento fantástico, mas devido às muitas imperfeições e às evidências de que muitas delas são resultado da evolução, não fica nem um pouco óbvio que precise existir um criador, por mais que eu saiba que muitas pessoas religiosas não negam a evolução com o argumento do "pontapé inicial", a igreja católica já fez isso oficialmente há um tempo.
Eu não disse apenas que "se água se transformar em sangue... eu certamente consideraria um milagre", eu disse que o faria NA CONDIÇÃO de que isso acontecesse em um experimento controlado. Pensei que essa ressalva tivesse deixado muito claro que eu não acredito, nem por um momento, que bastaria isso ser realizado por uma pessoa em uma espécie de show de mágica. Ou seja, eu simplesmente não acredito em milagres, e até prova em contrário, não acredito em designer inteligente, seja ele chamado de deus bíblico ou não.
Não acredito na existência de um ser criador com muito mais poder e inteligência. Menos ainda que tal ser, se existisse, se rebaixaria a fazer truques de mágica. Além da hipótese que inventei, como eu já disse antes, tem muitas outras que são tão válidas e que têm tantas "evidências" e possibilidades de serem verdadeiras quanto a sua. Uma delas, que inclusive é ou foi defendida de uma forma ou de outra por vários povos e culturas ao longo da história, é o politeísmo. Em observando muitos aspectos da realidade, entre a hipótese de um único criador e a de vários, que inclusive brigam e disputam entre si, o politeísmo faz mais sentido. Mas, no meu caso, não adoto nenhuma sem evidências e provas válidas, e teriam que ser válidas não apenas para mim, mas para todo mundo. Como disse o Carl Sagan "Afirmações extraordinárias exigem provas extraordinárias".
Todas as versões, exceto as científicas como a evolução e os estudos de cientistas como Hawking, têm "bem cara de lenda", e isso inclui toda a mitologia bíblica.
Você lembra que a tal "demonstração autêntica de seu poder" incluiu assassinato de crianças inocentes, né? Isso tem MUITO a cara de mitologia criada por um povo antigo para propagar sua própria religião e seu deus recém criado. Acho muito engraçado quando as pessoas dizem esse tipo de coisa que você acabou de dizer "como criador ele teria o direito de interferir em sua própria criação". Se existisse, teria sim, mas sempre me soa muita pretensão das pessoas religiosas acreditar que um ser capaz de criar o universo está preocupado com um "povo escolhido" e a forma com que esse povo vai puxar o saco dele.
Sim! essa afirmação é extraordinária, e exige provas extraordinárias. Sim, é algo que deveria nos surpreender, e muito, se de repente um ser inteligente desse tipo se provasse existente quando tudo indica que ele não existe, e mais, que se existisse não teria porque se dar o trabalho de interferir na vida de uma espécie insignificante habitando uma rocha insignificante na imensidade do universo. Vai ser muito difícil, impossível eu diria, você conseguir me "ajudar a enxergar" que existe um criador que está preocupado com a maneira como, por exemplo, as mulheres se comportam dentro da "família tradicional cristã", ou que mesmo sendo tão inteligente, cometeu tantos erros com a sua "máxima criação". A meu ver não há nenhum quebra cabeça a ser montado ou desvendado.
Acho difícil que o problema seja minha falta de humildade, penso que é justamente o fato de ter me desapegado da prepotência natural do animal humano que me tornei ateia. Como digo sempre, eu me tornei ateia quando tirei os olhos do meu próprio umbigo. Daí que, para mim, é você que deveria pensar se não seria interessante ajustar o seu ponto de vista com relação às pesquisas e estudos científicos que existem, são acessíveis e, embora não tenham respostas para todas as perguntas, são muito úteis para tirar vendas de fé sem comprovação e de prepotência especista que leva as pessoas a aceitarem as explicações mais fáceis e vantajosas para seus egos inflados.
Eu me sinto muito tranquila se não souber de onde viemos, aceito de forma muito natural que posso nunca saber. O que não quero, de jeito nenhum, é me agarrar a "respostas" que não me servem por falta de provas, de evidências e, em última análise, por mostrar um ser criado na idade do bronze por homens primitivos, preconceituosos e misóginos.
Respondendo à sua pergunta do laboratório se uma porção de água fosse transformada em sangue, sim. Eu passaria a considerar a possibilidade de haver uma fonte de poder maior do que nós humanos possuímos ou, no mínimo, maior do que eu possuo, uma vez que não saberia nem mesmo imaginar uma explicação lógica. E, por não saber, em nenhum momento eu afirmaria que "foi deus" ou que "com certeza foi o designer inteligente que agiu", muito menos me ajoelharia e pediria perdão pelo meu ateísmo. Eu esperaria que os cientistas estudassem o fenômeno e, enquanto não obtivesse nenhuma resposta, continuaria a pensar que algo estranho aconteceu e eu não sei o que foi. Enquanto não obtivesse resposta, acharia legal imaginar possibilidades, e provavelmente escreveria alguns contos de ficção científica.
Não há claros. Há o desespero, o medo e a prepotência das pessoas que as leva a se agarrar às suas fantasias e fazer qualquer coisa para "confirmá-las", incluindo os malabarismos mentais mais confiantes. Essa do ser hiper poderoso que propositalmente permite que imperfeições óbvias aconteçam e permaneçam é um bom exemplo do que acabei de dizer.
Estou velha, faz muito tempo que não estou preocupada com essas coisas que você listou para tentar explicar minha "resistência" em aceitar suas "provas". Para falar em "progresso espiritual" você precisaria primeiro provar que existe essa coisa que você chama de espírito e, depois, provar que se submeter a algo sobre cuja existência não há provas suficientes seria um progresso.
Seu argumento da água que bebemos ser transformada em sangue no nosso corpo é tosco demais, desculpe mas cheguei a dar risada aqui, e olha que nem sou bióloga! Para começar NÃO é isso que acontece no corpo. E não vou dizer mais nada sobre outros furos desse seu argumento porque não sou bióloga, mas bastaria procurar no Google que você certamente encontraria. Esse que você usou é uma versão do argumento do bolso vazio, que usa coisas que a ciência não faz para dizer que só deus pode realizar tal façanha impossível. Já disseram isso sobre, por exemplo, a amônia, antes que a ciência fizesse e essa substância se tornasse comum a ponto de ninguém mais pensar que "só o corpo humano perfeito é capaz de criar".
Por mais complicado que seja, o que acontece no corpo é explicável pelas leis da física, da natureza, da biologia, pela evolução. Não tem nada a ver com uma mágica de transformar um copo de água em um copo de sangue. Todas as perguntas que você faz não são suficientes para tornar a biologia um milagre de um ser transcendente, e seriam muito bem respondidas por mim se eu fosse uma bióloga competente, mas não sou.
As pessoas criaram mitos para explicar o que não entendem desde os primórdios da humanidade, e até hoje fazem o possível para continuar acreditando neles, com algumas modificações, como inserir a ciência; mas, na base, a raça humana se compõe do mesmo animal assustado que sacrificava ao trovão por medo dos raios que não sabia o que era. Tudo que não sabe explicar, o ser humano tem a tendência de "explicar" afirmando a existência de algum ser mitológico.
Há décadas que eu não preciso nem desejo solução para os problemas que ameaçam a humanidade, que convivo muito bem com a resposta "Eu não sei". Claro que gostaria de saber mais, sempre leio livros e vejo vídeos sobre ciência para aprender mais, mas minha vontade de saber nunca vai ser tão urgente a ponto de eu aceitar uma resposta que tenha como base apenas a fé. Para mim é fantasia demais esperar que a solução venha de um ser poderoso tal como um Criador. Sem provas não faz o menor sentido se apegar em mitos.
Não acho que "temos chances reais de algum amparo" com ou sem esse tal ser, não temos amparo nenhum fora do que podemos encontrar em nós, nas pessoas que amamos, em nossas ações e nossas melhores qualidades, se pudermos usar isso em lugar de nos odiar e nos destruir. Fora isso, nós, os animais humanos e todos os demais que dividem esse torrão azul conosco, estamos sozinhos, independente de existir ou não um "designer".
Seu argumento não é válido porque faz analogias impróprias como se provasse algo que não se provaria dessa forma porque não seria similar. Células são comparáveis a máquinas? Sim. Mas um criador do universo não precisaria obrigatoriamente existir, e caso existisse, não seria obrigatoriamente comparável a um engenheiro.
Povos antigos terem atribuído identidade "errada" ao Criador não anula sua existência. Mas também não a confirma. Dizer que eles estão errados não prova que você tem razão. Você está usando a mesma descrença que eu. Do meu ponto de vista, você está tão errado quanto eles. Tem uma frase que diz algo assim: "Se você rejeita todos os deuses menos o seu, então você pode entender porque eu rejeito o seu".
Acho que muitas pessoas encontraram na complexidade das descobertas científicas, maneiras de usá-las para tentar se agarrar mais ainda a suas crenças e mitos. O Antony Flew se declarou deísta, mas estava bastante velho e parece que apresentava sinais de problemas mentais. É compreensível que, ao final da vida, uma pessoa passe a ter ainda mais medo da morte e ainda mais razões para se agarrar às crenças religiosas, mesmo sendo um intelectual, cientista ou filósofo, afinal, são seres humanos.
Como eu disse antes, a complexidade não prova a existência de um deus, por mais que sua crença veja dessa forma. O fato de células serem comparáveis a máquina também não prova a existência de deus, principalmente porque a analogia não é perfeita e a forma como isso acontece é conhecida e não implica obrigatoriamente a interferência de uma "mente inteligente", se fosse assim não existiriam biólogos ateus.
Não existe prova da existência de nenhuma "Mente Inteligente", muito menos de que ela esteja supervisionando cada mitose e meiose celular, e a comparação entre seres humanos e uma "mente superpoderosa" é muito forçada. Se existisse essa tal "mente", ela seria tão comparável ao ser humano quanto somos comparáveis a um floco de neve. Talvez menos ainda.
Acho que chegamos a um ponto em que ficaremos "andando em círculos", você diz que tem evidências, provas e indicações, eu digo que suas evidências parecem mais com fé do que com razão e nem eu vou aceitar seus argumentos nem você vai aceitar os meus. Não tem como você me convencer porque li livros e vi argumentos muito mais convincentes e lógicos de pessoas que têm muito mais conhecimento do que nós dois sobre física, biologia, astronomia, neurociência, paleontologia, história. Até prova em contrário, eu fico com o que aprendi com essas pessoas.
Livros que li e recomendo muito: "Cérebro e crença", de Michael Shermer, que mostra como nosso cérebro é bom em nos enganar; "O relojoeiro cego", do Richard Dawkins, que mostra que a evolução explica mais do que o senso comum pensa; "Um universo que veio do nada", de Lawrence Krauss, que mostra o quanto nós somos insignificantes para sermos tão especiais como a crença religiosa quer acreditar, e "Breves respostas para grandes questões", de Stephen Hawking, que responde muitas perguntas de forma científica. Esses são alguns livros que li e ampliaram meu ateísmo, que até então quase se limitava ao deus bíblico e seus derivados.
Sobre “crenças limitantes” acho que o animal humano tem mais mesmo é o contrário: A crença prepotente de achar que sabe o que não sabe e de se achar a perfeição em forma de “máquina”. Muitas pessoas já disseram que a ciência nunca afirma saber tudo, quem faz isso é a religião. E eu acrescentaria que a ciência não afirmar saber tudo, não é por ter algo do tipo “crença limitante”, é o contrário disso. A ciência está sempre buscando o conhecimento e sabe que quanto mais respostas encontra mais perguntas surgem. É como disse o Sagan: Eu não quero acreditar, eu quero saber. E se tem uma coisa que a ciência sabe é que tem coisas que ela muito provavelmente nunca vai saber.
A palavra “crença” não faz muito sentido quando estamos falando em ciência e em busca de conhecimento. Não porque as pessoas, mesmo as pessoas cientistas e ateias, não têm nenhuma crença, mas porque para elas a palavra “crença” é MUITO diferente da palavra fé, ou seja, suas crenças são provisórias e estão prontas a serem abandonadas diante de uma resposta melhor que venha a ser descoberta. As pessoas que têm crenças, no sentido mais próximo da palavra fé, costumam preferir ignorar ou “ressignificar” respostas que contradigam aquilo que elas acreditam. Até cientistas religiosos (que existem, eu sei) fazem isso. Mas não enquanto fazem ciência! E designer inteligente, por mais que as pessoas que defendem isso digam o contrário, é crença no sentido de fé.
Quanto a “busca”, as respostas que porventura busque, não serão encontradas nesse campo pseudocientífico do designer inteligente. Esse eu já tenho informações suficientes para descartar sem remorso ou curiosidade. Podemos comparar com qualquer panaceia: Sei o suficiente de medicina, por menos que seja e por mais ignorante que seja nessa área, para saber que não preciso me dar ao trabalho de aprender uma oração e uma dança quando tenho alguma doença cujo tratamento adequado é um analgésico ou um antibiótico, por isso procuro a medicina e não uma benzedeira... ou a homeopatia.
Você pergunta “Por que os maquinários de uma empresa sem alguma intervenção inteligente constantemente param, mas a máquina do corpo humano sem intervenção de alguém inteligente, continua funcionando? Como assim a analogia não é perfeita?”
Mas não são vocês que dizem que o tal Designer Inteligente é um ser absolutamente superior? Como querem que seja normal comparar suas “criações” com as criações de seres imperfeitos como o animal humano? Brincadeiras à parte, o que falta à sua pergunta é a compreensão da evolução tendo o cuidado de “desvesti-la” da crença no designer inteligente. É ver a evolução como a ciência a vê; a ciência séria, não a pseudociência.
Outra coisa que certamente ajudaria, é ver que não é verdade que “a máquina do corpo humano sem intervenção de alguém inteligente, continua funcionando”, pelo menos não do mesmo jeito. Afinal, a evolução está em ação, está acontecendo e não só o animal humano como todos os outros animais, estão sofrendo mutações (que são basicamente “falhas” na replicação das e no interior das células) o tempo todo, e essas mutações continuam deformando, matando ou impedindo o nascimento de indivíduos e, vez ou outra permitindo e até facilitando o desenvolvimento de indivíduos que a passam adiante em sua descendência, quando essa mutação o torna mais apto a sobreviver em seu habitat.
Embora as pessoas tenham o direito de acreditarem no que quiserem e em questão de fé tudo que se pode dizer é que esse é um direito individual e coletivo, o fato é que a evolução NÃO PRECISA de um designer inteligente! Simples assim.
Portanto, eu também não preciso acreditar nisso quando a ciência me dá todas as respostas que me satisfazem, incluindo a resposta: Não sabemos.

OS LIMITES DA MALDADE HUMANA

Vendo a série O conto da Aia, depois de ter lido o livro que a inspirou e também a continuação, lembrei da frase do Einstein: 
"Duas coisas são infinitas: o universo e a estupidez humana. Mas, no que respeita ao universo, ainda não adquiri certeza absoluta".
E pensei que a palavra "estupidez" pode ser substituída pela palavra "maldade".
Quantas pessoas com quem convivemos, que nos atendem nas lojas, mercados, órgãos públicos, que vemos na televisão, nas redes sociais ou com quem cruzamos pela rua não seriam felizes, convictas e dedicadas Tias Lydias, Serenas, estupradores e assassinos de aias e martas?
Pessoas más que se julgam boas e que, por isso mesmo, não têm limites e não se arrependem nunca.
Quantas pessoas assim existem no mundo? 

17 de agosto de 2024

SOBRE O BEM E O MAL



O deus cristão, cuja definição comum costuma envolver dizer que ele é o Bem; o demônio, diabo, capiroto e mil outros nomes, que também é frequentemente definido como o Mal, ambos são deuses e deuses não existem. 
Mal e bem são definições que nós, animais humanos, damos para as coisas que nos prejudicam, nos fazem sofrer, nós vemos e sentimos como erradas... e para as coisas que nos alegram, nos fazem sentir bem e percebemos como corretas. 
Como somos animais falhos, defeituosos e, em muitas situações, podemos nos tornar nós mesmos o bem ou o mal, essas definições não têm como ser perfeitas, precisas e definitivas. 
Portanto, o bem e o mal existem e não são tão relativos como muitas pessoas insistem em afirmar. 
Mas o Bem e o Mal, seja como entidade ou como conceitos absolutos, além de nós ou "implantados" em nós, como pregam algumas crenças, esses absolutamente não existem!

4 de agosto de 2024

MEU ATEÍSMO



Para mim não foi escolha. Eu acreditava porque desde sempre minha mãe dizia que existia, ela falava das maravilhas de Jesus e dizia que Jesus está no meu nome porque ele é meu padrinho. Eu gostava muito disso, conversava com Jesus como meu padrinho especial. Eu também acreditava em deus e que ele era tudo aquilo que minha mãe dizia.
Então, lá pelos meus 14 anos, resolvi ler a bíblia para conhecer em primeira mão tudo o que minha mãe dizia que Jesus e deus fizeram. Foi uma decepção imensa! Deus era um assassino malvado e vingativo que odiava as mulheres e Jesus não respeitava nem a própria mãe! Fiquei horrorizada!
Eu não sabia não acreditar, nem sabia que era possível não acreditar. Eu não conhecia a palavra ateu a não ser como ofensa, como sinônimo de uma pessoa muitíssimo má. Então, o que fiz foi dizer a mim mesma que aquele livro estava todo errado, que nem deus nem Jesus eram como apareciam no livro.
Eu dei a eles as características que minha mãe ensinou, acrescentei todas as bondades que me pareceram condizentes com seres tão poderosos e bons, disse a mim mesma que eles eram assim e não como a bíblia mostrava e não pensei mais no assunto.
Passaram muitos anos até chegar a internet e eu descobrir que existem pessoas ateias e que elas não são pessoas horríveis, até eu descobrir por que as pessoas se tornaram ateias e começar a fazer as mesmas perguntas, ler os mesmos livros, questionar os mesmos pontos, ler a bíblia de novo e encontrar ainda mais absurdos e incoerências do que tinha encontrado aos 14 anos.
Daí eu me descobri ateia, e não tem nenhuma chance de eu voltar a acreditar novamente.

16 de junho de 2024

LEMBRANÇA



Sempre tenho dúvidas sobre minhas lembranças de infância. Sempre acho que não foi assim que aconteceu e que meu cérebro me enganou fabricando uma lembrança que me favorece e me torna a "heroína" em lugar da vilã que na verdade fui. Não sei, portanto, se foi isso mesmo que aconteceu, sei apenas que é essa a lembrança que tenho e que, nessa lembrança, talvez nesse "universo paralelo" criado pelo meu cérebro, eu tive uma professora que era do tipo que exigia, com muito rigor e gritaria, silêncio e "comportamento" da turma. Um dia, estávamos com nossas carteiras organizadas em grupos, fazendo uma atividade qualquer e uma menina ao meu lado soltou um assovio de espanto diante de alguma coisa de que não me lembro. Aquele tipo de assovio quase involuntário... A professora surtou. Exigiu que a pessoa se entregasse, exigiu que alguém delatasse quem assoviou, ameaçou deixar todo mundo sem intervalo. Enquanto tudo rolava, vendo que não havia mais aula, peguei meu caderno de poesia debaixo da carteira e comecei a folhear, relendo meus poemas prediletos. Levei um susto quando o caderno foi arrancado das minhas mãos e a professora gritou "Já não basta o que você fez hoje?". Só então percebi que ela achava que tinha sido eu. Respondi que não fui eu, que eu sabia quem foi mas não diria porque não era dedo-duro. Ela começou a gritar ofensas balançando o dedo indicador na frente do meu rosto. Não lembro como aconteceu, sei que de repente segurei a mão dela e mordi, com toda a força, aquele dedo balançante. Ela gritou e me mandou pra diretoria. Como o diretor me conhecia bem, não recebi nenhum castigo a não ser esperar o sinal e ir para o pátio curtir o recreio. A partir daquele dia a professora corrigia minhas provas com lupa e descontava cada errinho para que eu não tivesse boa nota. Frustrou-se novamente porque, por mais rigorosa que ela fosse, minha média nunca chegou a ser menor do que 8,5... O que tenho a dizer hoje é só uma coisa: Ainda bem que ela não era professora de matemática, se não eu estaria ferrada mesmo.

26 de abril de 2024

COMO SERIA



Muitas pessoas tentam me convencer de que há um deus único e verdadeiro que criou, a partir do nada, a Terra e todo o universo. Dizem que esse deus é onipotente, onisciente, onipresente, justo e sumamente bom. Se esse deus existisse e fosse como as pessoas que acreditam nele juram que ele é, o mundo criado por ele, no mínimo, teria essas características:

- Todas as águas seriam potáveis, incluindo a água dos mares.
- Todas as terras seriam férteis e produziriam em abundância.
- Todas as árvores seriam frutíferas e todas as frutas seriam permitidas, comestíveis, nutritivas e saborosas para todos os animais, incluindo o animal humano.
- Todas as folhas, talos, raízes, cogumelos e gramíneas seriam comestíveis, saborosos e nutritivos para todos os animais, incluindo o animal humano.
- Nenhum fruto, folha, talo, raiz, fungo ou gramínea conteria qualquer tipo de substância venenosa ou prejudicial à saúde de qualquer animal ou pessoa.
- Todo o planeta teria clima ameno, nada de calor ou frio extremo.
- Todos os animais seriam dóceis e não agressivos, incluindo o animal humano.
- Todos os animais seriam vegetarianos, inclusive o animal humano.
- Nenhum animal, incluindo o animal humano, se reproduziria em quantidade tal que ameaçasse o equilíbrio do planeta.
- Todas as pessoas seriam honestas, bondosas e altruístas.
- Todos os animais nasceriam e viveriam a vida toda com seus corpos perfeitos e saudáveis, incluindo o animal humano.

Respondam, pessoas religiosas:
Se o seu deus existe, tem os atributos com que vocês o definem e poderia, desde o começo, ter criado tudo da maneira que descrevi, por que nós não somos e não vivemos onde e como acabei de descrever?
A minha resposta é que seu deus não existe. Qual é a sua?
E, por favor, não venham com o argumento do livre arbítrio uma vez que livre arbítrio não existe. Até mesmo a sua bíblia tem passagens que negam tal possibilidade, como êxodo 4-11 e deuteronômio 32-39.
Também não venha com o argumento de que a culpa é nossa porque “pecamos”. Se deus tivesse criado como sugeri, não haveria a tal “árvore do conhecimento do bem e do mal” e não teria acontecido o tal “pecado”.

22 de abril de 2024

REFUTANDO CONSELHOS SOBRE AMOR



Não temos controle sobre sentimentos.
Transbordar amor só é possível
quando a gente ama,
mas é impossível se não amamos.
Porque o amor não é voluntário.
Quem ama sempre doa amor,
mas só para o objeto amado.
Qualquer coisa fora disso
é fingimento ou autoengano.
Quando a gente ama quem não merece,
a gente não percebe que a pessoa
não existe ou não merece nosso amor.
Sentimentos são assim,
eles nos cegam.
Não existe amor abnegado!
O amor sempre quer algo em troca!
Mesmo o amor de mãe,
Talvez o único tipo de amor
que não arrefece se não for retribuído,
dói se houver desprezo
e deseja algo em troca:
A alegria de saber que sua cria existe,
está viva e é feliz.
Não dá pra obedecer ao imperativo “Ame!”
pelo simples fato de ninguém amar
porque e quando quer.
As pessoas simplesmente amam
ou não amam.
E o “ame a si mesmo”
é um péssimo conselho
porque amor-próprio,
via de regra,
é sinônimo de egoísmo.

14 de dezembro de 2023

FILOSOFIA EM PRIMEIRA PESSOA



Escolhi viver como não quero porque quero viver para quem quero.

Não tenho nenhum desejo de escapar da morte e vivo o presente, não porque sou sábia e aprendi a viver superando o medo sem me refugiar no passado ou no futuro, mas porque existe alguém com quem escolhi estar e, para isso, vivo o presente enquanto desejo a morte, não com a pressa agônica de uma suicida mas com a esperança calma de uma pessoa que anseia por chegar em casa ao mesmo tempo em que aprecia a paisagem que se descortina pela janela do ônibus, do carro ou do avião em que está voltando de uma longa viagem que teve momentos agradáveis e momentos ruins em proporções variadas.

18 de novembro de 2023

PARA TEÍSTAS INSISTENTES



Como você consegue não perceber que se existisse um deus que criou o ser humano, a "rebeldia" praticada por esses seres humanos seria parte das características (ou defeitos) da criação?
Como você consegue não perceber que o fato de muitas pessoas não admitirem "seguir as regras e leis” estabelecidas pelo seu deus também seriam características (ou defeitos) da criação desse deus, caso ele existisse?
Como você consegue não perceber que cada pessoa maldosa, egoísta, gananciosa, assassina ou simplesmente má que existiu, existe ou existirá nesse mundo seria criação defeituosa (ou o reflexo da maldade) do seu deus criador, caso esse deus existisse?
Não! O ser humano NÃO é especial, ele apenas se acha especial, se acha tão especial que está destruindo o próprio hábitat sem se importar com o futuro porque para ele só ele importa. E isso seria comprovação de mais um defeito da criação, se criação fosse.
O fato é que a maioria das pessoas do planeta acredita na existência de um “Ser Superior”, criador, supervisor e misericordioso, mas esse ser não existe, ou não mantém "a maioria das pessoas que creem nele com vida e vida em abundância", por mais que você diga e se obrigue a acreditar nisso.
Como você consegue dizer que "A respeito das crianças são os pais que têm a obrigação de dar cuidados adequados" quando em uma quantidade imensa de lugares, países e sociedades as mães e os pais fazem tudo por seus filhos e mesmo assim os veem sofrer e morrer por fatores que não têm poder para impedir, como as guerras ou a ganância dos poderosos, ou que sequer têm a ver com o ser humano, como doenças e acidentes naturais?
Como você consegue não perceber que não existe nenhuma "herança divina" quando milhões de pessoas mal conseguem se alimentar e ter um teto decente sobre suas cabeças?
Se para você tudo deu certo, por que isso te impede de perceber que não "dá certo" para muitas pessoas e que, em MUITOS casos não é por falta de esforço, de trabalho, nem de fé?
Olhar para esses fatos foi o que me fez ateia, e não vou pensar na possibilidade de existir um deus bondoso quando em tantos lugares do mundo crianças são torturadas e mortas, enquanto suas mães e seus pais choram em desespero.
Se você consegue, parabéns, eu não sou capaz.
Espero que essa minha fala (totalmente sincera e verdadeira) consiga fazer com que você veja que não tem chance NENHUMA de me convencer da bondade do seu deus assassino de crianças.

3 de outubro de 2023

PERSONALIDADE



Todo tipo de teste de múltipla escolha
Que serve para você saber
Se é uma pessoa assim ou assado,
Sejam os das revistas femininas
Que tendem a ofender
A inteligência das mulheres,
Sejam os que se afirmam
Elaborados por especialistas,
Para a maioria das perguntas
Não tem nenhuma alternativa
Que me serve, me define
Ou com a qual eu concorde.
E quando tem,
Aquela não é a única.
Por isso nunca defini
A minha personalidade.

1 de outubro de 2023

SAUDADE DA INFÂNCIA



Fui criança em tempos bastante antigos e, como mãe e professora, vi infâncias em vários “antigamentes”. Por isso chamo postagens saudosistas da infância de seletivas, desonestas e mentirosas.
Uma delas fala na delícia da infância que tomava água de torneira, esquecendo da infância que não tinha saneamento básico, que era maioria “antigamente” e é realidade para muitas infâncias ainda hoje.
Fico pasma quando vejo postagem de gente que louva as “chineladas” como “educativas”, não entendo como conseguem brincar com algo tão sério. Espancamento nunca foi educação!
Dizem que as crianças colocavam apelidos umas nas outras e ninguém se importava. Quem diz isso está mentindo ou foi uma criança que colocava apelido nas outras e não ligava para o que elas sentiam. Nunca foi divertido, para nenhuma criança, ser chamada de burra, de cabeção, de banana pintada, de “viadinho”, de preta fedorenta. Vi muitas crianças depreciando a si mesmas ou reclamando do próprio nome por causa dos apelidos e da “zoação”.
Crianças e adolescentes paravam de estudar porque acabavam acreditando nas pessoas que as chamavam de burras, ou porque cansaram de ser saco de pancada de todo mundo sem que as pessoas adultas enxergassem.
Sei que ainda acontece isso, mas acontece menos porque graças às campanhas de inclusão tem menos gente conivente e porque, felizmente, homofobia é crime.
Alguém já reparou que os elogios à infância de antigamente em geral selecionam brincadeiras masculinas? Na “infância de antigamente”, os meninos brincavam na rua e as meninas no quintal de casa, e se uma menina se atrevesse a brincar com os meninos ficava logo "mal falada". Como criança levei surra de cinta por conversar com um menino, e como professora mais de uma vez tive que chamar atenção da sala porque estavam “zoando” com uma menina por jogar futebol.
Ninguém em sã consciência e com um senso razoável deveria dizer, sobre nenhum aspecto, que "antigamente era melhor". Para que essa afirmação faça qualquer sentido é preciso especificar muito bem o "melhor" e, principalmente, onde e para quem.

2 de setembro de 2023

LEMBRANÇAS DE MINHAS AVÓS



Perguntaram de minhas avós
Comecei a lembrar delas
E como acontece sempre
Lamentei não saber mais

Minha avó paterna se chamava
Maria Esperança Morato
Uma espanhola de expressão séria
Que sempre parecia brava
Mas eu sentia
Que tinha alguma coisa
De muito doce nela
Nunca conheci ninguém
Que roncasse tão alto
Ela não se casou por amor
E no dia do casamento
A caminho da igreja
Numa espécie de procissão
Em que ia o casal
Familiares e convidados
Passavam pelo cemitério
E ela disse ao quase marido
“Eu preferia estar indo para lá
Dentro de um caixão”
Não sei se nesse momento
Pela surpresa da declaração
Ou em outro trecho do caminho
Meu futuro avô espirrou
E ela disse: “Mariarosetaogue”
(Era assim que eu, criança, ouvia)
Minha mãe traduzia como
“Maria José te afogue”
Eu ainda era criança
Quando meu avô morreu
Depois de sofrer muito tempo
Com um câncer terrível
Ela cuidou dele até o fim
Sem ajuda e sem reclamar
Eu sempre ouvia alguém dizer
Que minha avó viveria muito tempo
Porque “A Esperança
É a última que morre”

Minha avó materna
Se chamava Lourença Caldeira
Fazia o melhor curau do mundo
E todo legume que ela cozinhava
(chuchu, abobrinha, berinjela, etc.)
Tinha ovo mexido no meio
Que ela quebrava e misturava
Quando estava quase cozido
Ficava muito bom!
Como tinha irmãs mais novas
Ela não ficava em casa lavando
Limpando e cozinhando
Como era comum às mulheres
Desde muito nova
Ia à roça com o pai e os irmãos
Onde trabalhava “de sol a sol”
Plantando capinando colhendo
Quando já estava moça
Se apaixonou por um rapaz
Que a pediu em casamento
Mas o pai dela disse
Que ela não podia se casar
Antes da irmã mais velha
Então o rapaz de quem ela gostava
Casou-se com a irmã dela
Não sei quanto tempo depois
Apareceu o meu avô
E ela se casou com ele
Meu avô parece que também
Não era um rapaz comum
Daquela época
Porque quando se casou
Minha avó não sabia
“nem ferver água” como se dizia
E meu avô sabia até costurar
E ensinou tudo a ela
Não sei se minha avó e meu avô
Se amavam quando se casaram
O que sei é que quando ela morreu
Ele se recusou a continuar vivendo
Deixou-se definhar
E poucos meses depois
Morreu também

Essas são minhas lembranças
Que nem sei se estão certas
Provavelmente não

19 de agosto de 2023

O VAZIO DA MÁQUINA



(título roubado do livro de André Cancian, livro que não tem muito a ver com esse texto, mas que li e recomendo muito)

Acho que, por ter lido livros como Anna Karenina, Guerra e Paz e Em busca do tempo perdido e visto séries como The Bridgerton, mais de uma vez me peguei pensando no vazio das pessoas, no exibicionismo absurdo dos títulos de nobreza, na falsidade e futilidade das relações sociais que vi e li nessas obras e comparando com a realidade que a história nos mostra a respeito daquelas e de outras épocas antigas, ou nem tão antigas assim.
Épocas antigas são tantas vezes romantizadas em livros, filmes, séries, textos e comentários! Talvez com algumas dessas obras mais superficiais e menos críticas em mente do que com um mínimo de conhecimento histórico, muitas pessoas usam uma espécie de “saudosismo do imaginário” para tecer críticas a aspectos relacionados aos “dias de hoje”, e à “sociedade atual”.
Principalmente nas redes sociais, é visível que as pessoas que fazem tais críticas, e muitas que as leem, julgam válido o uso desse tipo de saudosismo falsificado como justificativa e comprovação da “verdade” e “profundidade” de suas críticas, que se tornariam muito pertinentes, corretas e graves.
Tais críticas em geral destacam que houve um crescimento terrivelmente anormal e danoso – e até o surgimento - de “relações danosas e erradas”, “juventude perdida” e outras “falhas” que chegaram até nós com o tempo, os avanços tecnológicos e, segundo muitas pessoas, os “retrocessos morais” que temos agora.
Pensando no que li (e em certa medida no que vi e vivi) a respeito “daqueles tempos saudosos”, acho muito difícil concordar com a imensa maioria das análises, levantamentos, críticas e repúdios aos “dias de hoje” que encontro por aí.
O que sempre vejo é uma mistura de memória seletiva que nem mesmo parece ser involuntária com o apagamento nada honesto de aspectos negativos, e até mesmo terríveis, dessa “saudosa” época ideal invocada.
O mais grave, para mim, é o cuidado com que tantas pessoas que viveram ou estudaram os “tempos antigos” que estão romantizando ignoram aspectos negativos e diferenças de todo tipo, fazendo uma seleção e um recorte para listar “maravilhas” inexistentes ou presentes apenas em alguma medida e em uma parte muito pequena de um grupo bastante restrito.
Um exemplo é a “infância livre e feliz” das crianças brancas do sexo masculino das famílias bem estruturadas das classes médias altas nas cidades dos países mais ricos ou “em desenvolvimento”; outro exemplo são as “possibilidades de ascensão social” existentes para os homens brancos das famílias bem estruturadas das classes médias altas com acesso à educação de qualidade nas cidades dos países mais ricos ou “em desenvolvimento”.
Chego a me sentir muito triste ao ver tanta gente propagando, e tanta gente acreditando e reproduzindo, essa mentira tão óbvia de que realmente existiu um tempo em que as pessoas eram felizes porque não havia celular, computador, televisão, feminismo, greve, luta por direitos, paradas LGBTQIA+, ECA... entre outros “vilões” da nossa “pobre” modernidade.

PROVA DE INEXISTÊNCIA



Eu acho que se pode provar a inexistência de deus.
Apenas, a meu ver, antes disso, temos que definir a inexistência de qual deus ou de que tipo de deus estamos provando, e qual é o real "peso" da prova que estamos apresentando.
Porque PROVAR mesmo, com total certeza e sem deixar nenhuma margem para dúvida, não podemos.
Não podemos provar nem mesmo nossa própria existência ou a existência de qualquer coisa que percebemos, ou da nossa própria percepção.
E quanto a "deus", essa palavra é plurissignificativa demais para que apenas o uso dela, sem especificar a que nos referimos quando a usamos. Isso deixaria "fora" do nosso discurso e análise, quase certamente, alguma outra (ou outras) definição existente ou possível da palavra "deus".

7 de agosto de 2023

ESCRITO BASEADO EM UM TEXTO CRÍTICO À JUVENTUDE ATUAL



AS TRISTES GERAÇÕES QUE SE ESTRESSAVAM E SE FRUSTRAVAM MAS NÃO SABIAM DISSO

Homens não lavavam suas cuecas, se casavam cedo para a mulher lavar enquanto se consumia sem direito a desejar nada além de ser "do lar". 
As pessoas não buscavam conhecimento porque ele geralmente estava além de suas posses. Também não buscavam espiritualidade, só a religião, porque era tudo que tinham.
Se encantavam com decorações natalinas, quando tinham acesso a isso, e com um ipê florido no meio da avenida ou na roça onde trabalhavam, se houvesse tempo para apreciar. 
A maioria das pessoas não reivindicavam direitos de expressão porque nem sabiam que podiam ter direitos. 
A maioria dos homens não tomavam nenhuma atitude a não ser, em muitos casos, descarregar suas frustrações e problemas espancando esposa e filhos.
Muitos consideravam obrigação seguir os passos dos pais, mesmo quando eles eram péssimos. Julgavam apenas os inferiores e não se atreviam a levantar os olhos para qualquer pessoa que estivesse um pouco acima na escala social.
Eram juízes duros e impiedosos para com os filhos, e principalmente as filhas! Condenavam as mulheres e as crianças a escolhas limitadas e obediência irrestrita. Repetiam muito a máxima de que "Criança não tem querer".
Não choravam pelo cachorro maltratado porque "homem não chora" e mulher "tem mais o que fazer", no tanque ou no fogão. 
Desejavam que o homem considerado inferior fosse esquartejado, escravizado ou morto em uma guerra insana "em nome da pátria".
As pessoas tinham uma compaixão duvidosa, porque ela excluía muita gente e sempre tinha em quem mandar.
Amorosidade dos homens era mínima, porque "mulher é inferior e criança mimada vira maricas, bandido ou puta".
Preciso disso! Tem que ser aquilo!” era coisa que criança que dissesse apanhava de cinta ou correia até quem batia cansar o braço. E haja insatisfação! Infelicidade. Descontentamento. Adoecimento. Depressão... tudo "engolido" e extravasado na violência. 
Algumas vezes, se a violência não bastava, restava o suicídio… de que não se falava porque "é pecado mortal", sem direito a enterro e com a certeza do inferno eterno.
Gerações estragadas. Conformadas. Presas em suas culpas e desculpas. Acomodadas em suas gaiolas de mentiras e tabus. 
Não postavam nada nas redes sociais porque não tinha computador, o único consolo era a confissão para o padre, que acreditavam ter o poder de banhá-los no mar curador; mas não tinha! 
Os jovens não limpavam o lixo na praia com os amigos porque tinham que trabalhar, mas arrumavam a própria cama, quando a tinham, porque se não fizessem apanhavam. 
Em casa, as crianças estampavam medo travestido de respeito, os meninos escondiam sofrimento porque não tinham o direito de chorar diante da dor… a dor de ter que crescer sem poder escolher outro caminho que não o traçado pelos pais… 
E ainda tinham que agradecer e "merecer"!”
Parem de idealizar um passado que nunca existiu!