Não sei quanto a você, mas eu
nunca fui entusiasta dessa festa, sempre gostei do feriado, como sempre gostei
de todos os feriados, mas a festa mesmo nunca me atraiu. Quando jovem eu
brincava de ameaçar meu pai dizendo: "Periga de a gente se encontrar em
algum salão!". É que eu soube que meu pai (um "galinheiro",
típico da sociedade machista), costumava ir a bailes de salão. Ele ficava
bravo, dizia que eu não podia frequentar esses lugares, que se me pegasse eu
apanharia muito, e eu só ria. A chance na verdade era zero porque eu não
gostava de bailes de salão nem fora do carnaval. Fui uma vez, quando ainda era
menor de idade, com uma amiga, a um salão da moda da época. Entramos porque a
irmã dela trabalhava no bar que tinha lá dentro e ela quis me mostrar como era.
Forcei minha amiga a sair o mais rápido possível, mal acabei de tomar minha
Cuba-libre gratuita. Um tempo depois, depois que fiz 18 anos e já podia mostrar
a identidade, fui mais duas vezes (no auge das discotecas), uma com algumas
amigas e outra com o namorado, detestei as duas e não fui mais. Não gosto mesmo
de lugares barulhentos e não consigo ver nenhum sentido em ficar me
chacoalhando ao lado de uma multidão aglomerada em um lugar tão barulhento que
ninguém consegue nem ouvir música nem conversar.
Mas, quando morei no Rio de
Janeiro, eu e meu marido gostávamos de sair às ruas à tarde para acompanhar a
pé o pessoal que estava indo para a Rio Branco ver os blocos, às vezes
chegávamos até lá, pegávamos uma cerveja e ficávamos um pouco olhando um dos
desfiles e depois voltávamos passando pelo Largo do Machado onde a gente via as
crianças fantasiadas para o bloquinho infantil que sai de lá. O gostoso é ver
as fantasias criativas e a alegria das pessoas. Até ficamos uma vez no gramado
ouvindo um pouco do Sargento Pimenta. Também não gosto dos desfiles de escola
de samba. Vejo a arquibancada do sambódromo como uma possibilidade de tortura e
não de diversão e não tenho paciência para ficar horas na frente da televisão
vendo o "Desfile das Campeãs". Mas adoro ver gente feliz!
Mudando de assunto, vi o filme
Adú. É muito bom e muito triste. Um daqueles filmes que me provocam sentimento
oposto à caminhada das pessoas para ver os blocos no carnaval. É terrível
pensar que tudo aquilo é real, que tem muitas histórias como a do filme, e
muitas outras piores ainda. Ver aquele cenário de miséria dá uma total
desesperança na humanidade. Sempre que vejo filmes que retratam tragédias como
exploração, escravidão, miséria, penso que a humanidade nunca será mais do que
isso! E penso também que se existisse uma entidade criadora consciente
qualquer, ela seria uma coisa tão abominável que superaria minha capacidade de
imaginar o abominável só pelo fato de ter criado a vida como ela é. Para mim o
maior e mais terrível gesto do personagem deus da bíblia não foi destruir a
humanidade no dilúvio nem mandar Josué cometer genocídio. Foi dizer "Faça-se
a luz".
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