Vida Cadela
Era adolescente, por vezes gritava com um agudo sorriso: Cadelo meu chinelo? Cadela minha blusa vermelha? Cadela minha caneta nova?... O tempo passou, os cabelos são de neve e a pele de pergaminho. Às vezes grita sem som e sem saudades: Cadela minha vida?
10 de novembro de 2024
VIAGENS
O artista mergulha no inferno e no céu
depois retorna
Ele vai onde a maioria tem medo.
Mas ele volta ...
sempre fazendo esse trajeto.
Às vezes morre no céu, no inferno
ou no meio do caminho.
RELIGIÃO E CIÊNCIA
Uma alegação muito frequente com que não consigo concordar é a de que ciência, filosofia e religião podem andar juntas. Ciência e filosofia sim, sem dúvida podem e devem andar juntas, são irmãs, são mãe e filha, são consequência uma da outra. A ciência pesquisa e descobre que algo é assim, a filosofia pergunta por que é assim; a ciência dá uma resposta e volta-se para a próxima pergunta ou tenta refutar a resposta dada, a filosofia pensa o que fazer com essa resposta, pensa no impacto e nas consequências da aplicação desse conhecimento. Mas a religião amarra a ciência e submete a filosofia, a religião tem respostas prontas onde a filosofia tem perguntas, a religião não aceita os avanços científicos se não concordarem com ela, a religião ignora ou nega provas na teima por seus dogmas. Na minha opinião, o casamento da filosofia e da ciência com a religião só serve para atrasar qualquer avanço no pensamento e no conhecimento humano. Porque a religião não busca conhecimento, ela se julga dona dele.
Uma prova do absurdo desse casamento é a religião forçar o ensino do criacionismo nas aulas de ciências. Li recentemente que em vários lugares dos Estados Unidos se faz isso, e há muita pressão para que o mesmo aconteça no Brasil. O atual crescimento do radicalismo religioso aliado ao radicalismo político negacionista e criminoso que vem acontecendo no Brasil e em vários países do mundo mostra bem o quanto a religião pode ser danosa e prejudicial, tanto à ciência quanto à filosofia, quando se infiltra no poder e se sente confortável para impor seus dogmas.
27 de outubro de 2024
AMOR DE PAI
Ontem, o pai do meu filho, falando sobre amor materno, por conta de um programa de televisão que vimos, disse que as mães amam mais porque têm uma ligação biológica mais forte com a criança, por conta da gravidez e do parto. Acontece que, no momento em que ouvi isso, pensei no pai que ele sempre foi para nosso filho e não me senti no direito de afirmar que o amor que eu sinto é maior do que o dele. Não depois de tantas provas de amor paterno, mais em forma de ação do que de palavras, que tenho presenciado nessas quatro décadas de convivência.
Sim! Tenho mais de 40 anos de experiência como mãe e durante esse tempo tive a companhia dele, o pai do meu filho. E também, além da minha própria mãe e do meu próprio pai, ao longo da vida, conheci muitas mulheres que são e foram mães e muitos homens que são e foram pais.
Fazendo um “balanço” de tudo que senti, presenciei e li com respeito à existência e ao comportamento das pessoas que tiveram responsabilidade sobre alguma criança, própria ou adotada. O que vi foi muitas mães maravilhosas, muitas mães não tão maravilhosas assim e, infelizmente, algumas mulheres que nunca deveriam ter sido mães. E, por incrível que pareça, o mesmo vale para os pais.
Pensando na agressividade de muitos pais, incluindo o meu, concluí que muito dessa agressividade se deve mais à maneira que esses homens foram criados do que à menor intensidade de amor que sentem por seus filhos e filhas. Lembro do meu pai me espancando e essa lembrança sempre me abala e dói em mim até hoje, mas também lembro dele me apoiando, conversando comigo, me presenteando com uma alegria tão grande no rosto que não pode ter sido fingimento, e lembro dele trazendo parte da refeição que recebia no trabalho para a gente. Em uma época de grande crise, ele deixava de comer a “mistura” para que nós, as crianças, comessem melhor.
Se a lembrança dos muitos bons momentos, dos cuidados e dos sacrifícios da minha mãe me comovem e me enchem de amor por ela, como posso ter o direito de desprezar a lembrança dos muitos bons momentos, dos cuidados e dos sacrifícios do meu pai e, levando em conta apenas os espancamentos, concluir que ele não me amava? Como posso fazer isso sabendo que meu pai foi criado, não sei sob quais “instrumentos de convencimento”, para se tornar um “macho alfa” e para acreditar que “criança precisa apanhar” por pai e mãe que também “aprenderam” assim?
Uma sociedade patriarcal e misógina produz homens agressivos e misóginos; e produz mulheres que replicam esse patriarcado e essa misoginia. Foi por isso que meu pai me espancou; foi por isso que minha mãe me obrigou a lavar a louça com o chinelo na mão, mas nunca sequer pensou em fazer a mesma coisa com meus dois irmãos. Como posso acusar minha mãe ou meu pai de não me amarem se foi tudo que fizeram desde que nasci e até antes disso?
O amor de pai é mesmo um amor menor do que o amor de mãe ou, mais antigamente do que hoje, os meninos são educados para esconderem o quanto amam e as meninas são educadas para demonstrar amor mesmo quando não o sentem?
Existem, por mais que muita gente ainda tente negar, mulheres assumindo que não têm nenhuma “vocação” para a maternidade, será que mulheres assim não existiam no tempo em que o casamento e a maternidade eram as únicas opções para as mulheres, além da prostituição? Hoje, as mulheres que rejeitam a maternidade vivem suas vidas sem se sentirem incompletas, como minha mãe dizia que eram todas as mulheres que não conseguiam se tornar mães, porque para ela não havia a mínima possibilidade de uma mulher não ter o tal “instinto materno”, apesar das muitas histórias de mães horríveis que ela já tinha encontrado.
Resumindo: Acho que, no caso dos seres humanos, o louvor do amor de mãe em detrimento do amor de pai é mais uma construção humana do que uma realidade.
17 de outubro de 2024
VEUS E AFINS
Sempre que vejo textos tolerantes que falam dos fundamentos, das tradições, de costumes e vestimentas das religiões; explicando, por exemplo, que determinadas práticas, roupas e cabelos têm como objetivo fazer com que as pessoas “não sejam escravas do desejo sexual” ou que determinada prática “tem a higiene e a saúde como objetivo” na sua raiz tradicional; fico pensando "com meus botões" e me perguntando o quanto há de "CONSCIENTE" e de “VOLUNTÁRIO” na adesão de pessoas adultas aos costumes e tradições das religiões dos países, comunidades e famílias em que foram criadas. Principalmente no caso das mulheres que, praticamente no planeta inteiro, estão desde sempre inseridas no machismo estrutural.
Não tenho respostas, só perguntas e um desconforto que não me larga.
Até onde é voluntário o uso de roupas e cortes de cabelo "tradicionais" (tanto para homens quanto para mulheres) de determinada religião?
Sei que a moda ocidental, comercial, elitista, consumista, mesmo que desvinculada de tradição religiosa, também pode ser vista como um tipo de imposição.
Sei que se pode perguntar até onde uma garota que copia as roupas que seu grupo usa é mais livre do que uma muçulmana que "precisa" usar um véu.
Será que eu vejo a primeira BEM menos aprisionada do que a segunda porque também sou uma mulher sem liberdade? Acho que não, mas achar basta?
Tudo que sei é que todas as "fantasias" religiosas, da burca à costeleta comprida dos homens no judaísmo ortodoxo, passando pelo hábito das freiras e pela careca dos monges budistas, me causam estranheza e desconforto.
Nada do que se faz “tradicionalmente” para “agradar”, “louvar” ou “obedecer” a um deus ou a uma religião me parece livre.
Sei que, na prática, a mídia também se tornou uma espécie de deus, ou uma “fabricante” de deuses, porque os cria e os esquece o tempo todo. Mesmo assim, ou talvez por isso mesmo, acho que as “tradições” das religiões institucionais são mais graves e fazem uma prisão com “grades” mais sólidas e correntes mais “pesadas”.
Porque dos deuses criados e propagados pela mídia as pessoas – até certo ponto – ainda podem fugir, mesmo que resolvam substituir por outro e depois outro ao longo da vida. A vantagem é que uma debandada, troca ou fuga pode acontecer (e acontece!) sem que o “deus” rejeitado prejudique as pessoas que o rejeitaram até mesmo após a morte.
Enfim, sinto desconforto quando consigo perceber a manipulação das pessoas, me arrepia todo tipo de manipulação criada pela sociedade civil, pelas ideologias políticas, econômicas e sociais excludentes e alienantes, pelo capEtalismo escravagista de corpos e mentes. Sinto desconforto e sinto MUITA raiva!
Porém, isso tudo não diminui nem um pouco o desconforto que me causam as exigências limitantes impostas pelas religiões. Principalmente porque, frequentemente e em larga escala, as religiões se tornam aliadas essenciais das manipulações todas, com a participação ativa de suas lideranças na exploração, na ambição e na ganância que marcam todos os sistemas opressores.
10 de outubro de 2024
AGRADECER?
Teve uma fase da minha vida em que eu só entrava na igreja ou pensava em deus para agradecer.
Mas aí, em algum momento que não sei precisar, comecei a sentir vergonha de agradecer.
Comecei a perceber que estava agradecendo por algo que eu tinha, mas que muitas e muitas pessoas, tão ou mais merecedoras do que eu, não tinham.
Percebi que isso é sempre verdade no caso de crianças.
Esse “olhar para os lados” e essa vergonha me levaram a concluir que tanto pedir como agradecer, no sentido religioso, é egoísmo puro.
Olhar ao meu redor, me levou a perceber que eu estava agradecendo pela injustiça.
Um deus que desse a mim as boas coisas que tenho, invariavelmente estaria negando essas mesmas coisas a muita gente.
A milhões de crianças!
Esse deus, se existisse, não mereceria agradecimento, não mereceria respeito, não mereceria amor.
CONDENADA À LIBERDADE?
Não é sobre Sartre. Não é sequer sobre o que Sartre escreveu ou disse, porque pouco li e nada ouvi do próprio Sartre. É sobre a ideia de que "O homem está condenado à liberdade".
Eu sempre me senti incomodada com essa frase, desde a primeira vez e sempre que a ouvia ou lia em algum lugar. Não porque quero "desmontar" Sartre. Não é isso!
É que sempre pensei no singular, em mim, na pessoa "condenada à liberdade" e alguma coisa não "encaixava". Mas eu nunca conseguia explicar o porquê desse incômodo. Pelo menos não de forma "filosófica".
Mas agora, finalmente, resolvi recusar a angústia e dizer não. Dizer que não sou condenada à liberdade e não sou responsável por toda a humanidade.
Eu recuso a angústia porque não sou livre para decidir minha própria vida e não sou livre para tomar decisões pela humildade como um todo.
Cheguei a pensar que estar condenada à liberdade pode ser uma ideia válida quando se pensa que quem está condenada não sou eu e sim a humanidade, que nesse caso, tomaria decisões sobre si mesma. Mas nem isso é verdade!
São tão poucas as pessoas que têm poder para tomar decisões que afetam muita gente e, mesmo assim, são tantas as variáveis, os imprevistos, os desconhecimentos, as intencionalidades e os acasos que, a meu ver, não dá para jogar tão pesada carga de responsabilidade sobre ninguém. Seja no singular ou no plural.
Se os pensamentos e argumentos de Sartre estavam certos, sem ler e entender Sartre fica difícil afirmar, mas que sou livre e angustiada eu posso negar sim.
28 de setembro de 2024
LINGUAGEM NEUTRA
Para mim não importa o que o linguista mais "phodástico" do planeta venha a dizer, porque eu, essa euzinha aqui, uma ninguém diante do linguista "phodástico", um nada que não vai mudar coisa nenhuma porque nem como professora de português atua mais; essa euzinha inútil viu que, fazendo um pouquinho só de esforço, consegue usar a língua de modo a abarcar todas as pessoas sem ofender ou excluir ninguém.
Então vou SIM fazer esse esforço! Não preciso mudar a língua portuguesa, não preciso alterar nenhum vocábulo, não preciso fazer nada além de um pequeno esforço e de tomar um certo cuidado na hora de escrever meus textos.
Basta priorizar palavras inclusivas que a língua já tem, como a palavra "pessoa" em lugar de "homem" quando me refiro a toda a humanidade (aliás, a palavra "humanidade" também é boa), basta tentar evitar o masculino "neutro", que é SIM marca do machismo estrutural, por mais que o linguista "phodástico" insista que não.
Por mais que o linguista “phodástico” consiga simpatias que apelem para sua autoridade de linguista “phodástico”, e que use o argumento da “correção” de uma língua que ele e as pessoas que criticam a linguagem neutra dizem amar, eu não vou cair nessa!
Muitas pessoas que babam ovo para o linguista “phodástico” usam como argumento o “amor à língua portuguesa” apesar de muitas vezes nunca a terem estudado; fazem coro e compartilham os discursos do linguista “phodástico” usando palavras como "declinação" que, antes de odiar a linguagem neutra, sequer conheciam e, se duvidar, algumas dessas pessoas usam palavras que sequer pertencem à língua portuguesa para fazer seus próprios discursos.
Estou falando sobre usar a linguagem neutra sem ter que alterar “uma letra!” de nenhuma das palavras usadas porque isso, eu penso, se deixasse o ódio de lado, até mesmo o linguista “phodástico” poderia fazer e recomendar.
E poderia fazer com mais facilidade do que eu uma vez que ele, por ser um linguista “phodástico”, certamente conhece mais palavras e maneiras de organizá-las em um texto coerente sem ter que apelar para o masculino “neutro”. Mas o fato é que não consigo ver nenhum problema em substituir uma letra de algumas palavras e de essa substituição se tornar padrão.
O linguista “phodástico” sabe, MUITO melhor do que eu, que, ao longo da história, muitas palavras que usamos hoje tiveram letras (e sons) acrescentadas, suprimidas e substituídas sem que isso causasse tanta aversão e ocasionasse tantos discursos de ódio. Por que esse ódio todo? Por que essa resistência tão teimosa? Sério, eu não entendo e não tem apelo à “pureza”, à “beleza” ou à “história” da língua portuguesa que me convença de que o linguista “phodástico” e as pessoas que concordam com ele têm razão. Porque, com certeza, o motivo na raiz de toda essa grita só pode ser definido corretamente por UMA palavra: Preconceito.
Adendo: Veja que, no texto que você acabou de ler, não usei o masculino “neutro” nem uma vez. Uso masculino em “linguista phodástico” porque originalmente era resposta a um texto que citava um linguista renomado (homem) discursando contra a linguagem neutra e reforçava com o “fato” de que esse apelo à autoridade não admitia questionamento porque o citado era “o maior linguista do país e talvez do mundo”. Já substituição do “F” pelo “ph” é uma mistura de ironia e necessidade. Mostra que é comum substituir letras sem provocar tanta gente quando o objetivo não envolve o preconceito das pessoas; e também serve para “enganar” o algoritmo e evitar que o texto seja excluído e que a pessoa (no caso eu) receba alguma punição, como exclusão ou suspensão da rede social onde muitas dessas “conversas” acontecem.
27 de setembro de 2024
O HEROICO NO SER HUMANO É NÃO PERTENCER A UM REBANHO
O que significa “pertencer a um rebanho”?
No contexto da frase, parece significar algo como: “Fazer parte de um grupo a que sigo cega e voluntariamente sem questionar o caminho, o destino, a liderança”.
Partindo dessa definição, vou tentar me definir a partir algumas características que assumi e aceitei como minhas para ver se tenho algum grau do heroísmo de que fala Saramago.
1 – Sou uma mulher cis porque nunca questionei minha feminilidade. Desde sempre me aceitei, me comportei e me reconheci como mulher; com (quase) tudo o que biológica e socialmente é reconhecido como “mulher”. Usei e gostei de usar cabelos compridos, saias, vestidos, sandálias, o nome feminino que me foi dado, etc.
Mas sempre teve coisas típicas do “universo feminino” que me foi apresentado que eu nunca aceitei como válidas para mim: Como, por exemplo, qualquer conversa que envolvesse a palavra “virgindade” como regra ou elogio; a “obrigação” de ter o casamento como objetivo de vida; a submissão ao macho da espécie; o “medo” de ter amizade com pessoas não cis para “não ser confundida com elas”. A juventude dos anos 70 era muito preconceituosa!
2 – Sou feminista assumidíssima! Algumas pessoas, principalmente antifeministas, podem argumentar que feminismo é um rebanho, mas eu discordo porque sei que existe mais de um grupo que se define como feminista e que não teria minha adesão porque nem tudo que alguém diz ser “coisa de feminista” serve para mim.
Por exemplo: Feminismo que exclui pessoas trans não só não tem minha adesão como tem todo meu repúdio porque eu tenho essa mania de achar que as pessoas têm o direito de existir e de ser respeitadas e defendidas contra o machismo estrutural e, principalmente, contra o machismo escroto e assassino, independentemente de ter útero e vagina ou não! E feminismo que coloca todo e qualquer homem como inimigo também não tem minha adesão porque sempre gostei muito de homens, para sexo e para amizade. Como digo sempre: Adoro homens, só não gosto de macho escroto! E não aceito ver homens como inimigos porque, além de conhecer muitos homens maravilhosos, as duas pessoas que mais amo no mundo são homens: Meu filho e meu marido.
3 – Sou brasileira e paulista porque nasci no Estado de São Paulo que, coincidentemente, fica no Brasil. E eu gosto do Brasil, tem lugares lindos e pessoas maravilhosas aqui! Além disso, adoro as criações de muitas pessoas que, no Brasil, produziram arte e literatura usando as tintas, as cores, a inspiração e as línguas brasileiras.
Acontece que concordo demais com quem disse que todo patriotismo é um preconceito; que não gosto nem um pouco da ideia de “Nasci aqui e daqui não saio” e que gosto menos ainda da ideia de que uma pessoa é menos do que outra por causa do lugar em que vive ou onde nasceu. Eu saí do país umas poucas vezes e, outras poucas vezes, saí do Estado em que nasci. Nessas saídas, curtas ou não tanto, aconteceu com frequência de eu pensar e dizer a quem estivesse comigo e a mim mesma: “Eu mudaria para cá, passaria o resto da minha vida aqui e não sentiria nenhuma saudade...” Completando com São Paulo ou Brasil, dependendo de onde eu estava.
4 – Sou de esquerda e anticapitalista porque defendo os direitos humanos, a laicidade e a não exploração das pessoas, dos animais e da natureza para benefício e riqueza de algumas pessoas em detrimento da maioria. Sou de esquerda e anticapitalista porque a existência e a ostentação de pessoas muito ricas me causam aversão e desconforto; não só não gosto que pessoas assim existam como não tenho NENHUMA vontade de ser uma delas. Além disso, admiro e apoio iniciativas e projetos de muitas organizações humanitárias, com ou sem viés político partidário, como o MST, a Cruz Vermelha, os sindicatos, o socialismo, o Green Peace, o MSF, etc.
Mas não sou adepta de nenhum partido político, não sou apoiadora irrestrita de nenhuma liderança política e não sou militante de nenhum grupo que tenha como objetivo tomar o poder ou moldar o mundo às suas lutas. Nunca “vesti a camisa” de ninguém simplesmente porque não acredito que a realização desses sonhos seja possível. Eu sou humana, mas, como espécie, não tenho nenhuma fé no ser humano.
5 – Sou ateia. Sou MUITO ateia porque, até prova em contrário, que eu não acho possível que venha a ser descoberta ou encontrada, não há nenhuma chance de existir qualquer tipo de ser transcendente e consciente que possa ser chamado de “deusa” ou de “deus”. Alias, não acredito em absolutamente NADA que seja transcendente e que possa ter QUALQUER interferência na vida, no corpo ou na consciência humana.
Mas! Sinto uma certa pena e, às vezes, até vergonha, quando vejo pessoas ateias defendendo a ideia de que todas as pessoas que acreditam em deus ou que são adeptas a uma religião são burras. Eu vejo TANTA burrice nessa afirmação!
- Posso pensar mais características... mas até aqui parece que não sou parte de rebanho nenhum... o problema é que não vejo nada de heroico nisso. É só eu sendo o que sou.
13 de setembro de 2024
CRER QUE UM DEUS CRIOU TUDO É PREGUIÇA MENTAL - Lawrence Krauss
Mesmo que a ciência concluísse que uma espécie qualquer de mente "incriada" seria necessária para explicar a existência, ainda assim deus não faria sentido. Por que essa "mente" teria que ser deus? E, mais ainda, por que teria que ser o deus do cristianismo, ou o deus bíblico, ou qualquer outro dependendo da religião da pessoa que afirma a existência de deus?
Stephen Hawking recentemente demonstrou que deus não é necessário para explicar a existência do universo: “Não é necessário que evoquemos Deus para iluminar as coisas e criar o universo”, disse ele. Daí que o deus "incriado" não TEM que existir. Mas, mesmo que existisse um designer do universo, na minha visão ele teria que ser algo muito diferente do que se pode chamar deus. Pelo menos muito diferente dos deuses que os seres humanos costumam cultuar em igrejas, templos e sinagogas. Para começar o que as pessoas teístas chamam deus, de acordo com elas, teria criado o mundo para o homem (homem mesmo, o macho da espécie); seria uma entidade que "cuida" do homem, a ponto inclusive de se preocupar com sua vida sexual e com a sua dieta alimentar.
Se existisse uma "mente" criadora que, teoricamente, teria dado início ao Big Bang certamente seria algo totalmente indiferente ao animal humano; e também a todos os outros animais e até, provavelmente, ao próprio planeta Terra. Chego a essa conclusão olhando à minha volta e olhando para mim mesma. Nem eu, nem as outras pessoas, nem a natureza, nem o planeta me parecem criações de uma mente inteligente, preocupada e atenta. Portanto, na minha visão, se existisse – e não acredito que exista – esse “iniciador do Big Bang” teria que ter outro nome, não “Deus”; e não faria absolutamente nenhum sentido rezar, orar ou mesmo ter "pensamentos fortes" a respeito de tal "mente". Assim penso eu.
Repetindo: A ciência já demonstrou, através de Stephen Hawking, que o universo não precisou de um deus (ou seja lá o que for) para existir. E mesmo que existisse algo - frisando que não creio nisso - esse "incriado", essa "mente", esse "designer", ou o que queiram chamar, não seria nada parecido com o que as pessoas teístas chamam de deus. O "incriado", o “designer inteligente” e outras nomenclaturas similares, na minha visão, são criações teístas, são argumentos a que o teísmo se agarra quando não sobra mais nada. Mas esse "incriado", SE EXISTISSE, teria que ter outro nome. Ou seja, essa ideia não serve para sustentar o teísmo logicamente, como muitas pessoas e religiões teístas tentam fazer.
Quanto ao argumento da preguiça mental, embora à primeira vista pareça ofensivo, na minha opinião, faz bastante sentido, embora só se aplique na verdade àquelas poucas pessoas que são academicamente formadas a ponto de conhecer um pouco de ciência, de história e de atualidades. Ter preguiça mental, a meu ver, não é sinônimo de falta de inteligência e, dependendo do ângulo em que se olhe - embora eu nunca me atrevesse a generalizar - acho que podemos afirmar que muitas pessoas bastante inteligentes muitas vezes têm preguiça mental, principalmente restrita a determinados temas. Nesse sentido, eu mesma, durante muitos anos tive preguiça mental com respeito à religião. Quando deixei de ter preguiça e realmente olhei para os lados (ou tirei os olhos do meu próprio umbigo) e pensei de verdade no assunto foi que me descobri ateia. A preguiça de que falo não se limita ao tema religião. No meu caso, acho que tenho preguiça com respeito a vários assuntos, alguns porque, se parar neles, vão me machucar bastante, outros porque não me instigam o suficiente, e outros ainda porque exigiriam um esforço muito grande e não tenho disposição nem me vejo com tempo para isso.
Hawking demonstrou como a física pode provar que é possível do nada surgir alguma coisa, daí que ele simplesmente matou o último argumento teísta. É claro que ainda falta muito para que esses estudos sejam consolidados, mas o caminho foi aberto. Em se confirmando os estudos de Hawking, não tem que ter nada antes do princípio de tudo, não tem que existir ou ter existido nenhum “incriado”. Não sei você, mas eu levo mais a sério os argumentos do Hawking do que os de qualquer teísta que conheça. Esclarecendo: Pelo que entendi, Hawking não fala de um “universo incriado”, fala de um universo que se criou “do nada” sem ter um criador, não é a mesma coisa.
A diferença básica, na minha visão, é que o teísmo, até o de Spinoza pelo que li dele (ou de como o leem), nunca deixa de atribuir mente a esse início. Quando definem "designer inteligente" estão colocando na palavra "inteligente" também o sentido de racional; essa mente teria um propósito, um objetivo, uma vontade. NUNCA vi ou li nada de nenhuma pessoa teísta que se parecesse com a defesa de um deus que não tivesse mente. Acho isso bem lógico, afinal, qual seria o propósito de adorar um criador inanimado? Já o argumento de Hawking - que é mais do que argumento porque é resultado de pesquisas na área da física - não aponta para nenhum tipo de mente, inteligência ou propósito. O início do universo seria tão natural quanto o início do raio, com a diferença de que o raio tem um agente provocador (o encontro das nuvens e cargas elétricas) que incita uma “corrente” de agentes provocadores; e o início do universo não teria, ou pelo menos não sabemos ainda qual seria. Será que consegui me explicar? O deus de Spinoza, assim como o deus de qualquer cientista teísta moderno, ainda tem características de entidade, portanto ainda pode ser louvado e denominado deus; o que Hawking demonstrou como início não é entidade, é “nada” (ou vácuo quântico). Não há como adorar o nada.
Aí um amigo discordou e respondi a ele:
Você diz que “não se prova algo que não é material”, mas eu acho que isso é, no mínimo, bastante relativo. O que seria da matemática se a sua afirmação fosse realmente verdadeira? E esse argumento de que “deus não existe mas É”, embora você tenha razão sobre o fato de que ele é muito usado – já li alguma coisa sobre isso em minhas pesquisas para o TCC – o que tenho a dizer é que não é um bom argumento porque, caso fosse aceito para provar a “verdade” de deus, qualquer um poderia usar esse mesmo argumento para provar a “verdade” de uma infinidade de coisas, desde fadas e duendes até universos paralelos. E eu acho que, embora alguns cientistas defendam a hipótese dos universos paralelos, nenhum deles tenta prová-la dessa forma.
Além disso, podemos provar o que não é material através de argumentação lógica. E a não existência de deus, na minha visão, pode ser provada pela incoerência lógica entre sua definição e o que pode ser observado. Antes deixe que eu especifique que, nesse caso, estou falando do deus definido como onipotente, onipresente, onisciente, bom e justo que criou o universo. Esse deus simplesmente não tem como existir porque ele é uma incoerência lógica.
Algo que “não existe mas é” porque está além da matéria - falando em microfísica e sem entender quase nada, ou nada mesmo, do assunto – normalmente, pelo que li de Marcelo Gleiser e Stephen Hawking, é algo cuja “existência” pode ser detectada a partir da interferência – não sei se essa seria a palavra correta – que essa não-matéria exerce sobre a matéria; é o caso das partículas subatômicas. Deus, até onde eu sei, não pode ser detectado dessa maneira.
Quanto ao fato de achar preconceituosa a afirmação de que crer em deus é preguiça mental, acredite, eu te entendo. Só que vejo de outra forma. Como já disse, reconheço preguiça mental em mim quanto à crença em deus antes de me descobrir ateia e reconheço preguiça mental em mim ainda hoje a respeito de outras coisas sobre as quais não me dou o trabalho de pensar muito. Olhando dessa forma o preconceito deixa de existir, acho.
Você está certo, claro, sobre existirem muitos filósofos, cientistas e pensadores que raciocinaram sobre deus. Eu seria uma louca mentirosa se discordasse de você quanto a isso. O problema é que todos eles, via de regra, raciocinaram SOBRE DEUS e não sobre a possibilidade da existência e da não existência de deus. Eles partem sempre da existência de deus como verdade inquestionável e a partir daí constroem todo seu arcabouço lógico-filosófico; e, quando falam sobre a existência de deus, falam para mostrá-la como verdade, para convencer pessoas que porventura duvidaram. Nesse ponto, eles “dão nó no cérebro” e chegam a dizer os absurdos mais disparatados, como é o caso de Leibniz que disse que esse é “o melhor dos mundos possíveis”.
Será que há mesmo tantas maneiras de crer (no sentido religioso) e que alguma delas dispense a preguiça mental? (Que fique claro que estou falando em preguiça mental sem, de forma alguma, associar isso a falta de inteligência). Para mim, acreditar em deus obriga, sem exceção, a fechar a mente para coisas que, de outra forma a pessoa perceberia sem nenhuma dificuldade. Não consigo imaginar outra maneira de crer em deus que não seja fechar a mente para qualquer argumento contrário a essa crença. É isso que eu pensaria que a frase chama de preguiça mental, e concordo que o Krauss poderia ter usado algum termo menos forte, mas talvez ele quisesse mesmo chocar.
Veja, qualquer pessoa razoável concordaria sem ter nenhuma dúvida a respeito, que um governante que pune e premia o povo sob seu governo de forma totalmente aleatória, que condena à morte sob tortura, sem julgamento, sem acusação e sem sinal algum de que a pessoa cometeu qualquer crime é um tirano sádico e injusto. No entanto, a imensa maioria das pessoas, quando esse “governante” é deus, afirma que ele é justo e bom. Isso não é suspender o raciocínio?
Qualquer pessoa razoável diria que um juiz que condena uma pessoa por um crime cometido por seu avô está abusando da lei, e que um juiz que condena alguém por ter pensado em cometer um crime, no mínimo, não merece estar nesse cargo. Mas se o juiz é deus então está tudo certo porque ele é justo e bom. Isso não é suspender raciocínio?
Qualquer pessoa razoável ficaria profundamente revoltada com a construtora responsável se fosse morar em um prédio ou uma casa que treme, pega fogo, alaga e volta e meia mata ou fere gravemente algumas pessoas que moram ali. Mas quando o arquiteto é deus, embora afirmem que ele é onipotente, dizem que está tudo bem e que essa “casa” é perfeita. Isso não é suspender raciocínio?
Só mais um: Qualquer pessoa razoável chamaria a polícia se visse um pai obrigando seu filho que mal saiu das fraldas a ensaiar seus primeiros passos em ambiente de extremo perigo, como no meio de uma avenida movimentada, e se justificar dizendo que o ama e faz dessa forma para que ele aprenda com o sofrimento. Mas quando o “pai” é deus, essas mesmas pessoas dizem que ele é justo, amoroso e bom. Isso não é suspender raciocínio?
Nunca, nunca mesmo, vi alguém justificando sua fé de forma realmente racional, nem no dia-a-dia, nem nos livros que li. O mais comum é que a justificação da fé seja egoísta (egoísmo esse que a pessoa nega com toda veemência). Deus é bom porque curou (minha filha, minha, mãe, eu mesma, meu irmão...) de uma doença; deus é bom porque salvou (meu filho, meu pai, eu mesmo, minha irmã...) de um acidente grave; deus é bom porque “operou maravilhas” na vida de (meu filho, minha mãe, eu mesma, minha irmã...). E por aí vai. Pensar que se não é para todo mundo não é justiça nem é bondade, principalmente vindo de um ser onipotente, nisso ninguém pensa. Quanto ao outro deus, esse do Big Bang, que poderia ser algo que deu início a tudo. A essa possibilidade, continuo afirmando, deveriam dar outro nome.
29 de agosto de 2024
SARAU ÍNTIMO
Meu neguinho me chamou da sala:- Vem ver isso!
Eu me aproximei, olhei para a tela do computador que ele exibia, “passei os olhos” pelo parágrafo e fiz cara de “não sei o que é”.
- Então senta aí e escuta – disse ele.
Eu me sentei do outro lado da mesa, ele moveu o mouse, voltando o texto ao início e começou a ler. Logo apareceu o nome Camilo e eu quase pulei na cadeira.
- Ah!!!!!!!!!!!
Ele riu, a gente riu, e ele continuou a leitura do conto A cartomante, do Machadão.
E passamos certamente bem mais de uma hora (talvez mais de duas) com ele lendo o conto e interrompendo ou sendo interrompido por mim, para destacar uma palavra mais rara, uma expressão especialmente bem colocada, uma metáfora perfeita, uma frase especialmente genial do genial escritor...
Muitas vezes o objeto dessas interrupções levava a digressões que evocavam outros textos, artistas, artes... e a gente falava, lembrava, procurava no Google...
Quando ele chegou à última “cena” do conto e disse “Fim”, a gente ainda conversou um bom tempo sobre o conto e seu autor, até que outra digressão levasse à leitura do texto Uma vela para Dario, do Trevisan, dessa vez feita por mim.
Então, falamos mais um pouco e encerramos nosso “sarau”.
- Coisas assim sempre fazem com que eu entenda o porquê de um amor sobreviver a mais de quatro décadas de convivência.
***
Para quem porventura tiver curiosidade, vou tentar lembrar algumas das nossas digressões.
Músicas:
Rita, Chico Buarque
Resposta da Rita, Ana Carolina e Chico Buarque
Todo menino é um rei, Roberto Ribeiro
É hoje, Caetano Veloso
Contos:
Noite de almirante, Machado de Assis
Uma vela para Dario, Dalton Trevisan
Livros:
Primo Basílio, Eça de Queiroz
Madame Bovary, Gustave Flaubert
Trilogia senhor dos anéis, Tolkien
Filme/série:
Laranja mecânica, Stanley Kubrick
Star trek, Gene Roddenberry
Poemas:
Poema tirado de uma notícia de jornal, Manuel Bandeira
Construção, Cesário Verde
Músicas:
Rita, Chico Buarque
Resposta da Rita, Ana Carolina e Chico Buarque
Todo menino é um rei, Roberto Ribeiro
É hoje, Caetano Veloso
Contos:
Noite de almirante, Machado de Assis
Uma vela para Dario, Dalton Trevisan
Livros:
Primo Basílio, Eça de Queiroz
Madame Bovary, Gustave Flaubert
Trilogia senhor dos anéis, Tolkien
Filme/série:
Laranja mecânica, Stanley Kubrick
Star trek, Gene Roddenberry
Poemas:
Poema tirado de uma notícia de jornal, Manuel Bandeira
Construção, Cesário Verde
25 de agosto de 2024
A VELHICE QUE ME HABITA
Minha aversão à velhice é, digamos, bem mais velha do que minha velhice.
Desde antes dos 30 comecei a reparar MESMO na velhice das pessoas e a recordar com "olhos" adultos as visitas que, no tempo do caqui, eu e meus irmãos fazíamos a um asilo que tinha perto de casa. Lá tinha uma árvore de caqui que ficava carregada, a gente visitava as velhinhas e os velhinhos e ganhávamos tantos caquis quanto conseguíamos comer e carregar. Era bom conversar com as pessoas, tanto as idosas quanto as enfermeiras e funcionários, mas criança é bicho interesseiro e nós éramos pobres, caqui para a gente era fruta que nunca tinha em casa.
Enfim, olhar a velhice alheia me fez totalmente imune a qualquer discurso - dos tantos que existem - que tente embelezar ou minimizar tudo o que há de doloroso e de triste nessa condição.
Desde antes dos 30 comecei a reparar MESMO na velhice das pessoas e a recordar com "olhos" adultos as visitas que, no tempo do caqui, eu e meus irmãos fazíamos a um asilo que tinha perto de casa. Lá tinha uma árvore de caqui que ficava carregada, a gente visitava as velhinhas e os velhinhos e ganhávamos tantos caquis quanto conseguíamos comer e carregar. Era bom conversar com as pessoas, tanto as idosas quanto as enfermeiras e funcionários, mas criança é bicho interesseiro e nós éramos pobres, caqui para a gente era fruta que nunca tinha em casa.
Enfim, olhar a velhice alheia me fez totalmente imune a qualquer discurso - dos tantos que existem - que tente embelezar ou minimizar tudo o que há de doloroso e de triste nessa condição.
Em lugar de me apegar aos exemplos de velhices louváveis - e raras - que sempre são pinçadas com frases do tipo “Minha avó viveu até os 99 anos e sempre esteve lúcida e ativa”, desde antes dos 30 eu vejo e me comovo com a velhice mais comum das pessoas que sofrem para abrir uma lata de sardinhas, caminhar cinco metros, descer uma escada, lembrar o nome do neto ou da filha, enxergar uma fotografia à que foi apegada.
Em lugar de ver meu futuro em uma pessoa idosa sorridente, bem vestida, saudável e cheirosa, eu pensava na velhice pobre, perdida e desamparada.
Ao longo dos anos, encontrei muitas velhices que me comoveram, me entristeceram, me revoltaram e me assustaram demais e que, para mim, confirmaram a verdade da frase que digo e escrevo com muita frequência: A velhice é uma merda!
Ao longo dos anos, encontrei muitas velhices que me comoveram, me entristeceram, me revoltaram e me assustaram demais e que, para mim, confirmaram a verdade da frase que digo e escrevo com muita frequência: A velhice é uma merda!
Para não transformar esse texto em uma longuíssima lista de possibilidades não tão boas quanto as pessoas que propagam a velhice como “a melhor idade” (odeio essa expressão!) querem fazer parecer, lembrarei apenas três casos que me abalaram muito.
Uma senhora, proprietária de uma escola onde lecionei quando ainda estava na faculdade, me explicou que gostava muito de ler, mas não estava conseguindo mais porque esquecia o parágrafo anterior antes de terminar o seguinte. Como ler sempre foi o meu “vício bom”, pensei que trocaria todo o dinheiro daquela mulher mil vezes multiplicado para que aquilo nunca acontecesse comigo.
Eu estava em um restaurante e entrou uma família com uma senhora, de frente para a porta e para a mesa onde estavam pude ver a dificuldade da mulher para subir o único degrau que separava o restaurante da calçada, para sentar-se à mesa, para cortar os alimentos, para levar o garfo à boca. E pude ver também a tristeza e a confusão na sua expressão perdida. Saí daquele restaurante com alguma coisa me apertando por dentro.
Uma senhora, proprietária de uma escola onde lecionei quando ainda estava na faculdade, me explicou que gostava muito de ler, mas não estava conseguindo mais porque esquecia o parágrafo anterior antes de terminar o seguinte. Como ler sempre foi o meu “vício bom”, pensei que trocaria todo o dinheiro daquela mulher mil vezes multiplicado para que aquilo nunca acontecesse comigo.
Eu estava em um restaurante e entrou uma família com uma senhora, de frente para a porta e para a mesa onde estavam pude ver a dificuldade da mulher para subir o único degrau que separava o restaurante da calçada, para sentar-se à mesa, para cortar os alimentos, para levar o garfo à boca. E pude ver também a tristeza e a confusão na sua expressão perdida. Saí daquele restaurante com alguma coisa me apertando por dentro.
Fiz um passeio com ônibus de turismo e uma das passageiras era uma idosa do tipo que as pessoas que falam em “a velhice está no espírito” adoram elogiar e usar como exemplo. Ela era uma simpatia mesmo, a “alma da festa”!
Acontece que em um determinado ponto do passeio acabei ficando um tempo sozinha com ela em um banco de jardim e - juro que sem provocação - ela começou a me falar da sua vida, da sua solidão, do seu desencanto, das suas dores.
Me travesti de “não eu” para consolá-la e fazer com que ela não se deixasse entristecer, pelo menos naquele momento, e continuasse aproveitando aquele passeio que estava tão bom.
Aprendi, com um exemplo concreto, que não estava enganada quando pensava que a velhice conformada, a velhice alegre, a velhice orgulhosa, pelo menos em grande parte, é a velhice fingida e não a velhice real.
Quanto à minha velhice, acho que começou aos 40 com a chegada da fibromialgia, logo depois veio a tal síndrome do intestino irritável e meu corpo não parou mais de dar problema. Nem vai parar porque velhice é isso.
Mas sou uma daquelas pessoas - muito raras - que dão sorte. Não estou tão mal, para uma senhora de 65 anos.
Mas sou uma daquelas pessoas - muito raras - que dão sorte. Não estou tão mal, para uma senhora de 65 anos.
Minha fibromialgia nem é muito forte, tenho poucas e até raras crises mais intensas, em geral um analgésico ajuda. Os demais incômodos também são medicáveis e, para minha maior sorte, tenho acesso aos remédios de que precisar.
Além disso não me preocupo com minha aparência, minhas rugas, minhas manchas, minhas pelancas, vão surgindo sorrateiras ou nem tanto sem afetar uma autoestima que não me lembro de ter tido alguma vez, que não valorizo e não me faz falta.
Por enquanto, o que mais me faz falta e aborrece na minha velhice é não poder fazer as longas caminhadas que sempre adorei fazer.
Ainda caminho, algumas pessoas até acham que caminho bastante, mas só eu sei o quanto é pouco em comparação com o que era; e com o quanto vai ser cada vez menos. Meus pés doem, minhas pernas doem, cada dia que passa a dor vem depois de um espaço percorrido menor.
E isso me deixa P da vida!
O que me incomoda mais agora é o medo de chegar a um ponto em que não consiga mais ler; é o pavor de me tornar dependente e um peso para as pessoas e, principalmente, para meu filho; é o pavor de não conseguir controlar minhas necessidades fisiológicas.
Sim! Eu morro de medo de ter que usar fraldas e de precisar que alguém limpe a minha bunda!
19 de agosto de 2024
CONDIÇÃO ANÁLOGA?
Ouvindo a chamada para MAIS UMA notícia dessas, venho reforçar o que já disse antes:
Essa expressão "condições análogas à escravidão", eu apostaria que foi criada por uma pessoa MUITO fdp que não acha que a escravidão foi "tão ruim" quanto pessoas como eu pensam que foi.
E olha que eu penso que, por mais horrível que minha mente imagina que tenha sido, com certeza foi MUITO pior.
Não tem essa de "condições análogas à escravidão", é escravidão mesmo.
Sem eufemismo, por favor!
DESIGNER INTELIGENTE
O texto foi provocado pela imagem acima seguido da pergunta sobre o que você pensaria se entrasse em uma caverna onde ninguém esteve há séculos e encontrasse imagens como essa.
O objetivo, claro, era a defesa do argumento RELIGIOSO que se quer científico chamado designer inteligente. Minha resposta gerou uma longa conversa. Publico aqui, em essência, as minhas falas:
Obviamente eu (e qualquer pessoa) concluiria que foram seres humanos que fizeram aqueles desenhos. Isso absolutamente não prova que tais seres humanos foram criados propositalmente por um ser consciente. Concluir isso seria extrapolar MUITO a primeira conclusão. Essa é uma versão do argumento do relojoeiro de Paley, um argumento bem velho, manjado e já refutado de várias maneiras por várias pessoas.
Meu ateísmo não é puramente emocional, tanto assim que não digo que é possível provar a inexistência de deus de forma genérica e independente da definição dada a essa palavra. O fato de ter colocado o argumento do relojoeiro de Paley no seu post me diz que provavelmente você vai seguir o padrão de usar argumentos filosóficos já refutados por pessoas conhecidas, como Feuerbach, Hume, Voltaire, Ingersoll e até mesmo Kant. Li sobre esses argumentos, embora não seja filósofa ou especialista, e as refutações são mais convincentes, ou no mínimo tão válidas quanto os argumentos teístas. Daí que, se especificar de qual deus estou falando e levantar as características desse deus, posso provar que ele não existe mostrando contradições. Da mesma forma que a descrição do triângulo pode provar que não existe triângulo de quatro lados, a descrição de um ser paradoxal pode provar que esse ser não existe. Claro que dentro das limitações que nós, animais humanos, temos. Afinal, provar mesmo, não podemos provar sequer nossa própria existência.
Claro que a o desenho na caverna poderia ser aleatório, as probabilidades matemáticas comprovam isso. Porém, tal possibilidade é muito pequena. E eu reconheço como trabalho humano porque já vi trabalhos humanos desse tipo diversas vezes. Mas quem viu universos criados propositalmente por seres superpoderosos para poder comparar e concluir que esse em que estamos é um deles?
Li versões do argumento da “criação perfeita” várias vezes, e já li vários textos muito bem embasados que o refutam de forma bastante sensata e lógica. O argumento vem cheio de "furos" e falhas, estudando um pouco de biologia já dá para perceber que essa "máquina perfeita" nem é tão perfeita assim. E esse é só um ponto do argumento do relojoeiro. Uma piada muito boa sobre ele é dizer que o tal "arquiteto" é tão bom que já projetou nossas orelhas uma de cada lado porque sabia que a gente ia precisar de óculos.
Acho estranho que os defensores do designer inteligente louvam a "perfeição" que provaria uma criação consciente de um ser poderoso e extremamente sábio e, quando as falhas óbvias são apontadas, falam dos engenheiros que constroem carros e prédios que têm problemas de projeto. Se seu designer inteligente é comparável a um ser humano comum e falho, que raio de perfeição você está reivindicando para dizer que ele existe? Seres humanos são imperfeitos, animais são imperfeitos, o universo é imperfeito. E vocês insistem em falar de perfeição só porque nós, os animais imperfeitos, gostamos de como somos, o que nem sequer é verdade porque não vale para todas as pessoas. Não faz o menor sentido!
E se você quiser associar esse tal "designer inteligente" ao deus "de bondade" do cristianismo, a coisa toda fica ainda pior. Os sofrimentos que as falhas de projeto causam nos seres são imensos, o que não combinaria em nada com um ser que reivindica para si o onipoder, a onisciência e a bondade. Basta pensar nos defeitos de formação e, para ficar no comum, a existência de uma membrana chamada clitóris. Quantas mulheres chegaram a ser assassinadas por causa dessa membraninha? Que raio de "designer inteligente" cheio de bondade criaria algo tão terrível?
Orgulho mesmo, a meu ver, é o animal humano se achar tão especial a ponto de ser criação perfeita de um ser perfeito hiperpoderoso que o elegeu como ápice de toda a sua criação. Como digo sempre: "Deus é onipotente, o animal humano é oniprepotente".
Não concordo com seus argumentos de jeito nenhum! Você enche seu texto de "indica", "parece" e outras palavras que não fazem mais do que demonstrar sua fé e sua insistência em ignorar séculos de estudos, explicações e comprovações muito melhores do que as do tipo "parece ser", que na verdade não "parece" tanto assim.
A comparação que você faz desse "criador" com um pai amoroso é um dos argumentos mais absurdos que já vi (e vi muitas vezes!) partir de pessoas que desprezam a lógica e se agarram às crenças sem evidência. Não é necessário estudar muito de ciência, até um conhecimento básico e nada especializado feito o meu consegue fazer com que uma pessoa disposta a pensar sem viés de confirmação e teimoso apego à fé sem base na realidade entenda que muitas das "perguntas inteligentes" a que vinha se agarrando já foram respondidas há muito tempo, e muito melhor do que sua crença diz responder.
Não, eu não estou "chateada" com o sofrimento humano! Estou ciente do fato de que o sofrimento existe (não apenas o humano) e que essa existência é um argumento lógico para refutar a tese de um criador bonzinho. Como digo sempre, não foi mágoa, raiva ou qualquer sentimento pessoal e egoísta que me tornou ateia, eu me tornei ateia justamente quando tirei os olhos do meu próprio umbigo. Eu me tornei ateia quando olhei para o todo e não apenas para mim mesma ou para a raça a que pertenço. Daí que pensar que meu ateísmo é emocional, por mais que seja um direito seu, é um grande engano.
Vamos supor por um momento que haja realmente um criador (indiferente, hipócrita, não muito inteligente e mau). Nesse caso, não fica bem mais fácil explicar porque ele projetou o corpo humano e a natureza cheios de defeitos e falhas de modo a você ter a capacidade de sofrer milhares de malefícios, dores e senso de frustração e insatisfação? Sentindo desespero na companhia desagradável de inimigos e familiares tóxicos, na incapacidade de ter senso de humor e dar boas risadas quando tudo fica tenebroso com catástrofes pessoais e coletivas, de não conseguir se comunicar com palavras e voz por doenças ou abusos sofridos, de ser ouvido e ouvir belas músicas por ser impedido por alguém que te subjugou, de ter o orgasmo porque perdeu a potência e a libido diante de traumas, doenças ou rejeições, a insatisfação de não poder realizar seus sonhos e desenvolver seu potencial, de não poder saborear centenas de alimentos de que gosta e as milhares de paisagens incríveis que não pode visitar? Eu poderia fazer aqui uma lista infinita de coisas horríveis que seu corpo (o corpo humano) mal projetado pode não te dar condições de realizar.
Supondo agora que NÃO existe um ser inteligente como nós responsável por essas criações, não ficaria mais fácil perceber que as coisas boas existem porque se não fosse assim a vida simplesmente não existiria? Que não é necessário que haja nenhum sentimento ou motivação (para o bem ou para o mal) por trás disso? Que o fato de a vida existir da forma como é comprova apenas que claramente é necessário que seja assim para que a vida exista e que, nesse aspecto, a evolução, explica MUITO melhor do que qualquer argumento que se limite a fazer uma lista contendo apenas as "coisas boas" como se isso fosse suficiente para provar o que é apenas fé?
Eu não me nego a admitir que tem coisas que eu gosto na vida. Se não tivesse, tanto eu como todos os animais do planeta, simplesmente desistiríamos de viver e a vida acabaria. Esse é o ponto! E não! Não é verdade que as coisas boas "foram obviamente elaboradas para o usufruto do ser humano", dizer isso é expressar uma fé que, como toda fé, não está embasada em evidências confiáveis e, menos ainda, inquestionáveis. Para "colocar o criador em um tribunal", é preciso primeiro provar que esse criador existe, e não há argumento de designer inteligente que dê conta disso, porque os argumentos dessa vertente do criacionismo são baseados na fé, embora procurem usar a ciência para sustentá-los, em alguns casos com muito sucesso, principalmente quando quem o faz é um cientista falando com leigos.
Vi um vídeo em que um defensor do designer inteligente que é químico, usa a química para "provar" a complexidade irredutível, um dos pilares da "teoria". Eu, por não ser química, sou totalmente incapaz de refutar os argumentos dele; por isso, fui procurar algum texto que tivesse refutação de quem entende mais do que eu. E encontrei!
Porque li o livro O relojoeiro cego, do biólogo Richard Dawkins e ele explica bastante coisas sobre a evolução, sei que, mesmo para pessoas leigas como eu, ler cientistas sérios deixa bastante claro que quem diz frases batidas como: "A evolução não explica nada", tem grandes chances de estar mentindo, ou exagerando muito.
Sua chance de me convencer da existência de um designer inteligente é zero. Do ponto em que estou, não há nenhuma possibilidade de retorno, exceto uma prova empírica que seja óbvia e inquestionável não apenas para mim como também para todas as pessoas. Ou seja, eu só deixo de ser ateia quando e se acontecer alguma coisa que faça com que o ateísmo deixe de existir porque ninguém poderá mais duvidar da existência do "criador" e ninguém poderá mais negar que ele é um deus. Antes disso (não por teimosia mas porque sem provas não tem como eu acreditar em ninguém), não há nenhuma chance.
Quanto à sua pergunta: Os órgãos genitais existem (e têm muitas falhas) para que os animais sexuados se reproduzam. É apenas uma das formas de reprodução do mundo animal, e a cópula dá prazer porque sem esse adicional os animais não desprenderiam energia para fazer sexo em lugar de procurar alimento ou abrigo. A evolução explica bem isso.
Além do instinto reprodutivo de que todos os seres vivos são dotados (que eu saiba), o prazer no sexo, seguramente não foi "criado" por um designer inteligente apenas para a felicidade do animal humano. Chimpanzés e outros primatas adoram fazer sexo. Muitos animais, quase certamente, sentem tanto prazer que arriscam, e até perdem, a vida para procriar. Essa parece ser uma das características evolutivas da vida e da diversidade que a evolução proporcionou.
Pode não ser evolução e sim criação? Pode sim, como eu disse antes, certeza total e completa não podemos ter nem mesmo da nossa própria existência, mas pode ser outras coisas também, como a criação acidental de um ET evoluído que já morreu há milênios, ou uma "semente" com defeito que "pulou" de um outro universo para esse no multiverso infinito e não criado do qual não temos nenhum conhecimento. Dá pra pensar tantas coisas que não podemos provar, mas que são tão válidas como possibilidade quanto o seu "designer inteligente" ou o deus bíblico!
Ah, sim. Reforçando, o livro do Dawkins de que estou falando não é sobre ateísmo, tá? É sobre biologia e ele é um biólogo, portanto, sabe do que está falando.
Não é verdade que é "sem dúvida" um projeto de engenharia incrível! Tanto não é que eu duvido e muitas pessoas, incluindo cientistas, têm dúvidas bastante bem embasadas. Como eu já disse, o corpo humano está cheio de "falhas de projeto" tão sérias que causam mortes. A gravidez tem vários exemplos delas.
Eu não disse que o corpo humano "apareceu do nada", disse que a evolução explica, e muito bem. Se você não aceita a explicação por causa da sua fé, eu posso aceitar porque não tenho nenhuma fé impedindo meu raciocínio.
Eu não disse que o desenho na caverna "só pode ter sido feito por uma pessoa inteligente", eu disse que pensaria que as chances são muito grandes porque já vi desenhos assim antes e eles eram feitos por pessoas, não é a mesma coisa. Eu não disse que o corpo humano "não precisou de ninguém para construir", eu disse que existem outras possibilidades de explicação, além da própria evolução, que é a mais válida e mais corroborada, que valem tanto quanto a sua explicação baseada na fé.
Eu credito na existência de várias coisas e pessoas sem nunca ter visto, não é possível viver sem acreditar em coisas que a gente não viu, por exemplo: eu acredito que tive uma bisavó que veio de Portugal mas nunca a vi, acredito porque minha mãe me contou e eu não tenho nenhuma razão para duvidar. Mas "acreditar" é diferente de ter fé, e eu não tenho fé. Só acredito porque e quando evidências me foram apresentadas de maneira confiável, e deixo de acreditar assim que alguma evidência em contrário apareça.
Não sei se não tem absolutamente nenhum modo de provar a existência do designer inteligente, sei que até agora não vi nenhum que fosse mais convincente do que a evolução; ou do que a semente vinda de outro universo de que falei acima, e essa última é BEM menos convincente do que a evolução porque eu inventei e, por isso, ao contrário da evolução, não tem nenhuma evidência científica que corrobore qualquer parte dela.
Se você demonstrasse um litro de água se transformar em sangue, não importa quando, na frente de um grupo de pesquisa sério em teste controlado, eu certamente consideraria isso um milagre, mas se fizer isso só para mim, eu acharia que é um truque de mágica muito bem feito. Você já leu sobre o James Randi? Ele ofereceu um milhão de dólares para quem fizesse alguma mágica desse tipo, em teste controlado acompanhado por especialistas, a oferta esteve válida durante anos, e o Randi morreu sem ter que pagar o prêmio.
O problema do seu argumento não é defender a possibilidade de existência de algum tipo de criador da vida, o problema é você usar expressões "sem dúvida" ou "com certeza". Como eu disse, não há como negar totalmente essa possibilidade uma vez que não sabemos exatamente como aconteceu, mas essa hipótese está longe de ser a única, ou mesmo a melhor das possibilidades. Repetindo, existem outras possibilidades com tantas evidências e tantos pontos obscuros quanto a do designer inteligente que você está tentando apresentar como única explicação. A gente facilmente pode pensar em uma, ou até mais de uma, como já demonstrei inventando a "semente" vinda de outro universo.
Sei que existem muitas pessoas não religiosas que afirmam que o corpo humano é uma bela obra de engenharia, eu afirmaria isso se estivesse falando com uma pessoa que não usasse o argumento de que "Só pode ser a criação proposital e intencional de um ser inteligente e superior". Pensada como resultado da evolução, sim, a vida (e não apenas o corpo humano) é um evento fantástico, mas devido às muitas imperfeições e às evidências de que muitas delas são resultado da evolução, não fica nem um pouco óbvio que precise existir um criador, por mais que eu saiba que muitas pessoas religiosas não negam a evolução com o argumento do "pontapé inicial", a igreja católica já fez isso oficialmente há um tempo.
Eu não disse apenas que "se água se transformar em sangue... eu certamente consideraria um milagre", eu disse que o faria NA CONDIÇÃO de que isso acontecesse em um experimento controlado. Pensei que essa ressalva tivesse deixado muito claro que eu não acredito, nem por um momento, que bastaria isso ser realizado por uma pessoa em uma espécie de show de mágica. Ou seja, eu simplesmente não acredito em milagres, e até prova em contrário, não acredito em designer inteligente, seja ele chamado de deus bíblico ou não.
Não acredito na existência de um ser criador com muito mais poder e inteligência. Menos ainda que tal ser, se existisse, se rebaixaria a fazer truques de mágica. Além da hipótese que inventei, como eu já disse antes, tem muitas outras que são tão válidas e que têm tantas "evidências" e possibilidades de serem verdadeiras quanto a sua. Uma delas, que inclusive é ou foi defendida de uma forma ou de outra por vários povos e culturas ao longo da história, é o politeísmo. Em observando muitos aspectos da realidade, entre a hipótese de um único criador e a de vários, que inclusive brigam e disputam entre si, o politeísmo faz mais sentido. Mas, no meu caso, não adoto nenhuma sem evidências e provas válidas, e teriam que ser válidas não apenas para mim, mas para todo mundo. Como disse o Carl Sagan "Afirmações extraordinárias exigem provas extraordinárias".
Todas as versões, exceto as científicas como a evolução e os estudos de cientistas como Hawking, têm "bem cara de lenda", e isso inclui toda a mitologia bíblica.
Você lembra que a tal "demonstração autêntica de seu poder" incluiu assassinato de crianças inocentes, né? Isso tem MUITO a cara de mitologia criada por um povo antigo para propagar sua própria religião e seu deus recém criado. Acho muito engraçado quando as pessoas dizem esse tipo de coisa que você acabou de dizer "como criador ele teria o direito de interferir em sua própria criação". Se existisse, teria sim, mas sempre me soa muita pretensão das pessoas religiosas acreditar que um ser capaz de criar o universo está preocupado com um "povo escolhido" e a forma com que esse povo vai puxar o saco dele.
Sim! essa afirmação é extraordinária, e exige provas extraordinárias. Sim, é algo que deveria nos surpreender, e muito, se de repente um ser inteligente desse tipo se provasse existente quando tudo indica que ele não existe, e mais, que se existisse não teria porque se dar o trabalho de interferir na vida de uma espécie insignificante habitando uma rocha insignificante na imensidade do universo. Vai ser muito difícil, impossível eu diria, você conseguir me "ajudar a enxergar" que existe um criador que está preocupado com a maneira como, por exemplo, as mulheres se comportam dentro da "família tradicional cristã", ou que mesmo sendo tão inteligente, cometeu tantos erros com a sua "máxima criação". A meu ver não há nenhum quebra cabeça a ser montado ou desvendado.
Acho difícil que o problema seja minha falta de humildade, penso que é justamente o fato de ter me desapegado da prepotência natural do animal humano que me tornei ateia. Como digo sempre, eu me tornei ateia quando tirei os olhos do meu próprio umbigo. Daí que, para mim, é você que deveria pensar se não seria interessante ajustar o seu ponto de vista com relação às pesquisas e estudos científicos que existem, são acessíveis e, embora não tenham respostas para todas as perguntas, são muito úteis para tirar vendas de fé sem comprovação e de prepotência especista que leva as pessoas a aceitarem as explicações mais fáceis e vantajosas para seus egos inflados.
Eu me sinto muito tranquila se não souber de onde viemos, aceito de forma muito natural que posso nunca saber. O que não quero, de jeito nenhum, é me agarrar a "respostas" que não me servem por falta de provas, de evidências e, em última análise, por mostrar um ser criado na idade do bronze por homens primitivos, preconceituosos e misóginos.
Respondendo à sua pergunta do laboratório se uma porção de água fosse transformada em sangue, sim. Eu passaria a considerar a possibilidade de haver uma fonte de poder maior do que nós humanos possuímos ou, no mínimo, maior do que eu possuo, uma vez que não saberia nem mesmo imaginar uma explicação lógica. E, por não saber, em nenhum momento eu afirmaria que "foi deus" ou que "com certeza foi o designer inteligente que agiu", muito menos me ajoelharia e pediria perdão pelo meu ateísmo. Eu esperaria que os cientistas estudassem o fenômeno e, enquanto não obtivesse nenhuma resposta, continuaria a pensar que algo estranho aconteceu e eu não sei o que foi. Enquanto não obtivesse resposta, acharia legal imaginar possibilidades, e provavelmente escreveria alguns contos de ficção científica.
Não há claros. Há o desespero, o medo e a prepotência das pessoas que as leva a se agarrar às suas fantasias e fazer qualquer coisa para "confirmá-las", incluindo os malabarismos mentais mais confiantes. Essa do ser hiper poderoso que propositalmente permite que imperfeições óbvias aconteçam e permaneçam é um bom exemplo do que acabei de dizer.
Estou velha, faz muito tempo que não estou preocupada com essas coisas que você listou para tentar explicar minha "resistência" em aceitar suas "provas". Para falar em "progresso espiritual" você precisaria primeiro provar que existe essa coisa que você chama de espírito e, depois, provar que se submeter a algo sobre cuja existência não há provas suficientes seria um progresso.
Seu argumento da água que bebemos ser transformada em sangue no nosso corpo é tosco demais, desculpe mas cheguei a dar risada aqui, e olha que nem sou bióloga! Para começar NÃO é isso que acontece no corpo. E não vou dizer mais nada sobre outros furos desse seu argumento porque não sou bióloga, mas bastaria procurar no Google que você certamente encontraria. Esse que você usou é uma versão do argumento do bolso vazio, que usa coisas que a ciência não faz para dizer que só deus pode realizar tal façanha impossível. Já disseram isso sobre, por exemplo, a amônia, antes que a ciência fizesse e essa substância se tornasse comum a ponto de ninguém mais pensar que "só o corpo humano perfeito é capaz de criar".
Por mais complicado que seja, o que acontece no corpo é explicável pelas leis da física, da natureza, da biologia, pela evolução. Não tem nada a ver com uma mágica de transformar um copo de água em um copo de sangue. Todas as perguntas que você faz não são suficientes para tornar a biologia um milagre de um ser transcendente, e seriam muito bem respondidas por mim se eu fosse uma bióloga competente, mas não sou.
As pessoas criaram mitos para explicar o que não entendem desde os primórdios da humanidade, e até hoje fazem o possível para continuar acreditando neles, com algumas modificações, como inserir a ciência; mas, na base, a raça humana se compõe do mesmo animal assustado que sacrificava ao trovão por medo dos raios que não sabia o que era. Tudo que não sabe explicar, o ser humano tem a tendência de "explicar" afirmando a existência de algum ser mitológico.
Há décadas que eu não preciso nem desejo solução para os problemas que ameaçam a humanidade, que convivo muito bem com a resposta "Eu não sei". Claro que gostaria de saber mais, sempre leio livros e vejo vídeos sobre ciência para aprender mais, mas minha vontade de saber nunca vai ser tão urgente a ponto de eu aceitar uma resposta que tenha como base apenas a fé. Para mim é fantasia demais esperar que a solução venha de um ser poderoso tal como um Criador. Sem provas não faz o menor sentido se apegar em mitos.
Não acho que "temos chances reais de algum amparo" com ou sem esse tal ser, não temos amparo nenhum fora do que podemos encontrar em nós, nas pessoas que amamos, em nossas ações e nossas melhores qualidades, se pudermos usar isso em lugar de nos odiar e nos destruir. Fora isso, nós, os animais humanos e todos os demais que dividem esse torrão azul conosco, estamos sozinhos, independente de existir ou não um "designer".
Seu argumento não é válido porque faz analogias impróprias como se provasse algo que não se provaria dessa forma porque não seria similar. Células são comparáveis a máquinas? Sim. Mas um criador do universo não precisaria obrigatoriamente existir, e caso existisse, não seria obrigatoriamente comparável a um engenheiro.
Povos antigos terem atribuído identidade "errada" ao Criador não anula sua existência. Mas também não a confirma. Dizer que eles estão errados não prova que você tem razão. Você está usando a mesma descrença que eu. Do meu ponto de vista, você está tão errado quanto eles. Tem uma frase que diz algo assim: "Se você rejeita todos os deuses menos o seu, então você pode entender porque eu rejeito o seu".
Acho que muitas pessoas encontraram na complexidade das descobertas científicas, maneiras de usá-las para tentar se agarrar mais ainda a suas crenças e mitos. O Antony Flew se declarou deísta, mas estava bastante velho e parece que apresentava sinais de problemas mentais. É compreensível que, ao final da vida, uma pessoa passe a ter ainda mais medo da morte e ainda mais razões para se agarrar às crenças religiosas, mesmo sendo um intelectual, cientista ou filósofo, afinal, são seres humanos.
Como eu disse antes, a complexidade não prova a existência de um deus, por mais que sua crença veja dessa forma. O fato de células serem comparáveis a máquina também não prova a existência de deus, principalmente porque a analogia não é perfeita e a forma como isso acontece é conhecida e não implica obrigatoriamente a interferência de uma "mente inteligente", se fosse assim não existiriam biólogos ateus.
Não existe prova da existência de nenhuma "Mente Inteligente", muito menos de que ela esteja supervisionando cada mitose e meiose celular, e a comparação entre seres humanos e uma "mente superpoderosa" é muito forçada. Se existisse essa tal "mente", ela seria tão comparável ao ser humano quanto somos comparáveis a um floco de neve. Talvez menos ainda.
Acho que chegamos a um ponto em que ficaremos "andando em círculos", você diz que tem evidências, provas e indicações, eu digo que suas evidências parecem mais com fé do que com razão e nem eu vou aceitar seus argumentos nem você vai aceitar os meus. Não tem como você me convencer porque li livros e vi argumentos muito mais convincentes e lógicos de pessoas que têm muito mais conhecimento do que nós dois sobre física, biologia, astronomia, neurociência, paleontologia, história. Até prova em contrário, eu fico com o que aprendi com essas pessoas.
Livros que li e recomendo muito: "Cérebro e crença", de Michael Shermer, que mostra como nosso cérebro é bom em nos enganar; "O relojoeiro cego", do Richard Dawkins, que mostra que a evolução explica mais do que o senso comum pensa; "Um universo que veio do nada", de Lawrence Krauss, que mostra o quanto nós somos insignificantes para sermos tão especiais como a crença religiosa quer acreditar, e "Breves respostas para grandes questões", de Stephen Hawking, que responde muitas perguntas de forma científica. Esses são alguns livros que li e ampliaram meu ateísmo, que até então quase se limitava ao deus bíblico e seus derivados.
Sobre “crenças limitantes” acho que o animal humano tem mais mesmo é o contrário: A crença prepotente de achar que sabe o que não sabe e de se achar a perfeição em forma de “máquina”. Muitas pessoas já disseram que a ciência nunca afirma saber tudo, quem faz isso é a religião. E eu acrescentaria que a ciência não afirmar saber tudo, não é por ter algo do tipo “crença limitante”, é o contrário disso. A ciência está sempre buscando o conhecimento e sabe que quanto mais respostas encontra mais perguntas surgem. É como disse o Sagan: Eu não quero acreditar, eu quero saber. E se tem uma coisa que a ciência sabe é que tem coisas que ela muito provavelmente nunca vai saber.
A palavra “crença” não faz muito sentido quando estamos falando em ciência e em busca de conhecimento. Não porque as pessoas, mesmo as pessoas cientistas e ateias, não têm nenhuma crença, mas porque para elas a palavra “crença” é MUITO diferente da palavra fé, ou seja, suas crenças são provisórias e estão prontas a serem abandonadas diante de uma resposta melhor que venha a ser descoberta. As pessoas que têm crenças, no sentido mais próximo da palavra fé, costumam preferir ignorar ou “ressignificar” respostas que contradigam aquilo que elas acreditam. Até cientistas religiosos (que existem, eu sei) fazem isso. Mas não enquanto fazem ciência! E designer inteligente, por mais que as pessoas que defendem isso digam o contrário, é crença no sentido de fé.
Quanto a “busca”, as respostas que porventura busque, não serão encontradas nesse campo pseudocientífico do designer inteligente. Esse eu já tenho informações suficientes para descartar sem remorso ou curiosidade. Podemos comparar com qualquer panaceia: Sei o suficiente de medicina, por menos que seja e por mais ignorante que seja nessa área, para saber que não preciso me dar ao trabalho de aprender uma oração e uma dança quando tenho alguma doença cujo tratamento adequado é um analgésico ou um antibiótico, por isso procuro a medicina e não uma benzedeira... ou a homeopatia.
Você pergunta “Por que os maquinários de uma empresa sem alguma intervenção inteligente constantemente param, mas a máquina do corpo humano sem intervenção de alguém inteligente, continua funcionando? Como assim a analogia não é perfeita?”
Mas não são vocês que dizem que o tal Designer Inteligente é um ser absolutamente superior? Como querem que seja normal comparar suas “criações” com as criações de seres imperfeitos como o animal humano? Brincadeiras à parte, o que falta à sua pergunta é a compreensão da evolução tendo o cuidado de “desvesti-la” da crença no designer inteligente. É ver a evolução como a ciência a vê; a ciência séria, não a pseudociência.
Outra coisa que certamente ajudaria, é ver que não é verdade que “a máquina do corpo humano sem intervenção de alguém inteligente, continua funcionando”, pelo menos não do mesmo jeito. Afinal, a evolução está em ação, está acontecendo e não só o animal humano como todos os outros animais, estão sofrendo mutações (que são basicamente “falhas” na replicação das e no interior das células) o tempo todo, e essas mutações continuam deformando, matando ou impedindo o nascimento de indivíduos e, vez ou outra permitindo e até facilitando o desenvolvimento de indivíduos que a passam adiante em sua descendência, quando essa mutação o torna mais apto a sobreviver em seu habitat.
Embora as pessoas tenham o direito de acreditarem no que quiserem e em questão de fé tudo que se pode dizer é que esse é um direito individual e coletivo, o fato é que a evolução NÃO PRECISA de um designer inteligente! Simples assim.
Portanto, eu também não preciso acreditar nisso quando a ciência me dá todas as respostas que me satisfazem, incluindo a resposta: Não sabemos.
Obviamente eu (e qualquer pessoa) concluiria que foram seres humanos que fizeram aqueles desenhos. Isso absolutamente não prova que tais seres humanos foram criados propositalmente por um ser consciente. Concluir isso seria extrapolar MUITO a primeira conclusão. Essa é uma versão do argumento do relojoeiro de Paley, um argumento bem velho, manjado e já refutado de várias maneiras por várias pessoas.
Meu ateísmo não é puramente emocional, tanto assim que não digo que é possível provar a inexistência de deus de forma genérica e independente da definição dada a essa palavra. O fato de ter colocado o argumento do relojoeiro de Paley no seu post me diz que provavelmente você vai seguir o padrão de usar argumentos filosóficos já refutados por pessoas conhecidas, como Feuerbach, Hume, Voltaire, Ingersoll e até mesmo Kant. Li sobre esses argumentos, embora não seja filósofa ou especialista, e as refutações são mais convincentes, ou no mínimo tão válidas quanto os argumentos teístas. Daí que, se especificar de qual deus estou falando e levantar as características desse deus, posso provar que ele não existe mostrando contradições. Da mesma forma que a descrição do triângulo pode provar que não existe triângulo de quatro lados, a descrição de um ser paradoxal pode provar que esse ser não existe. Claro que dentro das limitações que nós, animais humanos, temos. Afinal, provar mesmo, não podemos provar sequer nossa própria existência.
Claro que a o desenho na caverna poderia ser aleatório, as probabilidades matemáticas comprovam isso. Porém, tal possibilidade é muito pequena. E eu reconheço como trabalho humano porque já vi trabalhos humanos desse tipo diversas vezes. Mas quem viu universos criados propositalmente por seres superpoderosos para poder comparar e concluir que esse em que estamos é um deles?
Li versões do argumento da “criação perfeita” várias vezes, e já li vários textos muito bem embasados que o refutam de forma bastante sensata e lógica. O argumento vem cheio de "furos" e falhas, estudando um pouco de biologia já dá para perceber que essa "máquina perfeita" nem é tão perfeita assim. E esse é só um ponto do argumento do relojoeiro. Uma piada muito boa sobre ele é dizer que o tal "arquiteto" é tão bom que já projetou nossas orelhas uma de cada lado porque sabia que a gente ia precisar de óculos.
Acho estranho que os defensores do designer inteligente louvam a "perfeição" que provaria uma criação consciente de um ser poderoso e extremamente sábio e, quando as falhas óbvias são apontadas, falam dos engenheiros que constroem carros e prédios que têm problemas de projeto. Se seu designer inteligente é comparável a um ser humano comum e falho, que raio de perfeição você está reivindicando para dizer que ele existe? Seres humanos são imperfeitos, animais são imperfeitos, o universo é imperfeito. E vocês insistem em falar de perfeição só porque nós, os animais imperfeitos, gostamos de como somos, o que nem sequer é verdade porque não vale para todas as pessoas. Não faz o menor sentido!
E se você quiser associar esse tal "designer inteligente" ao deus "de bondade" do cristianismo, a coisa toda fica ainda pior. Os sofrimentos que as falhas de projeto causam nos seres são imensos, o que não combinaria em nada com um ser que reivindica para si o onipoder, a onisciência e a bondade. Basta pensar nos defeitos de formação e, para ficar no comum, a existência de uma membrana chamada clitóris. Quantas mulheres chegaram a ser assassinadas por causa dessa membraninha? Que raio de "designer inteligente" cheio de bondade criaria algo tão terrível?
Orgulho mesmo, a meu ver, é o animal humano se achar tão especial a ponto de ser criação perfeita de um ser perfeito hiperpoderoso que o elegeu como ápice de toda a sua criação. Como digo sempre: "Deus é onipotente, o animal humano é oniprepotente".
Não concordo com seus argumentos de jeito nenhum! Você enche seu texto de "indica", "parece" e outras palavras que não fazem mais do que demonstrar sua fé e sua insistência em ignorar séculos de estudos, explicações e comprovações muito melhores do que as do tipo "parece ser", que na verdade não "parece" tanto assim.
A comparação que você faz desse "criador" com um pai amoroso é um dos argumentos mais absurdos que já vi (e vi muitas vezes!) partir de pessoas que desprezam a lógica e se agarram às crenças sem evidência. Não é necessário estudar muito de ciência, até um conhecimento básico e nada especializado feito o meu consegue fazer com que uma pessoa disposta a pensar sem viés de confirmação e teimoso apego à fé sem base na realidade entenda que muitas das "perguntas inteligentes" a que vinha se agarrando já foram respondidas há muito tempo, e muito melhor do que sua crença diz responder.
Não, eu não estou "chateada" com o sofrimento humano! Estou ciente do fato de que o sofrimento existe (não apenas o humano) e que essa existência é um argumento lógico para refutar a tese de um criador bonzinho. Como digo sempre, não foi mágoa, raiva ou qualquer sentimento pessoal e egoísta que me tornou ateia, eu me tornei ateia justamente quando tirei os olhos do meu próprio umbigo. Eu me tornei ateia quando olhei para o todo e não apenas para mim mesma ou para a raça a que pertenço. Daí que pensar que meu ateísmo é emocional, por mais que seja um direito seu, é um grande engano.
Vamos supor por um momento que haja realmente um criador (indiferente, hipócrita, não muito inteligente e mau). Nesse caso, não fica bem mais fácil explicar porque ele projetou o corpo humano e a natureza cheios de defeitos e falhas de modo a você ter a capacidade de sofrer milhares de malefícios, dores e senso de frustração e insatisfação? Sentindo desespero na companhia desagradável de inimigos e familiares tóxicos, na incapacidade de ter senso de humor e dar boas risadas quando tudo fica tenebroso com catástrofes pessoais e coletivas, de não conseguir se comunicar com palavras e voz por doenças ou abusos sofridos, de ser ouvido e ouvir belas músicas por ser impedido por alguém que te subjugou, de ter o orgasmo porque perdeu a potência e a libido diante de traumas, doenças ou rejeições, a insatisfação de não poder realizar seus sonhos e desenvolver seu potencial, de não poder saborear centenas de alimentos de que gosta e as milhares de paisagens incríveis que não pode visitar? Eu poderia fazer aqui uma lista infinita de coisas horríveis que seu corpo (o corpo humano) mal projetado pode não te dar condições de realizar.
Supondo agora que NÃO existe um ser inteligente como nós responsável por essas criações, não ficaria mais fácil perceber que as coisas boas existem porque se não fosse assim a vida simplesmente não existiria? Que não é necessário que haja nenhum sentimento ou motivação (para o bem ou para o mal) por trás disso? Que o fato de a vida existir da forma como é comprova apenas que claramente é necessário que seja assim para que a vida exista e que, nesse aspecto, a evolução, explica MUITO melhor do que qualquer argumento que se limite a fazer uma lista contendo apenas as "coisas boas" como se isso fosse suficiente para provar o que é apenas fé?
Eu não me nego a admitir que tem coisas que eu gosto na vida. Se não tivesse, tanto eu como todos os animais do planeta, simplesmente desistiríamos de viver e a vida acabaria. Esse é o ponto! E não! Não é verdade que as coisas boas "foram obviamente elaboradas para o usufruto do ser humano", dizer isso é expressar uma fé que, como toda fé, não está embasada em evidências confiáveis e, menos ainda, inquestionáveis. Para "colocar o criador em um tribunal", é preciso primeiro provar que esse criador existe, e não há argumento de designer inteligente que dê conta disso, porque os argumentos dessa vertente do criacionismo são baseados na fé, embora procurem usar a ciência para sustentá-los, em alguns casos com muito sucesso, principalmente quando quem o faz é um cientista falando com leigos.
Vi um vídeo em que um defensor do designer inteligente que é químico, usa a química para "provar" a complexidade irredutível, um dos pilares da "teoria". Eu, por não ser química, sou totalmente incapaz de refutar os argumentos dele; por isso, fui procurar algum texto que tivesse refutação de quem entende mais do que eu. E encontrei!
Porque li o livro O relojoeiro cego, do biólogo Richard Dawkins e ele explica bastante coisas sobre a evolução, sei que, mesmo para pessoas leigas como eu, ler cientistas sérios deixa bastante claro que quem diz frases batidas como: "A evolução não explica nada", tem grandes chances de estar mentindo, ou exagerando muito.
Sua chance de me convencer da existência de um designer inteligente é zero. Do ponto em que estou, não há nenhuma possibilidade de retorno, exceto uma prova empírica que seja óbvia e inquestionável não apenas para mim como também para todas as pessoas. Ou seja, eu só deixo de ser ateia quando e se acontecer alguma coisa que faça com que o ateísmo deixe de existir porque ninguém poderá mais duvidar da existência do "criador" e ninguém poderá mais negar que ele é um deus. Antes disso (não por teimosia mas porque sem provas não tem como eu acreditar em ninguém), não há nenhuma chance.
Quanto à sua pergunta: Os órgãos genitais existem (e têm muitas falhas) para que os animais sexuados se reproduzam. É apenas uma das formas de reprodução do mundo animal, e a cópula dá prazer porque sem esse adicional os animais não desprenderiam energia para fazer sexo em lugar de procurar alimento ou abrigo. A evolução explica bem isso.
Além do instinto reprodutivo de que todos os seres vivos são dotados (que eu saiba), o prazer no sexo, seguramente não foi "criado" por um designer inteligente apenas para a felicidade do animal humano. Chimpanzés e outros primatas adoram fazer sexo. Muitos animais, quase certamente, sentem tanto prazer que arriscam, e até perdem, a vida para procriar. Essa parece ser uma das características evolutivas da vida e da diversidade que a evolução proporcionou.
Pode não ser evolução e sim criação? Pode sim, como eu disse antes, certeza total e completa não podemos ter nem mesmo da nossa própria existência, mas pode ser outras coisas também, como a criação acidental de um ET evoluído que já morreu há milênios, ou uma "semente" com defeito que "pulou" de um outro universo para esse no multiverso infinito e não criado do qual não temos nenhum conhecimento. Dá pra pensar tantas coisas que não podemos provar, mas que são tão válidas como possibilidade quanto o seu "designer inteligente" ou o deus bíblico!
Ah, sim. Reforçando, o livro do Dawkins de que estou falando não é sobre ateísmo, tá? É sobre biologia e ele é um biólogo, portanto, sabe do que está falando.
Não é verdade que é "sem dúvida" um projeto de engenharia incrível! Tanto não é que eu duvido e muitas pessoas, incluindo cientistas, têm dúvidas bastante bem embasadas. Como eu já disse, o corpo humano está cheio de "falhas de projeto" tão sérias que causam mortes. A gravidez tem vários exemplos delas.
Eu não disse que o corpo humano "apareceu do nada", disse que a evolução explica, e muito bem. Se você não aceita a explicação por causa da sua fé, eu posso aceitar porque não tenho nenhuma fé impedindo meu raciocínio.
Eu não disse que o desenho na caverna "só pode ter sido feito por uma pessoa inteligente", eu disse que pensaria que as chances são muito grandes porque já vi desenhos assim antes e eles eram feitos por pessoas, não é a mesma coisa. Eu não disse que o corpo humano "não precisou de ninguém para construir", eu disse que existem outras possibilidades de explicação, além da própria evolução, que é a mais válida e mais corroborada, que valem tanto quanto a sua explicação baseada na fé.
Eu credito na existência de várias coisas e pessoas sem nunca ter visto, não é possível viver sem acreditar em coisas que a gente não viu, por exemplo: eu acredito que tive uma bisavó que veio de Portugal mas nunca a vi, acredito porque minha mãe me contou e eu não tenho nenhuma razão para duvidar. Mas "acreditar" é diferente de ter fé, e eu não tenho fé. Só acredito porque e quando evidências me foram apresentadas de maneira confiável, e deixo de acreditar assim que alguma evidência em contrário apareça.
Não sei se não tem absolutamente nenhum modo de provar a existência do designer inteligente, sei que até agora não vi nenhum que fosse mais convincente do que a evolução; ou do que a semente vinda de outro universo de que falei acima, e essa última é BEM menos convincente do que a evolução porque eu inventei e, por isso, ao contrário da evolução, não tem nenhuma evidência científica que corrobore qualquer parte dela.
Se você demonstrasse um litro de água se transformar em sangue, não importa quando, na frente de um grupo de pesquisa sério em teste controlado, eu certamente consideraria isso um milagre, mas se fizer isso só para mim, eu acharia que é um truque de mágica muito bem feito. Você já leu sobre o James Randi? Ele ofereceu um milhão de dólares para quem fizesse alguma mágica desse tipo, em teste controlado acompanhado por especialistas, a oferta esteve válida durante anos, e o Randi morreu sem ter que pagar o prêmio.
O problema do seu argumento não é defender a possibilidade de existência de algum tipo de criador da vida, o problema é você usar expressões "sem dúvida" ou "com certeza". Como eu disse, não há como negar totalmente essa possibilidade uma vez que não sabemos exatamente como aconteceu, mas essa hipótese está longe de ser a única, ou mesmo a melhor das possibilidades. Repetindo, existem outras possibilidades com tantas evidências e tantos pontos obscuros quanto a do designer inteligente que você está tentando apresentar como única explicação. A gente facilmente pode pensar em uma, ou até mais de uma, como já demonstrei inventando a "semente" vinda de outro universo.
Sei que existem muitas pessoas não religiosas que afirmam que o corpo humano é uma bela obra de engenharia, eu afirmaria isso se estivesse falando com uma pessoa que não usasse o argumento de que "Só pode ser a criação proposital e intencional de um ser inteligente e superior". Pensada como resultado da evolução, sim, a vida (e não apenas o corpo humano) é um evento fantástico, mas devido às muitas imperfeições e às evidências de que muitas delas são resultado da evolução, não fica nem um pouco óbvio que precise existir um criador, por mais que eu saiba que muitas pessoas religiosas não negam a evolução com o argumento do "pontapé inicial", a igreja católica já fez isso oficialmente há um tempo.
Eu não disse apenas que "se água se transformar em sangue... eu certamente consideraria um milagre", eu disse que o faria NA CONDIÇÃO de que isso acontecesse em um experimento controlado. Pensei que essa ressalva tivesse deixado muito claro que eu não acredito, nem por um momento, que bastaria isso ser realizado por uma pessoa em uma espécie de show de mágica. Ou seja, eu simplesmente não acredito em milagres, e até prova em contrário, não acredito em designer inteligente, seja ele chamado de deus bíblico ou não.
Não acredito na existência de um ser criador com muito mais poder e inteligência. Menos ainda que tal ser, se existisse, se rebaixaria a fazer truques de mágica. Além da hipótese que inventei, como eu já disse antes, tem muitas outras que são tão válidas e que têm tantas "evidências" e possibilidades de serem verdadeiras quanto a sua. Uma delas, que inclusive é ou foi defendida de uma forma ou de outra por vários povos e culturas ao longo da história, é o politeísmo. Em observando muitos aspectos da realidade, entre a hipótese de um único criador e a de vários, que inclusive brigam e disputam entre si, o politeísmo faz mais sentido. Mas, no meu caso, não adoto nenhuma sem evidências e provas válidas, e teriam que ser válidas não apenas para mim, mas para todo mundo. Como disse o Carl Sagan "Afirmações extraordinárias exigem provas extraordinárias".
Todas as versões, exceto as científicas como a evolução e os estudos de cientistas como Hawking, têm "bem cara de lenda", e isso inclui toda a mitologia bíblica.
Você lembra que a tal "demonstração autêntica de seu poder" incluiu assassinato de crianças inocentes, né? Isso tem MUITO a cara de mitologia criada por um povo antigo para propagar sua própria religião e seu deus recém criado. Acho muito engraçado quando as pessoas dizem esse tipo de coisa que você acabou de dizer "como criador ele teria o direito de interferir em sua própria criação". Se existisse, teria sim, mas sempre me soa muita pretensão das pessoas religiosas acreditar que um ser capaz de criar o universo está preocupado com um "povo escolhido" e a forma com que esse povo vai puxar o saco dele.
Sim! essa afirmação é extraordinária, e exige provas extraordinárias. Sim, é algo que deveria nos surpreender, e muito, se de repente um ser inteligente desse tipo se provasse existente quando tudo indica que ele não existe, e mais, que se existisse não teria porque se dar o trabalho de interferir na vida de uma espécie insignificante habitando uma rocha insignificante na imensidade do universo. Vai ser muito difícil, impossível eu diria, você conseguir me "ajudar a enxergar" que existe um criador que está preocupado com a maneira como, por exemplo, as mulheres se comportam dentro da "família tradicional cristã", ou que mesmo sendo tão inteligente, cometeu tantos erros com a sua "máxima criação". A meu ver não há nenhum quebra cabeça a ser montado ou desvendado.
Acho difícil que o problema seja minha falta de humildade, penso que é justamente o fato de ter me desapegado da prepotência natural do animal humano que me tornei ateia. Como digo sempre, eu me tornei ateia quando tirei os olhos do meu próprio umbigo. Daí que, para mim, é você que deveria pensar se não seria interessante ajustar o seu ponto de vista com relação às pesquisas e estudos científicos que existem, são acessíveis e, embora não tenham respostas para todas as perguntas, são muito úteis para tirar vendas de fé sem comprovação e de prepotência especista que leva as pessoas a aceitarem as explicações mais fáceis e vantajosas para seus egos inflados.
Eu me sinto muito tranquila se não souber de onde viemos, aceito de forma muito natural que posso nunca saber. O que não quero, de jeito nenhum, é me agarrar a "respostas" que não me servem por falta de provas, de evidências e, em última análise, por mostrar um ser criado na idade do bronze por homens primitivos, preconceituosos e misóginos.
Respondendo à sua pergunta do laboratório se uma porção de água fosse transformada em sangue, sim. Eu passaria a considerar a possibilidade de haver uma fonte de poder maior do que nós humanos possuímos ou, no mínimo, maior do que eu possuo, uma vez que não saberia nem mesmo imaginar uma explicação lógica. E, por não saber, em nenhum momento eu afirmaria que "foi deus" ou que "com certeza foi o designer inteligente que agiu", muito menos me ajoelharia e pediria perdão pelo meu ateísmo. Eu esperaria que os cientistas estudassem o fenômeno e, enquanto não obtivesse nenhuma resposta, continuaria a pensar que algo estranho aconteceu e eu não sei o que foi. Enquanto não obtivesse resposta, acharia legal imaginar possibilidades, e provavelmente escreveria alguns contos de ficção científica.
Não há claros. Há o desespero, o medo e a prepotência das pessoas que as leva a se agarrar às suas fantasias e fazer qualquer coisa para "confirmá-las", incluindo os malabarismos mentais mais confiantes. Essa do ser hiper poderoso que propositalmente permite que imperfeições óbvias aconteçam e permaneçam é um bom exemplo do que acabei de dizer.
Estou velha, faz muito tempo que não estou preocupada com essas coisas que você listou para tentar explicar minha "resistência" em aceitar suas "provas". Para falar em "progresso espiritual" você precisaria primeiro provar que existe essa coisa que você chama de espírito e, depois, provar que se submeter a algo sobre cuja existência não há provas suficientes seria um progresso.
Seu argumento da água que bebemos ser transformada em sangue no nosso corpo é tosco demais, desculpe mas cheguei a dar risada aqui, e olha que nem sou bióloga! Para começar NÃO é isso que acontece no corpo. E não vou dizer mais nada sobre outros furos desse seu argumento porque não sou bióloga, mas bastaria procurar no Google que você certamente encontraria. Esse que você usou é uma versão do argumento do bolso vazio, que usa coisas que a ciência não faz para dizer que só deus pode realizar tal façanha impossível. Já disseram isso sobre, por exemplo, a amônia, antes que a ciência fizesse e essa substância se tornasse comum a ponto de ninguém mais pensar que "só o corpo humano perfeito é capaz de criar".
Por mais complicado que seja, o que acontece no corpo é explicável pelas leis da física, da natureza, da biologia, pela evolução. Não tem nada a ver com uma mágica de transformar um copo de água em um copo de sangue. Todas as perguntas que você faz não são suficientes para tornar a biologia um milagre de um ser transcendente, e seriam muito bem respondidas por mim se eu fosse uma bióloga competente, mas não sou.
As pessoas criaram mitos para explicar o que não entendem desde os primórdios da humanidade, e até hoje fazem o possível para continuar acreditando neles, com algumas modificações, como inserir a ciência; mas, na base, a raça humana se compõe do mesmo animal assustado que sacrificava ao trovão por medo dos raios que não sabia o que era. Tudo que não sabe explicar, o ser humano tem a tendência de "explicar" afirmando a existência de algum ser mitológico.
Há décadas que eu não preciso nem desejo solução para os problemas que ameaçam a humanidade, que convivo muito bem com a resposta "Eu não sei". Claro que gostaria de saber mais, sempre leio livros e vejo vídeos sobre ciência para aprender mais, mas minha vontade de saber nunca vai ser tão urgente a ponto de eu aceitar uma resposta que tenha como base apenas a fé. Para mim é fantasia demais esperar que a solução venha de um ser poderoso tal como um Criador. Sem provas não faz o menor sentido se apegar em mitos.
Não acho que "temos chances reais de algum amparo" com ou sem esse tal ser, não temos amparo nenhum fora do que podemos encontrar em nós, nas pessoas que amamos, em nossas ações e nossas melhores qualidades, se pudermos usar isso em lugar de nos odiar e nos destruir. Fora isso, nós, os animais humanos e todos os demais que dividem esse torrão azul conosco, estamos sozinhos, independente de existir ou não um "designer".
Seu argumento não é válido porque faz analogias impróprias como se provasse algo que não se provaria dessa forma porque não seria similar. Células são comparáveis a máquinas? Sim. Mas um criador do universo não precisaria obrigatoriamente existir, e caso existisse, não seria obrigatoriamente comparável a um engenheiro.
Povos antigos terem atribuído identidade "errada" ao Criador não anula sua existência. Mas também não a confirma. Dizer que eles estão errados não prova que você tem razão. Você está usando a mesma descrença que eu. Do meu ponto de vista, você está tão errado quanto eles. Tem uma frase que diz algo assim: "Se você rejeita todos os deuses menos o seu, então você pode entender porque eu rejeito o seu".
Acho que muitas pessoas encontraram na complexidade das descobertas científicas, maneiras de usá-las para tentar se agarrar mais ainda a suas crenças e mitos. O Antony Flew se declarou deísta, mas estava bastante velho e parece que apresentava sinais de problemas mentais. É compreensível que, ao final da vida, uma pessoa passe a ter ainda mais medo da morte e ainda mais razões para se agarrar às crenças religiosas, mesmo sendo um intelectual, cientista ou filósofo, afinal, são seres humanos.
Como eu disse antes, a complexidade não prova a existência de um deus, por mais que sua crença veja dessa forma. O fato de células serem comparáveis a máquina também não prova a existência de deus, principalmente porque a analogia não é perfeita e a forma como isso acontece é conhecida e não implica obrigatoriamente a interferência de uma "mente inteligente", se fosse assim não existiriam biólogos ateus.
Não existe prova da existência de nenhuma "Mente Inteligente", muito menos de que ela esteja supervisionando cada mitose e meiose celular, e a comparação entre seres humanos e uma "mente superpoderosa" é muito forçada. Se existisse essa tal "mente", ela seria tão comparável ao ser humano quanto somos comparáveis a um floco de neve. Talvez menos ainda.
Acho que chegamos a um ponto em que ficaremos "andando em círculos", você diz que tem evidências, provas e indicações, eu digo que suas evidências parecem mais com fé do que com razão e nem eu vou aceitar seus argumentos nem você vai aceitar os meus. Não tem como você me convencer porque li livros e vi argumentos muito mais convincentes e lógicos de pessoas que têm muito mais conhecimento do que nós dois sobre física, biologia, astronomia, neurociência, paleontologia, história. Até prova em contrário, eu fico com o que aprendi com essas pessoas.
Livros que li e recomendo muito: "Cérebro e crença", de Michael Shermer, que mostra como nosso cérebro é bom em nos enganar; "O relojoeiro cego", do Richard Dawkins, que mostra que a evolução explica mais do que o senso comum pensa; "Um universo que veio do nada", de Lawrence Krauss, que mostra o quanto nós somos insignificantes para sermos tão especiais como a crença religiosa quer acreditar, e "Breves respostas para grandes questões", de Stephen Hawking, que responde muitas perguntas de forma científica. Esses são alguns livros que li e ampliaram meu ateísmo, que até então quase se limitava ao deus bíblico e seus derivados.
Sobre “crenças limitantes” acho que o animal humano tem mais mesmo é o contrário: A crença prepotente de achar que sabe o que não sabe e de se achar a perfeição em forma de “máquina”. Muitas pessoas já disseram que a ciência nunca afirma saber tudo, quem faz isso é a religião. E eu acrescentaria que a ciência não afirmar saber tudo, não é por ter algo do tipo “crença limitante”, é o contrário disso. A ciência está sempre buscando o conhecimento e sabe que quanto mais respostas encontra mais perguntas surgem. É como disse o Sagan: Eu não quero acreditar, eu quero saber. E se tem uma coisa que a ciência sabe é que tem coisas que ela muito provavelmente nunca vai saber.
A palavra “crença” não faz muito sentido quando estamos falando em ciência e em busca de conhecimento. Não porque as pessoas, mesmo as pessoas cientistas e ateias, não têm nenhuma crença, mas porque para elas a palavra “crença” é MUITO diferente da palavra fé, ou seja, suas crenças são provisórias e estão prontas a serem abandonadas diante de uma resposta melhor que venha a ser descoberta. As pessoas que têm crenças, no sentido mais próximo da palavra fé, costumam preferir ignorar ou “ressignificar” respostas que contradigam aquilo que elas acreditam. Até cientistas religiosos (que existem, eu sei) fazem isso. Mas não enquanto fazem ciência! E designer inteligente, por mais que as pessoas que defendem isso digam o contrário, é crença no sentido de fé.
Quanto a “busca”, as respostas que porventura busque, não serão encontradas nesse campo pseudocientífico do designer inteligente. Esse eu já tenho informações suficientes para descartar sem remorso ou curiosidade. Podemos comparar com qualquer panaceia: Sei o suficiente de medicina, por menos que seja e por mais ignorante que seja nessa área, para saber que não preciso me dar ao trabalho de aprender uma oração e uma dança quando tenho alguma doença cujo tratamento adequado é um analgésico ou um antibiótico, por isso procuro a medicina e não uma benzedeira... ou a homeopatia.
Você pergunta “Por que os maquinários de uma empresa sem alguma intervenção inteligente constantemente param, mas a máquina do corpo humano sem intervenção de alguém inteligente, continua funcionando? Como assim a analogia não é perfeita?”
Mas não são vocês que dizem que o tal Designer Inteligente é um ser absolutamente superior? Como querem que seja normal comparar suas “criações” com as criações de seres imperfeitos como o animal humano? Brincadeiras à parte, o que falta à sua pergunta é a compreensão da evolução tendo o cuidado de “desvesti-la” da crença no designer inteligente. É ver a evolução como a ciência a vê; a ciência séria, não a pseudociência.
Outra coisa que certamente ajudaria, é ver que não é verdade que “a máquina do corpo humano sem intervenção de alguém inteligente, continua funcionando”, pelo menos não do mesmo jeito. Afinal, a evolução está em ação, está acontecendo e não só o animal humano como todos os outros animais, estão sofrendo mutações (que são basicamente “falhas” na replicação das e no interior das células) o tempo todo, e essas mutações continuam deformando, matando ou impedindo o nascimento de indivíduos e, vez ou outra permitindo e até facilitando o desenvolvimento de indivíduos que a passam adiante em sua descendência, quando essa mutação o torna mais apto a sobreviver em seu habitat.
Embora as pessoas tenham o direito de acreditarem no que quiserem e em questão de fé tudo que se pode dizer é que esse é um direito individual e coletivo, o fato é que a evolução NÃO PRECISA de um designer inteligente! Simples assim.
Portanto, eu também não preciso acreditar nisso quando a ciência me dá todas as respostas que me satisfazem, incluindo a resposta: Não sabemos.
OS LIMITES DA MALDADE HUMANA
Vendo a série O conto da Aia, depois de ter lido o livro que a inspirou e também a continuação, lembrei da frase do Einstein:
"Duas coisas são infinitas: o universo e a estupidez humana. Mas, no que respeita ao universo, ainda não adquiri certeza absoluta".
E pensei que a palavra "estupidez" pode ser substituída pela palavra "maldade".
Quantas pessoas com quem convivemos, que nos atendem nas lojas, mercados, órgãos públicos, que vemos na televisão, nas redes sociais ou com quem cruzamos pela rua não seriam felizes, convictas e dedicadas Tias Lydias, Serenas, estupradores e assassinos de aias e martas?
Quantas pessoas com quem convivemos, que nos atendem nas lojas, mercados, órgãos públicos, que vemos na televisão, nas redes sociais ou com quem cruzamos pela rua não seriam felizes, convictas e dedicadas Tias Lydias, Serenas, estupradores e assassinos de aias e martas?
Pessoas más que se julgam boas e que, por isso mesmo, não têm limites e não se arrependem nunca.
Quantas pessoas assim existem no mundo?
17 de agosto de 2024
SOBRE O BEM E O MAL
O deus cristão, cuja definição comum costuma envolver dizer que ele é o Bem; o demônio, diabo, capiroto e mil outros nomes, que também é frequentemente definido como o Mal, ambos são deuses e deuses não existem.
Mal e bem são definições que nós, animais humanos, damos para as coisas que nos prejudicam, nos fazem sofrer, nós vemos e sentimos como erradas... e para as coisas que nos alegram, nos fazem sentir bem e percebemos como corretas.
Como somos animais falhos, defeituosos e, em muitas situações, podemos nos tornar nós mesmos o bem ou o mal, essas definições não têm como ser perfeitas, precisas e definitivas.
Portanto, o bem e o mal existem e não são tão relativos como muitas pessoas insistem em afirmar.
Mas o Bem e o Mal, seja como entidade ou como conceitos absolutos, além de nós ou "implantados" em nós, como pregam algumas crenças, esses absolutamente não existem!
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