7 de outubro de 2020

ABANDONO

Eu queria te dar o meu planeta desabitado
E girar em tua órbita
Queria chorar um oásis no abandono da tua vida
Ser serpente enroscada em teu presente
E ser pedra lascada em teu passado
Fechar os olhos devagar e ver o mundo na tua respiração
Queria ser muda e chorar um filho para te sorrir
Queria cantar com harpas canções de ninar
Para teus problemas e tuas tristezas
Como um rio lavar teu tédio e encher de som
Teu silencio de morte
Queria não ser erro para corrigir tua vida

Mas sou abandono
Sou um até logo com som de adeus
Sou sempre a que parte mesmo na chegada
E por tuas lágrimas
Só posso te dar os olhares piedosos
Dos insetos que vagam sobre a minha epiderme
Sou a sujeira dos tempos do mundo
E ao invés de te purificar
Egoisticamente
Lavo em tua limpidez
Minha lama negra
Sou o suspiro cansado
Que busca a morte e grita a vida
Quem pensa amar
E não sabe ao menos quem é
Deveria me purificar em ares remotos
Viver mil vidas
Vagar mil mundos
Para então ousar chegar perto
Do teu planeta

Mas você foi o sol
Que não olhou a quem iluminar
E penetrou meu ser
Minha alma estéril e infecunda
Lampeja como vaga-lume
Iluminada por você
Mas jamais poderá deixar de rastejar
Entre esses tantos pontos de interrogação
Vou destruir tua lua e te apagar o calor
Serei teu demônio negro
E você não sentirá sequer o peso dos meus pés
Calçando plumas
Pisando em você

Chorei tantos mares
E não soube lavar nem mesmo esse sorriso podre
Que se abre noite e morre de dor
Na alma de quem enganou sem saber

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