28 de junho de 2020

CONFESSA!

(Autores: Divina e Preta)

Conta pra sua mãe
A vida que um filho leva
Conta do seu medo
Da sua insegurança
Do seu debater pelo caminho
Conta-lhe tudo
Fala do seu amor solitário
Do seu desejo estalado
Dos seus pensamentos
Mais sussurrados
Conta-lhe sobre seus vícios
Mais devastadores

Conta-lhe da sua angustiosa busca
E fala-lhe dessa solidão interior
Que lhe invade o peito
Conta pra sua mãe
Da sua infância esquecida
Da sua pureza guardada
Diz-lhe tudo
Que lhe ensinaram na vida
Conta, conta pra sua mãe.

Conta do seu brinquedo esquecido
Da sua adolescência medrosa
Da sua fuga quando
Adulto
Lhe disseram que a vida é má
Conta pra sua mãe.

Fala do seu primeiro cigarro
Queimando seus sonhos de menino
Dos seus passos na corrida da vida
Fala-lhe do seu melhor amigo
Da mentira que lhe disseram
Quando você jurou amar
Pela primeira vez
Conta pra sua mãe, conta.

Conta que você chorou
Em tantas noites perdidas
Que você foi boêmio
Das madrugadas longínquas
Que adormeceu em braços estranhos
Que você acordou
No melhor dos seus sonhos
Conta pra sua mãe.

Conta que na sua lembrança
Ainda existe bastante daquelas canções
Que faziam seus olhos aos poucos se fecharem
E depois de alguns instantes
Num mundo todo colorido
E diverso deste que agora você conhece
Se encontrava com seus heróis
E de espada você lutava
Conta pra sua mãe.

Fala da ânsia de subir na vida
Que te derrubou
Conta da menina
De olhos doces e sorriso puro
Que te segurou pela mão
E te levou ao sofrimento
Fala do seu filho que ficou jogado
No corpo de alguma infeliz
Em uma esquina da vida
Conta pra sua mãe.

Fala da fumaça que lhe trouxe ilusão
E te perdeu a vida
Conta, conta logo pra sua mãe
Esse nó que te aperta a garganta
Quando você se lembra
Que também é filho

Diz à sua mãe do professor
Que lhe ensinou como se esquece
As boas coisas da vida

Conta pra sua mãe a saudade
Daquele abraço que ela lhe deu
Em um passado tão longe
Conta.

Conta pra sua mãe tudo
Tudo sobre aquela pessoa que te usou
E te abriu dor física te derrubando a moral

Conta daquele cubículo imundo
Onde você era um rato
Conta
Conta pra sua mãe.

Fala daquela primeira árvore
Que você plantou
E num dia de inverno
Sem que você esperasse
O vento derrubou as folhas amigas
Com as quais você confidenciava.

Conta do primeiro passo
Que, seguro por mãos fortes
Você conseguiu dar
Fala-lhe que inutilmente
Você procura sem cessar
Essa mesma força
Conta pra sua mãe
Conta.

Conta que agora
Cansado e triste
O suor da luta lhe banha o rosto
Que antes vivia iluminado de sorrisos
Conta que hoje
Na agonia do seu fim
Somente o eco do seu apelo
Responde aos seus suplícios
Conta pra sua mãe
Conta pra sua mãe, conta.

Fala da avenida percorrida
Que ao olhar para trás te dava medo
Conta pra sua mãe
Que cada cabelo branco em sua cabeça
Colocado pelas mãos do tempo
Mais te afastam do filho que ela conheceu
E mais te aproximam dela

Conta pra sua mãe que nesses anos
Um amor pequeno cresceu tanto
Que o fez mudar
Conta
Conta pra sua mãe.

Conta que você se escancarou
Na janela da vida
E sem nada de noção
Foi encontrado bêbado
No cume do desespero
Conta pra sua mãe.

Fala que agora
Já encerrando-se para a vida
Sente o sabor amargo
Dos pileques da experiência
E que sem saber por que
(Ou sabe?)
A língua fica tão grossa
Que lhe é impossível
Soltar qualquer sílaba
Quando grita no seu íntimo
Uma enorme necessidade
De cuspir pra fora
Uma porção de frases
Mesmo sem finalidade.

Conta pra sua mãe, conta.

Conta que agora
Abraçando a cor indefinida da morte
Você sente tristeza
Ao saber que vai deixar gravado
Nos quatro cantos do mundo
Sua história inacabada

Fala que a paz lhe abraça
Pois junto dela
Você ouvirá outras histórias idênticas
Às que você a ela decifrou

Conta pra sua mãe
Que essas histórias
Terão o mesmo começo
O mesmo meio e o mesmo fim
Que você teve
Conta pra sua mãe, con...                                                  

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