Uma vez, já faz alguns
anos, comecei a me perguntar de quanto tempo eu precisaria para fazer as coisas
que gostaria de fazer, que seriam: aprender todas as línguas, ler todos os
livros - relendo os melhores quantas vezes quisesse -, conhecer todos os
lugares que escolhesse conhecer - retornando a eles quantas vezes quisesse -,
conhecer e conviver com todas as pessoas não escrotas, aprender e praticar
todas as profissões, todas as artes, todos os esportes, todos os hobbys. Pensei
que com certeza demoraria muito para conseguir realizar esse desejo, mas demoraria
bem menos do que a eternidade.
Pensando cada um desses
desejos, percebi que estavam muito restritos, afinal, aprender todas as línguas
que são faladas hoje seria aprender bem poucas línguas comparado à quantidade
de línguas que já foram faladas e pensando nas muitas que ainda podem surgir.
Ler todos os livros também tem restrições, mesmo tirando os muitos livros que
não quero ler porque não prestam, ainda faltariam os muitos que já se perderam
na história e os muitos que ainda não foram escritos. Conhecer todos os lugares
não significa conhecer todos os lugares porque cada lugar já foi vários lugares
e provavelmente será muitos outros ainda. Embora alguns lugares, em alguns
momentos, eu decididamente não desejasse conhecer, como Auschwitz nos negros
tempos de Hitler, por exemplo.
Para as pessoas valem
as mesmas restrições que apontei para os lugares e as mesmas restrições dos
livros: Pessoas mudam com o passar do tempo, portanto, conhecer uma pessoa
maravilhosa pode significar que a convivência teria que ser longa para que se
possa conhecer as várias pessoas que essa mesma pessoa é. Tantas e tantas pessoas
maravilhosas já morreram, tantas e tantas ainda não nasceram e, assim como
acontece com os livros, muitas pessoas eu preferia não conhecer porque não
prestam.
Aprender e praticar todas
as profissões, todos os esportes e todas as artes parece legal, mas tem algumas
profissões que eu não gostaria de saber, muito menos de praticar, como a profissão
de pastor evangélico por exemplo, ou a profissão de feitor em fazendas
escravagista. Quanto às artes e ao esporte não consegui pensar exatamente em
nenhuma restrição porque alguns absurdos que uns ou outros chamam de arte ou de
esporte não entram e não entrariam nunca na minha definição; como a "arte"
de explorar pessoas e o "esporte" da caça.
Concluí que para realizar
esse meu desejo utópico de maneira satisfatória, mesmo excluindo pessoas e
livros que não prestam, lugares que em determinados momentos não me interessam,
profissões que não prestam e esportes e artes que não são nem esportes nem
artes, eu precisaria viajar no tempo para frente e para trás a meu bel prazer. Desse
modo o tempo necessário seria bastante "esticado" mas, mesmo assim,
seria muito menor do que a eternidade.
Nesse ponto fiquei com
dois problemas: O primeiro é a impossibilidade da viagem no tempo; o segundo é
o sem graça de estar sozinha. Então pensei em possíveis soluções para esses
problemas. Eu poderia viajar por planetas, galáxias e universos e encontrar
outras línguas, outros livros, outros lugares, outras pessoas, outras profissões,
outras artes, outros hobbys e outros esportes. Talvez cada um deles em número
infinito. Eu poderia também, nesses passeios entre planetas e universos,
encontrar outras pessoas que têm os mesmos poderes e desejos que eu.
Resumindo: Certamente eu
aceitaria a vida eterna feliz da vida se pudesse aprender todas as línguas que
existem, que existiram e que existirão; se pudesse ler todos os bons livros que
já foram e que serão publicados; se pudesse conhecer todos os lugares do
planeta em todos os momentos em que esses lugares existem, existiram e
existirão; se pudesse conhecer e conviver com todas as pessoas não escrotas que
existem, que existiram e que existirão; se pudesse aprender e praticar todas as
profissões, todas as artes, todos os esportes, todos os hobbys que existem, que
existiram e que existirão; e eu teria que poder fazer tudo isso aqui na Terra e
em um número infinito de outros planetas habitados ao longo da vida desse e de
um número infinito de outros universos.
E além disso, tenho
certeza de que eu precisaria não ser a única pessoa capaz de viver eternamente
nessas maravilhosas condições, seria necessário que existissem pelo menos umas
poucas pessoas que também pudessem viver essa vida comigo, e seria fundamental
que essas pessoas não fossem escrotas!
Então, para dizer que aceitaria
a vida eterna feliz da vida, faltam “apenas”
algumas condições insuperáveis: A existência de infinitos outros planetas
habitados por pessoas, a viagem no tempo, a viagem interestelar e “interuniversal” e a companhia agradável.
Todas essas coisas que, até agora, só existem na minha imaginação.
Além de tudo isso,
seria necessário que esse corpo que tenho se modificasse a ponto de poder fazer
todas essas viagens e que essa mente que tenho se modificasse a ponto de poder
armazenar todas essas experiências. Sim, porque, para mim, se não puder ter
memória do que vivi, então não vivi e não me interessa viver. Não existe vida
que valha viver se não houver memória!
Então, diante de todas
essas impossibilidades que apontei e da aversão que tenho por todos os outros
exemplos de vida eterna que já vi nas literaturas e nas religiões, acho melhor
ficar quietinha e morrer, para sempre e completamente, quando chegar minha
hora.
Mas se a pergunta é
apenas “Você gostaria de viver
eternamente?”, com toda a certeza e convicção eu responderia com um sonoro
SIM. Desde que nas minhas condições, é claro.
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