Tenho visto algumas
pessoas “descomemorando” a premiação do Chico Buarque pelo fato de ele ser
oriundo de uma classe privilegiada. Algumas dessas pessoas até reconhecem a
qualidade das obras do autor, mas veem tais obras como resultado do fato de ele
nunca ter tido dificuldades financeiras, desmerecendo assim a escolha de seu
nome para receber esse prêmio. Embora concorde que a situação financeira e o
ambiente em que uma pessoa foi criada tem influência em sua condição e
possibilidade de criar obras de arte de qualidade, vou discordar sonoramente da
“descomemoração”!
AMO o Chico desde que
era uma criança, as letras de suas músicas, a poesia, o conteúdo social...
Chico Buarque ajudou a moldar a pessoa que sou, por isso não vou negá-lo não!
AMO o Chico, comemoro o prêmio, adoro que ele o tenha recebido e vou continuar
para sempre me comovendo com Pedro Pedreiro, Pedaço de Mim, Mulheres de Atenas,
Cálice e tantas joias preciosas que saíram daquele cérebro maravilhoso! Se eu
fosse religiosa daria graças por ele ter nascido elite e ter podido usar sua
genialidade em lugar de sufocá-la para sobreviver.
Aliás, penso a mesma
coisa de Guimarães Rosa que também pertencia à elite e escreveu, entre outras
obras primas, o livro mais fantasticamente maravilhoso da literatura
brasileira: Grande Sertão, Veredas. Esse mundo seria mais pobre se essas duas
pessoas (e outras como elas) tivessem nascido em condições miseráveis porque
possivelmente teriam passado a vida lutando pela sobrevivência e não teriam
criado as maravilhas que criaram. Aliás, um dos motivos que me fazem triste com
o elitismo da educação e os abismos sociais no mundo desde sempre é pensar
quantos talentos perdemos em tantas áreas da arte e das ciências porque não
damos a milhões de crianças e jovens a possibilidade de descobrir e desenvolver
seus talentos, e em muitos casos até sua genialidade. Portanto, fico feliz por
alguns nascerem privilegiados e sim, louvo e me alegro com isso. Chico é um
gênio e eu pude desfrutar de sua genialidade porque ele nasceu em "berço
de ouro". QUE BOM que tenha sido assim!
Um dos seres humanos
que mais admiro no mundo é Albert Bruce Sabin, pouco sei sobre a biografia
dele, confesso, mas imagino que se não tivesse nascido em uma família com boas
condições financeiras não teria sequer conseguido fazer medicina, menos ainda
doutorado. Imagine se Sabin tivesse nascido pobre e não tivesse feito nada do
que fez. Não teria descoberto a vacina, não teria aberto mão da patente, não
teria salvado milhões de crianças de um destino terrível. Como dizer que ele
não merece minha admiração porque tudo o que conseguiu foi graças a seu berço
privilegiado? Não e não mesmo! Foi graças à sua genialidade e às suas
qualidades como ser humano sensível e empático. Felizmente as condições de seu
nascimento não o impediu de concretizar todo seu potencial. Para sorte de toda
a raça humana.
Outro ponto: Sempre que
vejo a notícia de uma superação do tipo que, felizmente, vemos com certa
frequência, de um jovem ou uma jovem vind@ de periferia, filh@ e net@ de gente
muito pobre, que recebe um prêmio (geralmente medalha ou troféu) por ter sido
destaque em algum concurso ou olimpíada em algum campo - matemática, ciência,
dança, música, seja o que for - aí sim me dá uma certa tristeza porque penso
comigo "Será que essa pessoa não teria ido MUITO mais longe se tivesse
nascido em uma família da elite? Não seria um gênio imortal em lugar de um destaque
louvável?"
Então, sem pejo, sem
“senão” e sem “mas”, comemoro e me sinto feliz por esse grande ser humano e
esse artista genial que é Chico Buarque de Holanda ter recebido o prêmio
Camões. Ele merece!
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