(Com selo de
antiguidade)
Esta semana recebemos a
notícia de que nossa escola – e mais de noventa outras escolas compartilhadas
como a nossa – será extinta e tudo que somos e temos terá que ser transferido
para o prédio de outra escola mais ou menos perto de onde estamos. Ou seja,
essa escola estadual que tem prédio próprio vai absorver nossa escola, que
deixará de existir.
Até aí, para quem está
de fora e pode pensar sem envolvimento emocional pela escola que temos e que é
as pessoas que a formam e que criaram um vínculo que dói desfazer, pode nem
parecer uma notícia assim tão ruim. Acontece que o prédio para onde iremos é
desconfortável e até mesmo assustador para alguns de nós; e não sem razão
porque fica na entrada de uma comunidade e numa rua um tanto afastada da
avenida por onde passam os ônibus. Não esquecer que estamos no Rio de Janeiro e
nossa escola é noturna.
Além disso, é possível
que nem mesmo nessa situação ruim a gente consiga ficar, isso porque muito
provavelmente os alunos não vão aceitar essa transferência, muitos preferirão
ficar em outra escola mais central. Em consequência disso nossas turmas, que já
são pequenas, simplesmente terão que ser fechadas e muitos de nós ficaremos sem
aulas.
Preparando-nos para
aquela necessidade absurda de, no meio do ano, correr atrás de aulas e pegar
dois tempos em uma escola, quatro em outra, e mais algumas em uma terceira,
talvez completando a carga com uma quarta e passando mais tempo em um ônibus
indo de uma escola a outra do que na sala de aula trabalhando, o que a gente
sente só pode ser chamado de revolta.
E o curioso é que procurei e não
encontrei essa notícia em nenhum lugar, será que ninguém vai falar no assunto
para não prejudicar a gestão do prefeito e do governador? Tomados pelo
desânimo, dobrados pela sensação de humilhação e engasgados pela impotente
revolta nós, ficamos simplesmente sem ânimo para trabalhar, sem disposição para
pensar nossa própria vida profissional e sem condições de ter a menor fé na
educação e no futuro. Por que ninguém está falando sobre isso em nenhum jornal?
PARA QUEM NÃO SABE O QUE É ESCOLA
COMPARTILHADA:
Uma das maiores, e mais
desagradáveis, surpresas da minha vida profissional foi conhecer na cidade do
Rio de Janeiro as escolas compartilhadas.
Para quem não sabe,
como eu não sabia até poucos anos atrás, escolas compartilhadas são duas
escolas que dividem, de forma bem desigual, um único prédio. A coisa funciona
assim: O prédio é da prefeitura e durante o dia a escola é municipal.
Geralmente quem passa na frente nem sabe que são duas escolas porque na fachada
do prédio costuma ter apenas o nome da escola municipal; a escola estadual só
existe no período noturno e só em algumas salas do prédio.
A escola estadual que
não tem prédio próprio, e que em geral não tem nome porque seu nome não aparece
em nenhum lugar visível, também não costuma ter muitas outras coisas: não tem
cozinha, não tem laboratórios, não tem quadra, não tem banheiros suficientes,
não tem respeito, não tem direitos, não tem um quadro de avisos na sala dos
professores. Para ser honesta não sei sobre todas as carências das outras
escolas, estou falando basicamente da minha, mas imagino que as outras não
sejam muito diferentes, embora em alguns aspectos temo que a minha possa ser
pior porque parece que somos menos tolerados do que a maioria.
Alunos, funcionários,
professores e a até mesmo a diretora da nossa escola não temos sequer o direito
de entrar no prédio alguns minutos antes do horário para fugir de uma eventual
chuva, isso porque ninguém tem a chave do prédio e o portão só é aberto, de
muito má vontade, às 18 horas. Ficamos impossibilitados de realizar qualquer
atividade ou desenvolver qualquer projeto que exija o uso do prédio fora do
horário das 18 às 22 e trinta e apenas nos dias úteis.
Na minha escola já
aconteceram coisas absolutamente inacreditáveis por conta da intolerância que
existe entre o pessoal da escola municipal, donos do espaço, e o pessoal da
escola estadual, hóspedes indesejados. Um exemplo foi o dia que cheguei na sala
dos professores e havia água, café e borra de café espalhados sobre a mesa
grande e as duas outras mesas menores da sala. Pela maneira como estava a
sujeira era difícil pensar em uma coisa diferente do simples e proposital
interesse de criar desconforto; era o famoso recado: “Strangers go way!”.
Bem, essa é a escola
compartilhada. No nosso caso uma escola que deu a sorte de reunir um pessoal
ótimo sob uma direção competente, mas que no segundo semestre não existirá
mais. Sobraremos apenas nós; pessoas desencantadas que foram humilhadas e
roubadas do seu ânimo, da sua vontade e do pouco da fé no futuro da educação
que ainda nos mantinha lutando por um ensino de qualidade apesar de tudo.
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