13 de junho de 2020

CONVERSANDO SOBRE DEUS


Entendo seus sentimentos, como em geral entendo, e até invejo, os sentimentos das pessoas quando passam por situações de dor como a sua, porque entendo que acreditar que deus te ama, está olhando por você e te ajudando é um consolo, um consolo que não tenho.

O que digo é que eu, Divina, não consigo me sentir assim, não consigo pensar em um deus que seja bom se ele for bom para mim e não para todo mundo, entende? Se eu me curei de uma doença ou saí de um problema grave mas outro morreu e outro não conseguiu se livrar de seus problemas, não posso agradecer a deus. Pelo contrário: se tiver que pensar que foi deus quem me curou ou ajudou a resolver meu problema, vou detestá-lo por ter feito isso comigo e não com o outro. Para mim pareceria uma parcialidade injusta e odiosa; principalmente se, como me dizem, partiu de um deus todo poderoso.

E sobre esse deus me dar problemas para que eu aprenda alguma coisa, isso me parece um completo absurdo. O que pergunto diante disso é: O que um recém-nascido pode aprender quando é violentado, quando é torturado, agredido, ou quando tem uma doença? O que crianças que morrem de fome e animais que sentem suas entranhas devoradas pelo predador estão aprendendo? E mais: Por que um deus todo poderoso não pode ensinar sem ser pela dor e pelo sofrimento?

Desculpe mais uma vez, mas esse conceito de que deus não criou o mal porque o mal não existe não faz nenhum sentido pra mim. Eu pergunto: Se o mal não existe, então a doença que atacou seu ente querido não é um mal? Sei não, mas acho que, empiricamente, você sabe e todo mundo sabe que o mal existe quando se defronta com ele. Agostinho, um dos que fizeram essa afirmação, já foi contestado inclusive por outros filósofos teístas, e eu, ignorante e pobre, não aceito de forma nenhuma que o mal não existe.

Pois se o mal faz parte de mim – e isso é um fato que muitos teístas afirmam e que eu vejo e sinto por mais boazinha que gostasse de ser! – só posso aceitar que o mal não existe se aceitar que eu mesma não existo. Você consegue aceitar sua própria inexistência? Filosoficamente até posso ver sentido nisso, empiricamente nunca.

Você diz que quando vemos crianças sofrendo não estamos vendo a totalidade da vida, estamos vendo o que então? Se estamos vendo aspectos, partes dela, que aspectos e que partes são essas que podem ser aceitas junto com um deus todo poderoso que pode tudo mas não pode criar um mundo sem crianças sofrendo? Onde é que pode existir sentido nisso? Eu não consigo perceber.

O deus que desacredito é qualquer deus que crie a mim e a esse mundo em que vivo, é qualquer deus ao qual dão características de bondade que não casam de forma alguma com a realidade que sou e com a realidade em que vivo. Isso inclui o deus antropomórfico e “primitivo” de que você fala mas inclui também, sem dúvida, o deus em que você acredita.

Mas ele não existe e não faz sentido, por isso crianças e animais sofrem”. Com essa frase eu quis dizer que se um deus bom, justo e poderoso como o deus que todos os que creem nele definem existisse, certamente não existiria sofrimento, principalmente sofrimento para crianças e animais, portanto, é sim porque deus não existe que crianças e animais sofrem. Não vejo outra forma de analisar o mal, todo o mal.

Na minha visão o mal e deus são conceitos que se excluem, não é possível que o mal e deus existam, os dois, ao mesmo tempo. Vejo a coexistência de deus e do mal como uma incoerência total, a maior de todas elas talvez, Agostinho também viu isso e, para salvar deus, resolveu negar o mal, eu faço o contrário.

Como, pelo que vejo, sinto e sei o mal existe tanto quanto eu existo, vejo como mais do que verdadeiro o fato de que deus não existe. Nem consigo entender os que dizem que não é possível provar a inexistência de deus, na minha humilde opinião essa inexistência é logicamente mais do que provada.

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