Entendo seus sentimentos, como em
geral entendo, e até invejo, os sentimentos das pessoas quando passam por
situações de dor como a sua, porque entendo que acreditar que deus te ama, está
olhando por você e te ajudando é um consolo, um consolo que não tenho.
O que digo é que eu, Divina, não
consigo me sentir assim, não consigo pensar em um deus que seja bom se ele for
bom para mim e não para todo mundo, entende? Se eu me curei de uma doença ou
saí de um problema grave mas outro morreu e outro não conseguiu se livrar de
seus problemas, não posso agradecer a deus. Pelo contrário: se tiver que pensar
que foi deus quem me curou ou ajudou a resolver meu problema, vou detestá-lo
por ter feito isso comigo e não com o outro. Para mim pareceria uma
parcialidade injusta e odiosa; principalmente se, como me dizem, partiu de um
deus todo poderoso.
E sobre esse deus me dar
problemas para que eu aprenda alguma coisa, isso me parece um completo absurdo.
O que pergunto diante disso é: O que um recém-nascido pode aprender quando é
violentado, quando é torturado, agredido, ou quando tem uma doença? O que
crianças que morrem de fome e animais que sentem suas entranhas devoradas pelo
predador estão aprendendo? E mais: Por que um deus todo poderoso não pode
ensinar sem ser pela dor e pelo sofrimento?
Desculpe mais uma vez, mas esse
conceito de que deus não criou o mal porque o mal não existe não faz nenhum
sentido pra mim. Eu pergunto: Se o mal não existe, então a doença que atacou
seu ente querido não é um mal? Sei não, mas acho que, empiricamente, você sabe
e todo mundo sabe que o mal existe quando se defronta com ele. Agostinho, um
dos que fizeram essa afirmação, já foi contestado inclusive por outros
filósofos teístas, e eu, ignorante e pobre, não aceito de forma nenhuma que o
mal não existe.
Pois se o mal faz parte de mim –
e isso é um fato que muitos teístas afirmam e que eu vejo e sinto por mais
boazinha que gostasse de ser! – só posso aceitar que o mal não existe se
aceitar que eu mesma não existo. Você consegue aceitar sua própria
inexistência? Filosoficamente até posso ver sentido nisso, empiricamente nunca.
Você diz que quando vemos
crianças sofrendo não estamos vendo a totalidade da vida, estamos vendo o que
então? Se estamos vendo aspectos, partes dela, que aspectos e que partes são
essas que podem ser aceitas junto com um deus todo poderoso que pode tudo mas
não pode criar um mundo sem crianças sofrendo? Onde é que pode existir sentido
nisso? Eu não consigo perceber.
O deus que desacredito é qualquer
deus que crie a mim e a esse mundo em que vivo, é qualquer deus ao qual dão
características de bondade que não casam de forma alguma com a realidade que
sou e com a realidade em que vivo. Isso inclui o deus antropomórfico e “primitivo”
de que você fala mas inclui também, sem dúvida, o deus em que você acredita.
“Mas ele não existe e não faz
sentido, por isso crianças e animais sofrem”. Com essa frase eu quis dizer
que se um deus bom, justo e poderoso como o deus que todos os que creem nele
definem existisse, certamente não existiria sofrimento, principalmente
sofrimento para crianças e animais, portanto, é sim porque deus não existe que
crianças e animais sofrem. Não vejo outra forma de analisar o mal, todo o mal.
Na minha visão o mal e deus são
conceitos que se excluem, não é possível que o mal e deus existam, os dois, ao
mesmo tempo. Vejo a coexistência de deus e do mal como uma incoerência total, a
maior de todas elas talvez, Agostinho também viu isso e, para salvar deus,
resolveu negar o mal, eu faço o contrário.
Como, pelo que vejo, sinto e sei
o mal existe tanto quanto eu existo, vejo como mais do que verdadeiro o fato de
que deus não existe. Nem consigo entender os que dizem que não é possível
provar a inexistência de deus, na minha humilde opinião essa inexistência é
logicamente mais do que provada.
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