Vejo, cumprimento,
abraço ou beijo um amigo ou amiga e digo que desejo muitas felicidades para ele
ou ela; isso é comum de acontecer e estou sendo tremendamente, totalmente e
completamente sincera nos meus votos de felicidades, mas no momento seguinte sei
que não disse tudo. Não fui sincera por inteiro.
Pelas festas de Natal e
Ano Novo, pelo aniversário, pelo dia disso ou daquilo, mando, por e-mail ou por
scrap, meus votos de felicidades aos amigos, virtuais e não virtuais. A todos
digo o quanto desejo que sejam felizes naquele dia e em todos os outros dias;
sou sincera, muito sincera, estou mesmo desejando, com todas as minhas forças,
que meus amigos sejam e estejam felizes, mas novamente sei que não disse tudo.
O que digo é verdade, mas não a verdade completa.
Quando falo com meu
filho, digo que o amo e ele sabe que isso é a mais pura verdade, sempre digo a
ele que vivo para desejar que ele seja feliz. Mas mesmo para o meu filho, o ser
que mais amo no universo, eu ainda não disse a verdade inteira. E me pergunto:
qual é mesmo a diferença entre uma verdade incompleta e uma mentira?
No momento seguinte ao
momento em que falo, dá vontade de tentar explicar para a pessoa o que se passa
comigo, mas fico achando que essa pessoa não vai me entender, que vai pensar
que não estou sendo nada sincera ou que não gosto dela como na verdade gosto. Ou
ainda – o que é pior – sinto que vou começar uma conversa que vai soar chata e
piegas.
Fico achando que se
disser tudo vou “quebrar” alguma coisa da magia daqueles votos, vou
“enfraquecer”, pelo menos na aparência, a força do que desejo; ou, o que é
muito pior, vou correr o risco de magoar essa pessoa que é tão especial para
mim e que, por causa da minha tentativa de explicação, pode se sentir traída
por achar que não sei valorizá-la como ela merece.
Chego até a me sentir
bem por estar desejando felicidade para todo o mundo, afinal isso é um desejo
bom! Mas em seguida lembro que meus votos nunca se realizarão no todo e fico me
perguntando se não estou prejudicando aqueles que amo. Talvez se desejasse só
para aquela pessoa, meu desejo funcionasse, mas pra todo mundo não funciona,
não é possível funcionar e eu sei bem disso, então acho que estou fazendo tudo
errado, mas não consigo segurar minha cabeça e me obrigar a não pensar.
É que quando desejo
felicidade para um amigo que faz aniversário, desejo felicidade para todas as
pessoas do planeta que fazem e que não fazem aniversário naquele dia; mas eu
sei que nem todas as pessoas do mundo serão felizes, então meu desejo vai valer
para alguém?
Quando desejo um mundo
de felicidades para a amiga que se casa desejo um mundo de felicidades para
todas as pessoas do mundo que se casaram e que não se casaram; mas eu sei que nem
todos os relacionamentos dão certo, então será que meu desejo vai valer para
algum relacionamento?
Quando desejo uma vida
inteira feliz para o meu filho desejo uma vida inteira feliz para todos os
filhos de todas as mães do mundo; mas eu sei que tantos filhos e filhas são
infelizes; será que meu desejo para todos os filhos tem algum peso para o meu
próprio filho?
Quando desejo que o
filho de um amigo recupere a saúde porque ele está doente e meu amigo está
aflito, desejo que todos os filhos de todas as pessoas do mundo sejam e estejam
sempre saudáveis, mas eu sei que tantas crianças ficam doentes e morrem; será
que meu desejo de saúde para todas as crianças pode ajudar na recuperação de
alguma?
Se pensar menos de dois
segundos, acabou! É suficiente para que meus votos deixem de ser individuais, e
talvez seja o suficiente para que deixem de ser válidos. E eu sempre penso, não
consigo evitar! E quando penso, não consigo desejar no singular. Não sei querer
que minha amiga seja mais feliz do que a estranha que nunca vou saber que
existe; não sei desejar que meu amigo seja mais feliz que o homem cujo nome
nunca saberei e cuja língua não falo. Não sei desejar que meu filho seja mais
feliz do que o filho do mais completo estranho, mesmo que esse estranho ainda
nem tenha nascido.
Depois que percebi e
pensei mais nesse meu jeito estranho de sentir até dei uma parada com essa
coisa de enviar recadinhos com votos de feliz aniversário para todos os amigos
que vejo pelo Facebook que estão fazendo aniversário naquele dia; mas não
consigo evitar de, em pensamento, desejar feliz aniversário para todos os
amigos que vejo que fazem aniversário... e para todas as pessoas do mundo que
fazem ou que não fazem aniversário nesse dia.
Reconheço que esses
votos no plural, se votos valem alguma coisa, soam bonitos e humanitários, mas
quando são feitos junto, quase que no exato momento e com a mesma força dos votos
que faço para aqueles que me são mais queridos, será que eles não diminuem meu
amor pelas pessoas que amo?
Amar todo mundo não
obriga a amar menos aqueles que são mais próximos? Será que eu realmente amo
mesmo, tanto e tanto, as pessoas que eu sinto que amo muito, mesmo quando sei
que daria um braço por uma alegria delas?
Não sei medir amor e
não tenho como saber de que jeito as outras pessoas amam, mas pelo que dizem e
pela maneira que agem parece que as outras pessoas amam mais forte do que eu
porque conseguem amar no singular melhor do que eu. Ou talvez as outras pessoas
consigam se impedir de pensar esse segundo depois do desejo. Ou então somos
todos assim e eu só estou achando que sou diferente porque sou muito boba.
De qualquer forma o
fato é que sempre penso no plural quando faço desejos bons no singular! Daí, fico
me perguntando se não sou alguém com defeito, incapaz de amar de verdade; se
não sou na verdade uma pessoa falsa, mentirosa e muito hipócrita mesmo.
Bem, agora que consegui
escrever o que sinto, e porque tenho a impressão de que sou melhor escrevendo
do que falando, talvez as pessoas que eu amo entendam o que acontece e não
fiquem magoadas comigo quando eu disser que desejo, muito e muito, que elas
sejam felizes.
E isso vale para você que teve a paciência de
ler esse texto até o final.
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